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LYA LUFT
LYA LUFT - Escritora romancista, poeta, ensaísta e tradutora. Nasceu em Santa Cruz do Sul, RS, em 1938. Autora da Record, também tem livros infantis de uma série da Bruxa Boa. Seu livro "Perdas e Ganhos", sobre a passagem do tempo e o drama existencial humano, vendeu mais de um milhão de exemplares, e seus romances, num total de treze, são também traduzidos em vários países, da Europa ao Vietname. Ex-professora de linguística, hoje Lya se dedica apenas a sua literatura.
É colunista mensal da revista Veja e professora aposentada da UFRGS.
Faleceu no dia 30/12/2021 na cidade de Porto Alegre/RS
Extraído de
COLETÂNEA DE POESIA GAÚCHA CONTEMPORÂNEA. Organizador Dilan Camargo. Porto Alegre: Assembleia Legislativa, 2013. 354 p. ISBN 978-85-66054-002 - Ex. bib. Antonio Miranda
A CASA INVENTADA
A vida é uma casa que a gente inventa (ou tenta).
Com um sótão para sonhar,
porões para chorar,
um quintal para as festas e os delírios.
No meio porém passam as águas do tempo
que tudo leva de roldão, tudo
transforma em cacos, trapos, lascas.
Melhor montar as ondas
agarrada nas espumas, e deixar-se levar
entre estrelas, escolhas
e destroços.
Melhor se reinventar.
Melhor contemplar.
(Melhor ainda, nadar.)
Ou ele nos devora, nos cospe fora
como sementes ou cascas.
Um dia vamos achar na praia
o que sobrou de nós:
que não sejam só os ossos.
ILHAS
o que não posso dizer
o que não cabe em palavras
o que não é para olhares
profanos;
o que é calado e remoto
meu mais secreto destino
como o reverso das ilhas;
ar marinho maremoto
calado alado e sonoro:
mais que navego,
imagino.
NASCIMENTO
Viver é a cada dia
partejar a vida.
Que esforço, que dor,
que tempo de espera.
Ela pode nascer com muitos braços
cabeça grande demais
(— às vezes sem pernas).
Abro meu ventre,
minha alma se arreganha
como uma parturiente:
dar à luz dói.
Faço isso todos os dias,
como num palco:
aquele bonequinho
sou eu
num mundo que vou montando.
Mas nem tudo me assusta,
nem tudo me prende:
posso abrir algumas portas,
posso fechar outras,
posso escolher o sexo
e a cor dos olhos de cada momento.
SAVARY, Olga, org. Carne viva. 1ª antologia brasileira de poemas eróticos. Rio de Janeiro: Editora Anima, 1984, 348 p. 14x21 cm. Capa: ilustração de Sérgio Ferro. Inclui 77 poetas ativos no final do século 20. Col. A.M.
Fontes
Como fontes que de noite mansamente
boca a boca trocam seus segredos d´água,
o amor que fosse o transparente afago
da mútua solidão, teria ainda
a lúcida paixão oculta dessas águas. E nós,
trêmulas bocas de fonte sequiosas,
deixamos que brotem, fundam-se, retornem,
os silêncios do amor como um lago.
Poesia erótica
Página publicada em maio de 2018; Página ampliada em junho de 2020
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