LUIS FERNANDO VERÍSSIMO
De
POESIA NUMA HORA DESSAS?!
Rio de Janeiro: Objetiva, 2002
ISBN 85-7302-481-X
Contato da editora:
www.objetiva.com.br/objetiva
Talento multifacético, produtor diluviano, Luis Fernando Veríssimo, poeta, cronista, dramaturgo, desenhista, etc, etc, também é poeta. Lógico. Aparentemente humorística, sua poesia é de reflexão e crítica. Sutil ou incisivo, irônico ou lírico... Humor? Também, mas ao revés. Discursivo, dissuasivo. Aqui vão três poemetos, mas vale a pena adquirir e ler o livro. [Conste que não é um anúncio, é o prenúncio de uma boa leitura!
Uma poesia
não é feita com palavras.
A poesia já existe.
A gente só põe as palavras em
volta para ela aparecer
— como as bandagens do
homem invisível, lembra?
*
O corpo e a mente
têm biografias separadas,
cada um sua memória própria,
seu próprio jogo de charadas.
Meu corpo tem lembranças
— cheiros, tiques, andanças —
que a mente não registrou
e o corpo não tem as marcas
de metade do que a mente passou.
(Pior que uma mente insana
num corpo sem muito assunto
é um corpo que já foi ao Nirvana
sem que a mente tenha ido junto.)
Cada um tem um passado
do qual o outro não tem pista
(como um bilhete amassado)
e nem o Mahabarata
explica uma mente anarquista
num corpo socialdemocrata.
Compartilham bioplasmas
e o gosto por certas atrizes,
mas não têm os mesmos fantasmas
nem as mesmas cicatrizes.
Das duas, uma, gente:
ou toda mente é de outro corpo
— ou todo corpo mente.
Deus
na sua infinita bondade
me botou na classe média
me livrou de ser da Arena Jovem
e de problemas na próstata.
Mas o telefone
da Luana Piovani, até agora,
nada...
Página publicada em novembro de 2008
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