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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



MARILENE CAON PIERUCCINI

 

 

Nascida em Vacaria, Rio Grande do Sul. Brasil.Formação superior em Filosofia e mestre em História da América Latina.Historiadora e escritora.

Membro da Academia Caxiense de Letras, cadeira nº 15, do Conselho de Cultura Municipal, da Comissão de Avaliação do Fundoprocultura e Responsável pela Área de Literatura da Lei Municipal de Incentivo à Cultura do município de Caxias do Sul, onde reside atualmente.

Autora de diversos livros, tendo recebido inúmeras premiações, inclusive o de “Melhor Obra Literária” em Caxias do Sul. Pesquisadora e documentalista do livro “Lendas do Brasil”.

Destacam-se entre seus livros já publicados: “Os Sertões na Teoria de Carl Gustav Jung”, “Retalhos de Mim”; “Retalhos de Uma Alma Nua”, “Retalhos”, “História do Aço no Brasil”. Incorporada na antologia “Grandes Escritores do Cone Sul”, volumes 1 e 2 e no “Dicionário de Escritores da Serra Gaúcha”.

 

 

TOQUE DE CARRILHÕES 

 

A manhã adormece o sol.

No beiral fundo do mundo

Rouxinol acalanta o ninho

Trança de corda e espinho,

Escondido no ramo vazio

 

 De caladas rosas, só rosas.

 

Sozinho voa o pássaro

Das asas abertas na rua.

 

 Ícaro se faz sonho escorrido

Nas violas desacordoadas

De notas perdidas na aragem.

 

A imagem de luz desaparece,

Além da vida, as Três Marias

Sopram forte o vento do norte

 

Sozinho canta o pássaro

Das asas despidas de lua.

 

A roupagem da ave canora

Seduz na cor da folha ausente,

O trinado afina, ressente dor.

 

Criança ergue o véu e chora.

Na esquina a piorra balança

É hora de sombras vazias

 

Sozinho está o pássaro

 

De asas partidas e nuas.

 

 

PRELÚDIO

 

No espaço da noite os passos

Da hora que se nega ir embora

 

Assola o tempo aflito

O grito de vento d’alma

 

Calma, mas que’inda chora

os traços de idos abraços

 

 

SOLO DE CLARINETA

 

Escuto o barulho do mar

Marulho de cantiga

Antiga mais que o ar

 

Magia que nina a lua

Na rua vazia de você

 

Pensamentos desertos

Abertos com a sombra

Que assombra o lugar

 

Perdidos na dor da escolha

Havida no meio de mim

Nunca há paz neste jardim

 

 

NOTA DE VIOLA

 

É um encanto sob a lua

O canto da rua, se tonta

Desponta a alegria de voltar

A canção da fantasia voa

No abraço da saudade

Onde a ansiedade de chegar

É acorde de segundo a toa

Que muda o mundo vão

No toque do coração

 

 

COMPASSO PARA TUBA  

 

No filme das paredes de vento

Cenas que o tempo reteve

 

Uma bola

Uma mão

Um rabisco

 

Um nome escrito de giz

 

Roda inteira a história

 

 

TIO FONSIO

 

Tio Fonsio era um velho preto

Que vivia nas bandas de Vacaria.

Carregava no peito um amuleto

A respeito do qual sempre dizia

Ser a marca de sua vida escrava.

Porém o que ele nunca contava,

Por farejar catinga de agouro no ar,

Era a quantia de anos que fazia.

 

À noitinha com a lua já despontada

Sentava ao lado do fogo de chão

Chamava acenando a calejada mão

E com memória lúcida e endomingada

Encantada história se largava a contar.

O galpão então todo de cor se iluminava

Na faísca de vento do cavalo orelhano

Que em quatro paletadas varava

De laço a laço o assovio do frio Minuano

 

A luz do candieiro se transformava

Em madrinheiro da tropa de sonho

Que ele criava com seu jeito risonho

Prá eu cavalgar no galope da fantasia.

De mim escondia o lombo guasqueado 

E a marca da tronqueira que desenhava

Nos pulsos a porteira do Rio Grande amado 

Sabia, com certeza, onde morava a coruja.

 

E quando o braseiro enfim se apagava

Feiticeiro me aconselhava: menina não fuja

Das taperas que pela vida vier encontrar

Reponte as feras pra dentro da mangueira.

Tendo charola, nunca deixe o poncho rasgar

E quando alguém lamber a canga pro seu lado

No mesmo espeto querendo churrasquear

Se achar que não vale a pena, se faça fumaça,

Que é melhor seguir só que mal acompanhado.

 

Há muito tio Fonsio partiu e eu já cresci 

Nunca dele e de seus conselhos esqueci.

Quando a tristeza de mim se aproxima,

Juro por Deus e pela luz que me ilumina,

É só pensar no que o preto velho ensinava

Quando a noite no campo descambava

E no braseiro pro chimarrão a água aquentava

Para voltar a ser dia na dor de minha alma.

 

 

PIALO DE AMOR

 

Quando é tardinha no pampa espraiado

As chilenas anunciam o taita aporreado

Que boleia a perna, lento solta a açoiteira

Levanta os olhos prá Estrela-Boeira,

E faz uma prece a Senhora-Madrinha

Enquanto no céu aguado a lua caminha.

 

 Acende o fogo de chão sob a chaleira

Arruma de pelego e badana a esteira

Estende como coberta o poncho azulado

E ouve o Minuano na ceva do chimarrão,

Rebenqueando de saudades o coração.

No entanto, vira o mate o guasca orelhano.

 

Charla só, jogando de mano com a solidão.

Lança o olhar matreiro em direção à coxilha

Ao escutar o chasque da tropilha de vento.

O estandarte farroupilha preso no tento

Da alma maltrapilha é o seu parceiro alento

Tão longe dos olhos da chinoca caborteira.

 

Cincha o peito do bravo o cabresto da paixão

A Água-Benta desenha a imagem faceira

Do cambicho que lhe pialou entranha e emoção

O guapo seca a lágrima na noite estranha

Que não é vergonha chorar a dor de amor,

Uma braça de sesmaria separando a moça-flor.

 

 O viço da aurora encontra as Três Marias

Boleando a relva orvalhada e macia

O guasca, num tranco, encilha a montaria

Bota na mala de garupa só a sua poesia

Retoça por diante o manotaço da vida

E vai buscar a sua prenda tão querida.

 

Como regalo leva com carinho e jeito

Embretado no aramado do seu peito

Um querer haragano para ser domado,

Marca de estância velha a ser garantida

Orelhada na esperança de jamais

Riscar a estrada em solita andança.

 




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