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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



 

JOSÉ EDUARDO DEGRAZIA

 

 

 

Nasceu em Porto Alegre em 1951. Publicou dezenas de artigos e crônicas em jornais e revistas do Brasil e do exterior. Tem publicados os livros de poemas, Lavra permanente, Cidade submersa, A porta do sol, Piano arcano, e A urna Guarani; seus livros de contos são: O atleta recordista, A orelha do bugre, A terra sem males, e Os leões selvagens de Tanganica; recentemente saiu sua novela O reino de macambira.

 

Traduziu livros de Pablo Neruda, poetas latino-americanos e italianos.

Foi premiado em poesia, conto, teatro e tradução.

 

 

JOSÉ EDUARDO DEGRAZIA :  POEMAS EM PERUGIA, ITÁLIA. Ver em:

http://phonodia.unive.it/people/jose-eduardo-degrazia/#prettyPhoto

 

VEJA TAMBÉM:

A NITIDEZ DAS COISAS , segundo belos e DENSOS poemas de DEGRAZIA– por W. J. Solha - ENSAIOS

Traduções de poemas de JORDI VIRALONGA por JOSÉ EDUARDO DEGRAZIA


Tradução do italiano para o português por JOSÉ EDUARDO DEGRAZIA.

 

TEXTOS EM PORTUGUÊS TEXTO EN ESPAÑOL

 

F R A N Ç A I S

TEXTS IN ENGLISH   - TEXTOS EM PORTUGUÊS

 

EN ITALIANO

 

 

 

 

Veja também o texto de W. J. Solha sobre a poesia de DEGRAZIA:

 

http://www.antoniomiranda.com.br/ensaios/a_nitidez_das_coisas.html

 

 

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  O Rio Eterno.   Apresentação: Maria do Carmo Campos.  São Paulo: Lumme Editor, 2020.  100 p.  14 x 21 cm.  ISBN 978-65-00-05162-9.    Ex. bibl. Antonio Miranda

"Seus poemas vão tecendo a sina e a saga de viajantes e de heróis,
aqueles que deixam seus rastros na história, nos mitos, na poesia.
Há sempre uma eterna viagem, constituída das culturas e das
civilizações, raiz das narrativa, âmago da poesia e da própria vida."
MARIA DO CARMO CAMPOS

 

 

 

PARA ONDE

 

       São apenas palavras, mas tão sólidas
feito velhos muros de Babel, tijolos
uns sobre os outros para atingir o céu.

São círculos concêntricos
que se interpõem ao entendimento,
são mais matérias emersas, sargaços
de mar interior que feito lava
arremessa-se de um vulcão marinho.
Cão de espessa sombra, Cérbero
a ganir a sorte, sua corte e vício,
cicios de cobras no cio.

Mover-se fora de si o Ser
se o Uno de Parmênides não permite?
Feito flecha de Zenon no ar detida,
a vida amarga em si, imóvel.
Diógenes: só nos resta andar.

PARA ONDE

não importe, vale a pena viver, caminhar
seguindo apenas o instinto, um cão
volta para sua casa depois de perdido.

PARA ONDE

não importa, sigamos feito ciganos
ou beduínos, Reis Magos
à procura de indícios, o Cometa.

 

 

       O FOGO

 

        Dos deuses
que deram
o fogo ao homem,
Prometeu acorrentado,
o fogo sagrado
de Zoroastro,
desde o carro
de ouro
de Apolo,
queimamos.

        Em nós arde
o foto Eterno
e primordial,
acreditamos,
queimamos?

O foto é motor
dos dias,
no centro
da perplexa
idade.

Queimamos
no tempo,
sem virarmos
cinza.

       

       

 

       

DEGRAZIA, José Eduardo.  O Súbito vento.  Traduzido e ilustrado por Shogoro Nomura.    Porto Alegre, RS: Class,2020.  64 p.  14 x 21 cm.   ISBN 978-65-88865-10-1  .   ISBN 978-65-88865-10-1 
Ex. bibl. Antonio Miranda

 

        "Este é um livro cujas imagens podem ser lidas
e cujos textos evocam visualidades."

                                       ANDREI CUNHA

 




 

 

 DEGRAZIA, José EduardoParábola para unicórdios.  Guaratinguetá, SP: Editora Penalux, 2019.   162 p.   14 x 21 cm.
ISBN 978-85-5833-511-9  Imagem da capa: Giuseppe Mazzolani (1842-1916) Il Capricornio.   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

DO OUTRO LADO

 

Todo o centro da vida
vai se fazendo aos poucos,
aos rogos e fogos

um jogo de dados
um jogo de fados,

oura se está de um lado,
enquanto estamos aqui
é melhor ser feliz.

Do outro lado ninguém sabe
talvez nem nos cabe
a vida para sempre, eterna.

Aqui e agora é o nosso ser,
depois, não tenho nada a dizer.

 

 

CRIAÇÃO

 

Existia o tempo antes do big bang?
ou era somente deus que criava o Tempo
imerso na curvatura do espaço?

A vida é curva na linha que traço.

Ou poderá que eu invente um universo
em cada alinha ou verso em que me faço?

A vida é reta na curva que traço.

 

 

FOTOGRAFIA No. 5

 

Na mesa do restaurante
o garçom  serve uma natureza morta.

 

 

 

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  Matematica para centauros.  Guaratinguetá, SP: Editora Penalux, 2018.  124 p.  15 x 21 cm. Capa e editoração França & Gorj.   ISBN 978-85-5833-349-8  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

         asa de pássaro, asa de xícara, asa de avião
        
chama de vela, chama de gás, chama de paixão,
         ponta de pedra, ponta de lápis, ponta de faca,
         fio de faca, fio de linha, a vida por um fio,
         pé de mesa, pé de cabra, ao pé do ouvido,
         mação do rosto, maçã argentina, mação do pecado,
         papel de parede, papel de jornal, papel de poema.

 

 

         GEOMETRIA CÓSMICA

 

         No carrossel das constelações,
         girando de oeste para o sul,
         desde Órion de cintura imponente
         pisando a espinha do Touro,
         até o Escorpião sustentando
         o madeiro do Cruzeiro do Sul,
         vaga o meu pensamento
         de estrela em estrela da galáxia,
         traçando a geometria cósmica
         que gira no centro da vertigem,
         buraco negro onde a lua
         penetra linda, branca e nua.

 

 

         Escrevia versos

 

         como se empilhasse
         nervos desencapados

         ou

         enfileirasse troncos
         para fazer uma jangada

         ou

         alinhasse fios
         para o pouso dos pássaros.

 

         POESIA=OUSADIA
        POESIA=AGONIA
        POESIA=ALEGRIA

        POESIA DO DIA A DIA
        NÃO SE ADIA.

 

 

DEGRAZIA, José EduardoA Nitidez das Coisas.  Porto Alegre, RS: Artes e Ecos, 2018.  94 p. 14 x 21 cm.  Capa: fotografia de Marcelo Lubisco Leães. Apresentação por Vera Lúcia de Oliveira.  ISBN 978-85-93459-11-5. 

 

 

 “Os versos fluem, como se jorrassem de uma basta fonte, assim como são ditos e escritos, claros, sem retórica, concisos e melodiosos. Essa sé a marca da grande poesia, que nos dá a falsa impressão que se autogera dos veios e veias da fala e da palavra. Há, no entanto, o meticuloso trabalho do poeta, que não cerceia o ritmo dos versos longos e por vezes longuíssimos, mas, ao mesmo tempo, regra e profusão das imagens para que captem o mistério e a beleza.”  (...) “A  nitidez das coisas, é o mesmo de um dos seus mais belos e intensos poemas (também escolhido por mim para o encontro que se deu na Universitá degli Studi di Perugia, na Itália, em 2013), mas por consensar de forma surpreendente a essência e o sentido mais íntimo da poética do autor. “  VERA LÚCIA DE OLIVEIRA.

 

 

 

         A NITIDEZ DAS COISAS

 

         No silêncio da casa, quando as madeiras estalam,
         espero o movimento da engrenagem do tempo,
         a manifestação evidente da máquina do mundo,
         as pás do moinho moendo a farinha dos dias,
         os dentes trincando a pele da feroz existência,
         o rolar dos minutos no relógio náufrago da manhã,
         o zumbido da mosca contra sua imagem no vidro da sala.

 

         No silêncio da casa, quando estremecem os móveis
         e trepidam os eletrodomésticos nas redomas de vidro,
         zunindo tudo num uníssono cantochão melancólico,
         espero o levantar da poeira do chão entre as moedas
         nítidas do sol e as moendas  trituradoras de emoções,
         a polia que range a palavra contra a indiferença e a solidão,
         o destino dos pratos e talheres prisioneiros lentamente
         desfazendo-se em barro e mortal ferrugem.

 

         As coisas morrem sem pânicos enquanto olhamos
         distraídos o vento levantando as cortinas da sala.

         Só as coisas são nítidas e têm alma e acreditam
         na vida eterna.

 


        

         TEORIA DOS SONHOS

 

                                               Para Antonio Miranda


         O sonho que se perde na manhã,
         não será nunca mais alcançado?
         Veio de labirintos e mares interiores,
         nasceu de gritos de náufragos
         e de suspiros de amantes,
         pura ação e desencontro, imagem,
         som de uma sinfonia inacabada,
         puro encantamento de tardes antigas,
         de madrugadas sonolentas,
         orações que batem nas ogivas das catedrais,
         sinos, anjos, dançarinas solenes se brancas
         pisando leves, veludos, e nuvens,
         fotos de mulheres nuas de revistas
         que não existem mais,
         o desejo e a culpa de mãos dadas
         no jardim das delícias ou do medo,
         que se tece toda a noite
         feito um brinquedo,
         uma teia, um enredo,
         pura ficção e enleio,
         armadura e seio,
         máquina do futuro e do passado
         onde se é criança e velho,
         um ser sem tempo, mas datado.

         O sonho que se perde na manhã,
         não será nunca mais alcançado?

 

 

         MARGENS

 

                           Para Márcio Catunda


         Escrevo sobre pequenas coisas que me tocam,
         ou que os meus dedos acariciam lentamente,
         falo das folhas, das falhas, falo da pele,
         das estrelas — são pequenos pontos no Universo —
         dos mares, dos rios, do navios e das velas,
         canto a palavra dos homens e das mulheres,
         canto o meu tempo que pode se também o teu,
         canto a vida enquanto passagem e desafio.
         Escrevo como se fosse música, nota a nota,
         canto de pássaro, rumor de água, fonte,
         escrevo como se estivesse numa ponte
         entre margens im/possíveis.
        
 

 

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  Lições de geometria fantástica.  Guaratinguetá, SP: Penalux, 2016.          88 p.  14x21 cm.  (Poesia)  Capa e diagramação: Ricardo A. O. Paixão.  ISBN 9780-85-5833-139-5 

 

         Reflexões sobre um Monturo

 

         1

         As coisas se desfazem lentamente
         faca enferrujada, copo quebrado.

 

         2

         As coisas se desfazem lentamente
         folha de jornal, página de livro.

 

         3

         As coisas se desfazem lentamente
         máquina quebrada, lata de cerveja.

 

         4

         As coisas se desfazem lentamente
         roupa usada, bola furada.

 

         5

         As coisas se desfazem lentamente
         chave que não abrirá mais a Porta.

 

 

         Exercício de rima (Pobre)

 

         1

O andaime da dúvida.
O arcabouço da dívida.

 

2

O apetrecho da razão.
O buçal do alazão.

 

3

Os cacarecos do medo.
O cacarejo do cedo.

 

4

Os mananciais da paixão.
O mancal do caixão.

 

 

Dez pensamentos sobre ideologia

 

1

O átomo não tem ideologia. A bomba atômica tem.

 

2

O rato não tem ideologia. A ratoeira tem.

 

3

O pato não tem ideologia. O pato à Pequim tem.

 

4

O corpo não tem ideologia. O biquíni tem.

 

5

O pescoço não tem ideologia. A gravata tem.

 

6

A garganta não tem ideologia,.A guilhotina tem.

 

7

O papo não tem ideologia. O discurso tem.

 

8

O sexo não tem ideologia. O coito tem.

 

9

O povo não tem ideologia. O Estado tem.

 

10

Deus não tem ideologia. A Igreja tem.

 

 

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DISCÍPULOS DE EROS

 

Os namorados

são transparentes

quando olhados

de frente

de lado

de perto

ou distante

são diamantes

amantes, amantes

amantes

dão-se as mãos

simplesmente

mentes e olhos

mentem versos

verdades várias

vôos

são pássaros

são peixes

imersos no mar

do amor

esquecidos

de tudo

de nada

de todos

jogam dados

do destino

cantam hinos

são apenas

lábios, lábias

sedução

sábios e vivos

inocentes

e meninos

enquanto amor

os domina

e ilumina.

 

 

A HORA CERTA

 

Quando não se puder

mais olhar uma flor,

quando não se puder

mais amar uma mulher,

quando o mundo for

só aparência de ser

e não permitir alegria,

é a hora certa de plantar,

é a hora certa de cantar,

é a hora certa de amar

é a hora certa de ver,

é a hora certa de viver,

é a hora certa de colher,

a manhã sempre vem,

o amor pode voltar

pra te dizer que a vida

vale a pena ser vivida.

 

É a hora certa de plantar,

é a hora certa de cantar,

é a hora certa de amar,

é a hora certa de ver,

é a hora certa de viver,

é a hora certa de colher.

 

 

RECEITA

 

   Para Sérgio Faraco

 

Não deixe o tempo

passar correntes

em volta de seu corpo,

e que as aranhas

teçam teias

em seus dedos.

 

É preciso impedir

que os olhos acostumem

o olhar pela janela,

na mesma rua

onde homens cinzentos

cruzam maquinalmente.

 

É necessário ter sapatos

bem engraxados,

sem furos nas solas,

para que os pés não cansem

e não se machuquem

nas pedras do caminho.

 

Morar em casas

com porão, sótão e quintal,

onde possamos encontrar

pessoas desconhecidas

e objetos indecifráveis

na soleira da porta.

 

Ter reservas de carinho,

coleções de selos e de moedas,

ter amigos que gostem

de música e poesia,

bolsos e armários embutidos.

 

Ter sempre a esperança

de encontrar o amor

num parque possível,

sábado ou domingo

ou outro dia qualquer.

 

Antes de tudo

e principalmente,

é preciso ter paciência,

crer que os tempos mudam

e que teias de aranha

não crescem sem motivo.

 

 

De
José Eduardo Degrazia
UM ANIMAL ESPERA
Porto Alegre:  Minibuks  Território das artes,              2010.
 63 p.   ISBN 978-8563994-05-9

 

 

LEREI O ÚLTIMO LIVRO

Guardo o desvario

na gaveta da manhã.

São tantos rios a correr,

o mundo é tão grande,

existem trens prontos para partir

a qualquer instante.

Coloco os atavios do dia

no cabelo da mulher

que me ama, o vento sopra,

a chuva cai, os corpos ardem,

as estrelas fazem ninhos no telhado,

navios desfraldam bandeiras no mar,

existem náufragos em perdidas ilhas.

Músicas distantes invadem a janela,

há corpos que dançam, folhas caem.

Em cima de algum morro, um homem solitário

diz versos para a lua, o tempo passa

e a morte vem como um gato que se aninha.

Não tenho compromisso com a morte.

Guardo a morte entre as páginas do livro.

Este livro, eu sei. será o ultimo que lerei.

 

 

O SONHO INSEPULTO

 

O que poderei dizer

do sonho insepulto

no coração do homem?

Sob signos escuros nasci

irmão da lua e dos ciprestes.

Gastei minhas mãos

nos muros das casas fechadas.

Eu, amante da solidão

e na tristeza imerso,

vi a luz da aurora extática.

Na fábrica de tijolo,

no monjolo, em moinhos,

aprendi minha sina.

Plantei cacto no deserto,

colhi o grão do trigo,

amassei o pão.

Viajei na luz da estrela,

bebi a chuva e a torrente.

vivi a neve e o trópico,

eu, menino que queria

crescer além das árvores.

Adolescente fui como os outros,

amante do impossível,

as mulheres impassíveis.

O que mais poderia cantar?

Canto o sonho insepulto

no coração dos homens.

 

 

 

TRÊS LIVROS DE POESIA

(uma seleção)

 


 

DENOMINAÇÃO

 

Com tua fala

noturna

feres o dia

e te refazes.

 

Dentro

da bruma

escalas

nova ressonância.

 

Do fundo

do poço

retiras

a inocência

 

trescalas

a perdidos,

sonho de amuragem

e jardim

 

entre muros.

Pousas em cada

coisa o nome

que lhe cabe.

 

 

GRITO

 

        Poema-grito

         a doer comigo

              na caverna.

 

Guilhermino Cesar

                              

                        Projétil

                            no revólver

                           

                            minha fala

                            aguarda

 

                            meu grito

                            se guarda

 

                            na escura

                            caverna

 

                            que se puxe

                            o gatilho

 

                            e se encontre um peito:

                            a enxada e seu eito.

 

 

                            FORMA DO POEMA

 

                            O poema tem freio

                            de espuma e vento

                            difícil é achar

                            o momento exato

 

                            de contê-lo

                            nas mãos

                            e deixar que via:

                            forma concreta de poema.

 

 

                            CONSCIÊNCIA

 

                            O dínamo ronca

                            o seu maior

                                          de-

                                               feito

                            sobre o mundo.

 

                            A engrenagem

                            tritura       an-

                                                seios

                            téreis.

 

                            Sabes inútil

                            o protesto:

                            ninguém seguirá

                            teu último gesto.

 

                            Cabeça baixa

                            só tua consciência

                            continuará gritando.

 

                            Irás para o matadouro.

 

 

                               POEMA URBANO

 

                            No edifício

                            mil vidraças

                            refletem

                            meu rosto

                            sem graça.

 

                            Na fumaça

                            dos carros

                            meu travo

                            meu nojo.

 

                            No estojo

                            do apartamento

                            meu corpo

                            de cimento.

 

                            No bulício

                            da partida

                            minha ferida.

 

                           

                            CIDADE ESTRANHA

 

                            Caminho pelas ruas

                            da cidade

                            e a tristeza

                            escala os muros

                            das velhas mansões.

 

                            Por trás das árvores

                            uma lua bêbada

                            sorri.

 

                            Entro num cinema

                            para ver gente:

                            está vazio.

 

                            Aos poucos se enche o cinema

                            com todos

                            os meus antigos fantasmas.

 

 

 

DEGRAZIA, José EduardoCorpo do Brasil: poesia.   Porto Alegre: Movimento, 2011.  112 p.  14x21 cm. Prefácio de Maria do Carmo Campos.  Ex. autografado. Col. A.M. (EA)

 

 

SOU BRASILEIRO

 

Por trás da janela

vejo o país

que me condena:

cidades e campos,

rios e ruas

na retina.

Prisioneiros somos

da perspectiva

que nos afasta

do que é em nós

mais terra e sangue.

Por isso nos escondemos

atrás de mesas executivas,

folheamos manuais

de covardia.

Há de chegar o dia

de dizer

com orgulho: brasileiro,

muito prazer.

 

 

 

SOU CANTOR

 

Todas as canções

que eu canto

são as canções

do meu povo.

 

Pois do povo

herdei voz

e pronúncia.

 

Depois de muito cantar

canto a dor e a renúncia.

 

Do povo eu sou cantor

e nisso não me engano

não escondo nas palavras

a minha verdade

como quem se esconde

embaixo de um poncho.

 

Não me escondo em atavios

nem em brilhos de efeito

o meu canto é pranto feito

do que para o povo é direito.

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  Cidade submersa.  Poesia.  Porto Alegre: IEL/ Editora Movimento, 1970.  112 p.  14x21 cm.  (Coleção Poesiasul, v. 22)   Col. Bibl. Antonio Miranda

 

 

CALIÇA

 

I

A palavra apronta

a consequência

no que transforma

ou estraçalha;

nela ardo,

em mim arma

a ordem, a cabala

dos frutos.

 

II

Trago o que não consta

nos anais e anuários,

mais os tempos imperfeitos,

verbais: inventário

em dias e anos: amos

de uma casa desabitada.

 

III

Conforme ao dia,

ao cartão ponto,

resumo o cotidiano

na impaciência: o sonho

até a náusea.

Me explico

          no pesadelo.

 

IV

Fortuito o encontro

das mãos nesta casa

de paredes desabadas.

Escuso o rosto no espelho,

o passo na sala.

 

V

Estrutura da face

que se mostra:

 

a fachada da casa

onde se mora.

 

VI

A manha se constrói:

caliça nos dentes,

ódio na fala.

 

Vil

Irrisório é o sorriso

nesta idade de facas:

 

VIII

Albergo a palavra na esperança.


                           

 

JABLONSKI, EduardoDegrazia pinta palavras. 2ª. Edição revista e ampliada.   Porto Alegre, RS:  Editora Bestiário, 2016.   144 p.  14x21 cm.  ISBN 9987-85-98802-68-9  Ex. bibl. Antonio Miranda  Textos sobre a poesia, minicontos, novela, ensaios, entrevistas de “José Eduardo Degrazia”.

“A presente análise não se divide por temas ou recursos de estilo, porque José Eduardo Garacia é tão variado, poético de poema a poema, de iniconto a miniconto, de novela a novela.” EDUARDO JABLONSKI

“La nitidezza delle cose è ciò che cerca il poeta, nel passato como nel presente ed essa si esprime in um verbo chiaro, senza retorica, conciso, denso, melodioso.” VERA LÚCIA DE OLIVEIRA

 

Inclui o seguinte poema de Degrazia na p. 114:

 

 

A FLOR FUGAZ

 

Porque se despe na tarde
e convida ao sortilégio
de sua carnação madura
pétala que apura o tempo

inventando a investidura
de planta formosa e pura,
sendo lírio ou sendo rosa,
ofertada sem mais nada

do que a vida retira
o sumo, a seiva, na selva
de um desejo realizado

em sendo frágil e fugaz,
feito o amor que foi e dura
o esplendor de seu momento.

 

 

 

DEGRAZIA, José EduardoA colecionadora de corujinhas. Minicontos.  Porto Alegre, RS: Editora Bestiário, 2016.  120 p.  ISBN 978- 859-8802-01 Apresentação de Eduardo Jablonski.

 

Minicontos de um poeta, o que são?  Prosa poética, com metáforas e metapoesia...

 

 

 

         FÁBULA

 

         Todo dia arrumava a mesa da mesma maneira. O lugar do marido na cabeceira, os dos filhos de cada lado, pois ela não sentava. Dias tornaram-se semanas, entornaram meses, messes multiplicaram anos. A vida,ccomo de normal.
         Desdisseram os calendários.
         Frugais passaram a ser os dissídios. Dinamitaram porcelanas, corroeram mesa, britaram fotografias, libertaram pássaros.
         Para sempre foram.

 

 

         VELHICE

 

         Jamais conseguiria subir as escadas do Paraíso.
         Mãos bondosas o ajudaram a galgar os degraus.
         Lá em cima viu que estava sozinho.
         Começou o lento descer da escada para...
         Para onde mesmo?
         Não sabia.
         Naquela altura não tinha menor importância.

 

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TEXTO EN ESPAÑOL

 

POEMA DE JOSÉ EDUARDO DEGRAZIA

 

Traducción de Virglilio López Lemus

 

 

 

RECETA

 

         Para Sérgio Faraco

 

 No deje que el tiempo

pase corrientes

alrededor de su cuerpo

y que las arañas

tejan telas

en sus dedos.

 

Es preciso impedir

que los ojos se despierten

al mirar por la ventana,

en la misma calle

donde hombres cenicientos

cruzan maquinalmente.

 

Es preciso tener zapatos

bien amarrados,

sin huecos en las suelas,

para que los pies no se cansen

y no se dañen

con las piedras del camino.

 

Vivir en casas

con portal, sótano y pátio,

donde podamos encontrar

personas desconocidas

y objetos indescifrables

en el umbral.

 

Tener reservas de cariño,

coleciones de sellos y de monedas,

tener amigos que gusten

de música y de poesia

bolsos y armários llenos.

 

Tener siempre la esperanza

de encontrar el amor

en um parque posible,

sábado o domingo

o cualquier outro dia.

 

Ante todo

y principalmente,

es preciso tener paciencia,

creer que los tiempos cambian

y que las telas de araña

no crecen sin motivo.

 

 

 

 

 

CREAR EN SALAMANCA
traducción de Alfredo Pérez Alencart

 

 

 

Crear en Salamanca tiene el privilegio de dar a conocer, por vez primera, algunos poemas de Jose Eduardo Degrazia (Porto Alegre, 1951). Tiene publicados una veintena de libros de poesía, cuento, novela. Entre los poemarios están Lavra permanente (1975); Cidade submersa (1979); A urna guarani (2004); Corpo do Brasil (2011); A flor fugaz (2011) o Um animal Espera/ Un animale aspetta (2011). Como traductor ha publicado catorce libros, entre ellos siete de Pablo Neruda. Ha obtenido premios y reconocimientos en Brasil y en otros países. Su obra aparece en unas 30 antologías nacionales y extranjeras y ha sido traducido al español, italiano, francés, inglés, rumano y esloveno.

Los textos forman parte de “He muerto… y he resucitado”, Antología del XVIII Encuentro de Poetas Iberoamericanos, coordinada por Alfredo Pérez Alencart, poeta y profesor de la Universidad de Salamanca y quien los ha traducido desde el portugués.

Ilustraciones: Miguel Elías

 

 

 

CADA DÍA

 

Vamos muriendo un poco cada día

aunque cada día vamos viviendo un poco más,

y nuestra sangre batiéndose en las venas

es un mar primordial que se derrama en la playa

para alimentarnos con sus sonidos y sus sales.

Cuando ando por el camino o cuando amo,

siento que mi corazón golpea fuerte en el pecho,

como un pájaro en el nido o un rio en el lecho,

convertido en un mar de leche o de vino.

No me importa morir de esa manera,

pensando que la vida siempre vale la pena,

viviendo en cada minuto la vida entera,

viviendo la vida entera en solo un minuto.

Vivir la vida en un ritmo absoluto,

sabiendo que la vida es alegría y luto.

Vivir sabiendo que la vida se desvanece

hace de cada uno de nosotros un ser especial

y no importa si de noche un cuervo

en nuestra sala nos dice nunca más.

Vamos muriendo un poco cada día

aunque cada día vamos viviendo un poco más.

 


ME DEJO LLEVAR

 

Nada como encontrarte, poesía,

cuando el lenguaje de los hombres parece opaco

y toda palabra me agrede.

Yo, que no conozco tus refugios y soy

de los poetas de la urbe el más humilde,

de pronto te encuentro en el autobús

o caminando solito entre la multitud,

y tu me refrigeras el alma con tu canto

al punto de creer que no te merezco.

Y siempre tienes para mí una palabra de afecto,

como si yo fuese tu niño.

Olvido toda agresión sufrida

y me dejo llevar por tus caminos,

igual que un ciego sigue a un perrito.

 


ADORMECIDA

 

Adormecida en mis brazos

la flor del sueño abierta en el rostro

estrellas cuentas despiertas en tu cuerpo

caballos galoparon la planicie del abandono

y atravesaron de escalofríos tu cansancio

y la belleza ardió lentamente

y los cabellos flotaron como nubes encima del bien y del mal

y tus manos detenidas y perdidas en un otro mar

quedaron como aves nocturnas ignorando

que se escapaba la vida.

 


EL CAMINO INVIOLABLE

 

No todos somos malos.

Algunos tienen una cierta ternura.

Nosotros una forma especial de sonreír.

Nos saludamos corteses en la calle,

apretones de manos blandas, leve movimiento de labios.

Y continuamos el camino inviolable.

 

 


MOTIVO DE FUERZA MAYOR

 

A veces me invade

una canción de origen oscuro,

una ventolera de la pampa,

una marina desnudez de caracoles,

un sueno de nube preñada de lluvia.

El habla de la mujer de senos morenos

en medio de la noche con escarabajos zumbando

color azul del cielo o verde césped,

bosque de campanas, campanillas sonoras

y gritos intensos de pasión en la noche del monte,

rituales amorosos de gatos sobre los tejados,

voces aterciopeladas de guitarristas en los bares de barrio,

gemido de niño enfermo tosiendo en la madrugada,

jugadores en el paño verde jugando sus vidas a las cartas,

borrachos improvisando cantos para la luna,

trabajador esperando el autobús al amanecer.

Y yo, atónito y despierto, escribo

por orden perentoria de las musas,

psicografío el mensaje nocturno

de una fuerza mayor que me incendia.

 

 

 


LA NITIDEZ DE LAS COSAS

 

En el silencio de la casa, cuando las maderas crujen,

espero el movimiento del engranaje del tiempo,

la manifestación evidente de la maquina del mundo,

las aspas del molino moliendo la harina de los días,

los dientes mordiendo la piel de la feroz existencia,

el rodar de los minutos en el reloj naufrago de la mañana,

el zumbido de la mosca contra su imagen en el vidrio.

En el silencio de la casa, cuando vibran los móviles

y resuenan los electrodomésticos en los recipientes de cristal,

sonando en semejante canto llano entre las monedas

nítidas del sol y las monedas trituradoras de las emociones,

la polea que cruje la palabra contra la diferencia,

el destino de los platos y cubiertos apilados, lentamente

deshaciéndose en barro y mortal oxido.

Las cosas mueren sin temor mientras miramos

distraídos el viento que levanta las cortinas de la sala.

Solo las cosas son nítidas y tienen alma, y creen

en la vida eterna.

 

 

 


LLUVIA ANTIGUA 2

 

Guardo el límite del sueño y del cansancio.

Los espejos interrogantes esperan

otras imágenes de rosas maceradas

en tu cuerpo adormecido.

Voces callan reticencias y reclamos.

Detrás de la vidrieras es otra lluvia cayendo.

El navío negro sube el rio que desagua

en mi pecho y su bocina apuñala

las acacias y los girasoles.

En reflexiones estéticas voy perdido

mientras tu cuerpo gira al sol

escondido detrás de las nubes y la lluvia

ensaya en el tejado su patética melodía.

 

 

 


ESPERANZA

 

En soledad esperabas.

El flujo del mar golpeaba en tu pecho

llenaba tus ojos de amargor,

las manos de algas, los senos de anemonas.

Envuelta en el silencio poblado de estremecimientos y sombras,

en soledad habitada por sueños, voces y poemas,

esperabas la vuelta del velero que partiera

llevando en las velas el tiempo y la esperanza,

los castillos construidos en la arena.

 

 

 


POEMA DE LA INTIMIDAD

 

          Para Virginia

 

La intimidad es un puente de vidrio,

un mínimo gesto puede astillar

la tenue relación entre dos seres.

Tengan cuidado con las palabras,

pueden ser duras como el acero.

Cuidado también con los ojos

que pueden destillar llamas de odio.

Tengan especial cuidado con las manos.

Es necesario que estén siempre listas

para el cariño, pero llenas de melancolía,

como si fuesen a partir para siempre.


QUE LA VIDA NO TE SEA MALA

 

Que la vida no te sea mala.

Que la vida no te de cuchillas.

Que la vida suele ser puñal

marcando en tu pecho la llaga.

Que la vida suele ser amarga

si en tu pecho habita el dolor.

 

 

 

DEGRAZIA, José EduardoHavana.  Tradução para o espanhol Alejandro F. Della Sala.   Porto Alegre, RS: Editora Bestiario, 2017.  40 p. ilus. foto col.  21x21 cm.  Textos em português e espanhol.   ISBN 978-85-988027-9 -4.

 

 

         Amanhece sobre Havana,
        as janelas se abrem para o dia
        que vem vindo como uma canção anunciada,
        e um frêmito de asas acorda o ninho
        de pássaros amantes, ares azuis sobre o golfo do México,
        e descobre as águas de tua costa de coral e
                                                       concha silenciosa.
        Desde a fortaleza La Cabaña o sol desponta
        e parece querer mergulhar na baía
        incendiando as ondas e as escamas dos peixes.
        Os raios de sol pousam no Templete
        e sobre a Ceiba mítica dos fundadores da cidade.
        A Geraldilla te saúda desde o Castelo de La Fuerza
        e anuncia que a beleza paira sobre os telhados
        sua alegria e magia.

 

 

        Amanece sobre La Habana
        las ventanas se abren para el día
        que viene como una canción anunciada,
        y un bramido de alas despierta el nido
        de pájaros amantes, aires azules sobre el golfo de Méjico,
        y descubre las aguas de tu costa de coral y
                                                       concha silenciosa.
        Desde la fortaleza La Cabaña despunta el sol
        y parece querer sumergirse en la bahía
        incendiando las olas y las escamas de los peces.
        Los rayos del sol se posan em el Templete
        y sobre la Ceiba mítica de los fundadores de la ciudad.
        La Giraldilla te saluda desde el Castillo de La Fuerza
        y anuncia que la belleza revolotea por los tejados
        su alegría y magia.

       

DEGRAZIA, José EduardoLove is Geometry.  Gravataí, RS: Clube Literário de Gravataí, 2015.   134 p.  14,5c21 cm. Inclui o prefácio "Degrazia is all poets"", por Eduardo Jablonski.  Ex. bibl. Salomão Sousa.

 

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  Sopa de cebola.  Belém: Folheando, 2022.  64 p.  14 x 21 cm.    ISBN 978-65-5404-064-8  
Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

        ESCREVO

Pego o lápis para escrever o poema
e paro à certe distância do papel.
O importante é escrever o poema
e não escrever sobre o poema.
Verso que pareceria banal
não fosse o mar de tinta derramado.

Não me interessa mais o poema
— artefato lógico —
melhor tomar um banho de rio
pegar um trem sem destino.

        Isto me redime de muito:
sei que a vida vale a pena
e a poesia é necessária.

 


O gosto do proibido

O gosto do proibido é lembrança da infância,
da fruta madura do pomar do vizinho,
ou de quando íamos espiar as moças do cabaré
tomando banho de sol nas janelas antes do
expediente começar.

 

Herói uma vez

Só fui herói uma vez,
na infância:
com uma pedra
quebrei a garrafa
com que nos ameaçava
um da turma com quem
tínhamos brigado.
Ele ficou com o gargalo
na mão, chorando,
enquanto eu fui o cara
mais falado da rua
por uma semana.

 

 

Um tio bisavô escrevia sonetos

Meu tio bisavô escrevia sonetos
para a namorada.
Não sei se algum dia a amada,
que o tempo levou,
junto à janela leu
os versos que meu tio bisavô escreveu.
Não sei se ela chorou, não sei se ela sorriu:
guardo com cuidado os versos.

 

 

Triste

Como o olhar do garçon
entre as mesas do restaurante vazio,

o músico do restaurante a tocar
entre ruídos de copos e talheres,

feito restaurante que despede
o último garçon para fechar.

 

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  Os Melhores Poemas.  Org. por Eduardo Jablonski.    Porto Alegre, RS: Bestiário, 202.  156 p.   16 cm. X 21 cm.  ISBN 978-65-85039-08-6                   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

        CANÇÃO PARA O TERCEIRO MUNDO

A granada de mão
em mão,
o tiro cero
no cinematografista.

A revolução é o sangue
na rua do mercado
público, a igreja
incendiada e sem deuses:

golpe de faca
nas costas,
Santiago do Chile,
Montevidéu, Buenos Aires,

América do Sul
sangrenta, amante
de mulheres morenas,
metralhadoras e bombas,

cuchillos, adagas,
risos, rasgos, danças,
carnaval de pranto,
ódio na procissão;

noturna procissão
de homens soturnos
subindo a ladeira
da promissão.

 

                  (1982, p. 77)

 

 

        COXILHAS

1
Minha terra é puro contentamento
quando nela navego
ou a invento.

Coxilhas são ondas
de mares interiores,
batem no peito como no cais;
o coração é batel,
a saudade é corcel
na contramão do tempo.

Coxilhas são seios
de mulheres apetecidas,
no campo de flechilhas
enfim desencantadas.

Vai viajante vogar nesse mar!
vai ao encontro do tempo que foi
e do que virá.

2004, p. 15

 

        A FLOR FUGAZ

Porque se despe na tarde
e convida ao sortilégio
de sua carnação madura,
pétala que apura o tempo

inventando a investidura
de planta formosa e pura,
sendo lírio ou sendo rosa,
ofertada sem mais nada

do que a vida retira
o sumo, a seiva, na selva
de um desejo realizado

em sendo frágil e fugaz,
feito o amor que foi e dura
o esplendor de seu momento.

 

                                   20'11, p. 2
       

MÃOS CAÍDAS

Impossível o gesto
nesta selva de cimento
e aço.

Mãos caídas
são uma despedida
da vida.

O tempo fecha
sobre si mesmo
e devora a última
esperança.

1976, p. 82
 

 

       

 OS SENTIDOS DO MUNDO

O que existirá quando não houver mais sentidos?
Não digo o sentido, a razão de existir no mundo
e do homem,
mas a ausência absoluta
de olhos abertos para a luz do dia,
de ouvidos captando o som da liturgia
da vida,
do tato exercitando o ofício de alisar
a pele dourada do sol,
do olfato a acariciar o perfume da flor,
do gosto penetrando as papilas da língua
e da palavra.
O mundo existe porque eu o vejo, escuto, apalpo,
e cheiro, provo.
Sem sentidos não tem sentido o mundo,
sem a existência dos sentidos o Universo
é matéria    morta
girando a improvável turbulência
de seus átomos inocentes e cegos.
Seria o horror do vazio, do nada, do inexistente,
do não percebido.
Só o olho do homem faz sentido e se revela na
palavra,
memória de um deus antigo
que perdeu forma e movimento
e nem espaço mais contempla
em volta do seu umbigo,
que um deus que espera o fim de tudo,
o absoluto, o caos, o vazio.

                     
2012, p. 93.

            *

Página ampliada e publicada em janeiro de 2023

 

 


NEW BRAZILIAN POEMS.  A bilingual anthology after Elizabeth Bishop.  Translated &       edited by Abhay K.. Preface by J. Sadlíer.  Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2019. 128 p.  16 x 23 cm. 
ISBN 978-85-7823-326-6   Includes 60 poets in Portuguese and English                                                     Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Sou brasileiro

Por trás da janela
vejo o país
que me condena:
cidades e campos,
rios e ruas
na retina.
Prisioneiros somos
da perspectiva
que nos afasta
do que é em nós
mais terra e sangue.
Por isso nos escondemos
atrás de mesas executivas,
folheamos manuais
de covardia.
Há de chegar o dia
de dizer
com orgulho: brasileiro,
muito prazer.

 

 

I´m Brazilian

Through the window
I see the country
which condemns me:
cities and Fields,
rivers and streets
in the retina.
We are prisioners
of the perspective
that keeps us Away
from what is in us,
more earth and blood.
That´s why we hide
behind executive tables,
leaf through manuals
of cowardice.
The day is coming
to say
with pride: Brazilian,
pleased to meet you.

 

F R A N Ç A I S

 


 

         LES AILES

 

        Qui pense
        l´oiseaux
        sur l´arbre
?

 

        (La vision
        dun poète
        et comme
        une flèche
        mortel.)

 

        L´oiseau
        nest past
        une nature
        mort
        par le poème

 

        Son alles
        le délivrer
        du l´arbre
        du poèma
        du poète.

 

 

        CHANSON D´AMOUR

 

        Ylia ici um paradis,
        la dame et as virtue,
        la dame et sa nue:
        un paradis perdue.

 

        Song ela jenesse doré
        son mariage enchanté,
        les corps son liés
        bras a bras, tête a tête.

 

        La vie comence tojour,
        homme, femme, l´amour,
        passer le monde un tour
        l avie c´est glamour.


       

 

        LE SANGLOT

        Le vielle/viel Verlaine
        a sonné a Paris,
        un sonnet ouvert,
        un sonnet vert,
        un sanglot in vain
        une larve in Paradis,
        une âme incertain.
      

        


TEXTS IN ENGLISH   - TEXTOS EM PORTUGUÊS

 

 

DEGRAZIA, José Eduardo.  Nova Iorque: Poema e Fotos. New York: Poem and Pictures. Tradução para o inglês / Translation Portuguese-English: Daniela Damaris Neu.  Santa Cruz do Sul, RS: Editora Gazeta, 2014.  54 p. 21x21 cm.   Impresso em papel couchê 150 g/m2 (miolo) e cartão Supremo 250 g/m2 (capa).  “ José Eduardo Degrazia “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

(fragmentos)

 

factoides,

andróides

de um novo tempo

em que os homens

não importam

além da pedra

e do mármore

de cúpulas

em cópula

e

formas

de naves e barcos

em arco

sobre o abismo

onde a barca

do sentido

mergulha suicida

em busca de ideias e discursos de paz e guerra e democracia

e jaz petrificado o espírito atónito diante da imensidão do cosmo

que se manifesta na miséria de ser apenas homem no discurso da pedra

e da perda da alma e de deus que se cala diante de um deus maior,

o dinheiro,

que cai do andar mais agudo do edifício num suicídio possível,

mas indesejado pelas gentes que mascam chiclete e comem moscas e hambúrgueres

e bebem Coca-Cola e descolam sonhos perdidos da engenharia do espírito,

onde tudo faz sentido ou se perde no esquecimento da máquina

que te convida a aderir à sua beleza terrível

 

ó Manhattan de pétalas de concreto,

ó Manhattan de pássaros de metal e vidro,

ó Manhattan de sonhos alcançados e perdidos,

ó Manhattan de pomos dourados e de deicídios,

ó Manhattan de garganta indecifrável que me devora,

ó Manhattan esfíngica

que me fornece o fio de Ariadne,

que me fornece o fio e o prumo,

que me fornece o fio e o rumo,

que me fornece o fio e o sumo,

que me fornece o rio e a ilha,

que me fornece o sizo e a loucura,

ó Manhattan que me desafia

para uma leitura apaixonada

e me perde onde tudo fala a língua do futuro,

onde tudo é nada ou um peixe que nada num mar de alta voltagem

 

como a nova Roma,

o império que reina soberano sobre o mundo

e me transtorna a fala,

e me contradiz o discurso,

e me confunde entre o escuro e o lume,

como saber para onde caminha a humanidade

se a vejo tão pequena e desvalida,

mas ao mesmo tempo tão soberba e orgulhosa

feito uma rosa de granito

que despetala sonhos e desditas

sobre as palavras caladas ou ditas

 

(...)

 

VI COLETÂNEA VIAGEM PELA ESCRITA. Homenagem ao escritor José Eduardo DegraziaOrg. de Jean Carlos Drumond. Volta Redonda, RJ: Gráfica Drumond, 2020.   94 p.   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

 

SILÊNCIO

Não penses que este silêncio
é simples ausência de vozes,

há espanto de flor nascendo,
abismo de pássaro noturno

       riscando o espelho furtivo da memória.
(O silêncio é
semente de algo mais antigo).

No silêncio tua vivência adelgaça
uma realidade de fruto.

Não penses que este silêncio
é simples ausência de vozes.



       CAMINHO ATRAVÉS DAS PALAVRAS

 

 
 

        A palavra é para mim um tapete mágico:
vou andando pela Rua da Praia em Porto Alegre
e de repente me vejo frente à catedral de Cuzco,
pois a palavra não tem fronteira.
A palavra é viagem que me leva através de coisas e do mundo.
Ah! Eu ando carregado de objetos, papéis, textos,
sentidos e mulheres que me amaram e deixaram marcas.
Passo sem deixar sinal nenhum levando signos na mala,
como se leva uma camisa, uma gravata, um terno.
Só as palavras mais ternas para usá-las no momento certo.
Depois volto para Porto Alegre porque sou poeta
e me permito todas as liberdades.
Fico vendo os homens sérios com suas pastas
e problemas
e sei que no fundo pouco podem com suas próprias
vidas.
Mas continuo a caminhar através das palavras
porque o mundo é como o de Alice, de Lewis Carrol,
o matemático genial que sabia tudo de todos.
Ninguém vai ao mundo para voltar impunemente.

 

 

 

 

 

 

TEXTS IN ENGLISH

 

(fragments)

 

factoids,

androids

of a new time,

where men

do not matter

further on the stone

and the marble

of cupolas

in copula

and

forms

of ships and boats

in arc

over the deep

where the barge

of the sense

dives suicidal

in search of ideas and speeches of peace and war and democracy

and the astonished spirit lies petrified before the immensity of the cosmos

manifested in the misery of being only man in the discourse of stone

and the loss of the soul and of god that is silent before a higher god,

money,

falling from the keenest floor of the building in a possible suicide but unwanted by the people who chew gum and eat flies and burgers

and drink coke and find out lost dreams of the spirit engineering

where everything makes sense or is lost in the oblivion of the machine

that invites you to join its terrible beauty

 

oh Manhattan petals of concrete,

oh Manhattan birds of metal and glass,

oh Manhattan achieved and lost dreams,

oh Manhattan of golden sinus and doom

oh Manhattan of indecipherable throat that devours me,

oh Manhattan sphinx shaped

that gives me the Ariadne's thread,

that gives me the clue and plumb,

that gives me the clue and the direction,

that gives me the clue and lushness,

that gives me the river and the island,

that provides me prudence and madness,

oh Manhattan that challenges me

to a passionate reading

and loses me where everything speaks the language of the future

where everything is nothing, or a fish swimming in a sea of high voltage as the new Rome

the empire that reigns sovereign over the world

and upsets my speech,

and contradicts my discourse,

and confuses me between the dark and the candle,

how to know where humanity walks to

if I see it so small and helpless,

but at the same time so wonderful and proud
like a rose of granite

that limbs dreams and misfortunes

on silent or spoken words

 

(…)

 

DEGRAZIA, José EduardoLove is Geometry.  Gravataí, RS: Clube Literário de Gravataí, 2015.   134 p.  14,5c21 cm. Inclui o prefácio "Degrazia is all poets"", por Eduardo Jablonski.  Ex. bibl. Salomão Sousa.

 

(a selection of Degrazia´s poems in English)

 

        SPRING

 

        The frame
        of the frog
        fraught
        with froth
        frantic.

 

        *


        The day
        of spring
        is fresh water
        on my neck.

 

        *

 

        The birds
        in a net of nests
        are a necklace
        on a tree.

 

        *


        A nice niche
        in a wood
        The Wind.

 

 

 

        SUMMER

 

        A girl in the night
        with stars in hair,
        wear a short skirt.

 

        *

 

        The sea and sand
        under feet.
        The hand on mine.

 

        *

 

        The music of summer
        is a Golden fish
        A kiss on a ship

 

 

 

        AUTUMN

 

        The moss
        in the head
        of the boss.

 

        *

 

        The spider´s web
        in the hand
        of a spy.

 

        *

 

        The fog
        in the mouth
        of a frog.

 

 

 

        WINTER

 

        A deep sound
        in a winter´s day
        like a violin: play.

 

        *

 

        The rain around
        the world,
        does not drop in vain.

 

        *

 

        A woman´s tear
        is like a diamond,
        drop of bright fear.

 

 

 

EN ITALIANO

Trad. Iris Faion

 

 

 

JJosé Eduardo DEGRAZiA è nato a Porto Alegrenel 1951. è medico, scritto­re e ha 19 libri pubblicati. Ha pubblicato, di poesia: Laura permanente (1975), Cidade submersa (1979), A urna guarani (1004), Corpo do Brasil (1011), A fior fugaz (1011 ). Racconti: 0 atleta recordista (1996), A orelba do bugre (1998), A terra sem males, Os leóes selvagens de Tanganica. Romanzo breve: 0 reino de macambira (zoo 5 ), A fabulosa viagem do mei de lecbiguana (2008). Letteratura per ragazzi: 0 samba dagirafa (1985),^ caturrita cocota (1991), Gato esapato (1997). Come traduttore dallo spagnolo e dall'italiano, ha pubblicato 14 libri, tra cui 7 di Pablo Neruda. Tra i premi ricevuti, citiamo: Prèmio do Biènio da Coloniza^ào e Imigrai^ào con Lavra Permanente, 1974; Prèmio de teatro do SNT con la pièce A Casa dos Impossiveis, 1975; Prèmio O Sul per la miglior traduzione 2006, per i libri di Pablo Neruda; Prèmio Livro do Ano da Asso­cialo Gaùcha de Escritores, 1006; Prèmio da Academia Internacional Mihai Eminescu di Romania per l'Opera in prosa, 2012; Premio Internazionale di Poesia di Trieste, zoi 3; Premio dell'Unione degli scrittori moldavi zoi 5.

 

 

O MENDIGO E O CÃO

 

O cachorro e o mendigo comem na calçada.

O cão é preto e morde um osso,

o dono veste trapos e come um pão.

Restos de papelão: sinais da cama onde passaram a noite.

A garrafa no cordão da calçada: o homem toma

um gole, e ri para os carros que passam.

O sol de inverno é fraco, mas esquenta.

O mendigo se encosta na parede, parece feliz.

O cão pula no seu colo: um olho aberto, o outro fechado

Controla o movimento, cão de guarda que é.

O mendigo fecha os olhos e dorme.

O cão lambe a mão.

 

IL MENDICANTE E IL CANE

 

Il cane e il mendicante mangiano per terra.

Il cane è nero e morde un osso,

il padrone vestito di stracci mangia del pane.

Pezzi di cartone: tracce del letto dove hanno passato la notte.

La bottiglia sul bordo del marciapiede: l’uomo beve

un sorso, e ride alle macchine che passano.

Il sole invernale è debole, ma scalda.

Il mendicante s’appoggia al muro, sembra felice.

Il cane gli salta in grembo: un occhio aperto, l’altro chiuso,

controlla i movimenti, come un bravo cane da guardia.

Il mendicante chiude gli occhi e dorme.

Il cane gli lecca la mano.

 

 

 

A FORÇA DO POEMA E/OU SUA SEM-CERIMÔNIA

 

O poema

entrou em mim

 

como se

derrubasse a porta

de uma casa

 

ou simplesmente

enrolasse os pés

no tapete

 

e caísse

sobre o peito

de um homem.

 

Só arestas,

seco, ácido

de um lado,

 

duro: pedra,

afiado: faca,

explosivo: obus,

 

não deixou

alternativa: detoná-lo

no branco da página.

 

 

LA FORZA DELLA POESIA E/O LA SUA INFORMALITÀ

 

La poesia

entrò in me

 

come se

abbattesse la porta

di una casa

 

o semplicemente

avvolgesse i piedi

in un tappeto

 

e cadesse

sul petto

di un uomo.

 

Soltanto margini,

secca, acida

da un lato,

 

dura: pietra,

affilata: coltello,

esplosiva: obice,

 

non dette

alternativa: farla esplodere

sul bianco della pagina.

 

 

OS BÊBADOS

 

Sábado à noite

os ônibus que vêm dos bairros

viajam num mar de álcool.

Os bêbados vão entrando,

alguns são triste, calados,

sentam num canto e ficam.

Outros são contadores de histórias,

xingam, brigam

e embrabecem se ninguém

brinca com eles.

Há os que choram

não sei que mágoas de amor.

Aprofundam os túneis da madrugada.

 

 

GLI UBRIACHI

 

Sabato notte

gli autobus che passano per i quartieri

viaggiano in un mare d’alcol.

Gli ubriachi salgono,

alcuni sono tristi, silenziosi,

siedono in un angolo e lì rimangono.

Altri raccontano storie,

bestemmiano, bisticciano

e s’infervorano se nessuno

gioca con loro.

Alcuni piangono

non so quali pene d’amore.

Sprofondano nei tunnel dell’alba.

 

 

TOMO CAFÉ

 

Entre restos da última

refeição e xícaras sujas,

aqueço o café para a longa

espera dentro da noite.

Talvez alguém sinta

o homem esvair-se

e bata alucinadamente à porta,

uma chuva caia repentina.

Provavelmente alguém estará rezando.

Algumas pessoas mostrarão indiferentes

mais um dia passado no calendário.

Abrirei a porta e a janela

para que os fantasmas entrem na sala.

O café esfria.

Quem me fará companhia?

 

 

PRENDO IL CAFFÈ

 

Tra gli avanzi dell’ultimo

pasto e tazze sporche,

scaldo il caffè per la lunga

attesa della notte.

Forse qualcuno ascolta

l’uomo svenire

e bussa allucinato alla porta,

una pioggia cade improvvisa.

Magari qualcuno starà pregando.

Alcune persone si mostreranno indifferenti

un giorno in più è passato sul calendario.

Aprirei la porta e la finestra

per far entrare i fantasmi nella stanza.

Il caffè raffredda.

Chi mi farà compagnia?

 

 

SILÊNCIO

 

Não penses que este silêncio

é simples ausência de vozes,

 

há o espanto da flor nascendo

abismo de pássaro noturno

 

riscando o espelho furtivo da memória.

(O silêncio é semente de algo mais antigo.)

 

No silêncio a vivência adelgaça

uma realidade de fruto.

 

Não penses que este silêncio

é simples ausência de vozes.

 

 

SILENZIO

 

Non pensare che questo silenzio

sia semplice assenza di voci,

 

c’è lo stupore del fiore che sboccia

abisso del passero notturno

 

che gratta furtivo lo specchio della memoria.

(Il silenzio è il seme di qualcosa di più antico.)

 

Nel silenzio l’esistenza attenua

una realtà di frutto.

 

Non pensare che questo silenzio

sia semplice assenza di voci.

 

 

A MESA DA FAMÍLIA

 

Madeira crestada de tempo.

Resina impregnada de tempo.

Assim a mesa e a família reunida,

e os riscos de faca no cerne da madeira,

e o vinho derramado, a mancha,

o sal, a lágrima, sol na madeira.

A mão que alisou o sulco, o veio,

a mão gretada de tempo: madeira.

Árvore noturna caída, pelo machado abatida,

árvore do tempo plantada.

À volta da mesa sentados, o pai,

a mãe, os filhos: álbum de retratos.

A mesa permanece no meio da sala:

o mais: sombras.

 

 

IL TAVOLO DELLA FAMIGLIA

 

Legno invecchiato dal tempo.

Resina impregnata di tempo.

Cosi il tavolo e la famiglia riunita,

e i rischi del coltello nella carne del legno,

e il vino versato, la macchia,

il sale, la lacrima, sole sul legno.

La mano che levigò il solco, la vena,

la mano graffiata dal tempo: legno.

Albero notturno caduto, abbattuto dall’ascia,

albero piantato dal tempo.

Seduti attorno al tavolo, il padre,

la madre, i figli: album di ritratti.

Il tavolo rimane in mezzo alla stanza:

o di più: ombre.

 

 

MOTIVO DE FORÇA MAIOR

 

Às vezes uma canção

de origem obscura me invade,

uma ventania da pampa,

uma nudez marinha de caracóis,

um sono de nuvem bojuda de chuva.

 

A fala da mulher de seios morenos

no meio da noite com besouros zumbindo,

cor azul de céu ou verde céspede,

floresta de campânulas, campainhas sonoras,

e gritos intensos de paixão na noite da mata,

ritos de gatos de amores violentos em cima dos telhados,

vozes veludosas de violeiros nos bares de subúrbio,

gemido de menino doente tossindo na madrugada,

jogadores no pano verde jogando suas vidas no carteado,

bêbados improvisando cantos para a lua,

operários esperando o ônibus na madrugada.

E eu, atônito e desperto, escrevo

a ordem peremptória das musas,

psicografo a mensagem noturna,

de uma força maior que me incendeia.

 

 

CAUSA DI FORZA MAGGIORE

 

A volte una canzone

di origine misteriosa mi invade,

una tempesta della pampa,

una nudità marina di conchiglia,

un sonno di nuvole gonfie di pioggia.

 

Le chiacchiere di una donna dai seni scuri

nel cuore della notte mentre insetti ronzano,

azzurre come il cielo o verdi come zolle,

foreste di campanule, campanelle sonore,

e urla intense di passione nella notte della boscaglia,

riti di gatti in calore in cima ai tetti,

voci vellutate di violinisti in bar di periferia,

gemiti di bimbo dolente per la tosse all’alba,

giocatori d’azzardo che si giocano a carte la vita,

ubriachi che improvvisano serenate alla luna,

operaio che aspetta il bus all’alba.

E io, attonito e sveglio, scrivo

sotto ordine delle muse,

psicografo di messaggi notturni,

di una forza maggiore che mi incendia.

 

 

AOS POETAS MENORES

 

Pequenos poemas perdidos

por poetas menores,

poetas sem sorte,

sem porte de arma,

sem coldre, sem calma.

 

Eu os apanho, são rebanho,

estão à mercê, à porfia,

poemas de avós e de tias,

que rimam em ão e anho.

 

Eis que sã poetas a brilhar

em versos brancos da província,

poetas menores, sem polícia,

e que sabem de amor rimar.

 

 

I POETI MINORI

 

Piccole poesie perdute

di poeti minori,

poeti senza fortuna,

senza porto d’armi,

senza fondina, senza calma.

 

Io li raccolgo, sono gregge,

sono sopraffatti, di nicchia,

poesie di nonni e di zie,

che fanno rima in ore e one.

 

Quelli che brillano

nei loro versi bianchi di provincia,

poeti minori, senza polizia,

e che sanno le rime d’amore.

 

 

INCONTRI CON LA POESIA DEL MONDO. ENCONTROS COM A POESIA DO MUNDO. Antologia poética bilíngue. Italiano – Português.  Antologia poética bilíngue. A cura di Vera Lúcia de Oliveira; Paula de Paiva Limão.  Perugia, Italia: Edizioni dell´Urogallo / CILBRA – Centro di Studi Comparati Italo-Luso-Brasiliani, 2016.  242 p. Em colaboração com o Programa de Pós-Graduação em Literatura, Universidade de Brasília.   ISBN 978-88-97365-41-9    Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Le poesie A nitidez das coisas, A mesa da familia e Chuva antiga sono tradotte da Iris Faion; mentre Silèncio, Naufragio e 0 caminho invioldvel da Gaetano Longo/Os poemas A nitidez das coisas, A mesa da familia e Chuva antiga foram traduzidos por Iris Faion; os poemas Silèncio, Naufràgio e 0 caminho invioldvel por Gaetano Longo

 

 

A nitidez das coisas

 

No silêncio da casa, quando as madeiras estalam,
espero o movimento da engrenagem do tempo,
a manifestação evidente da máquina do mundo,
as pás do moinho moendo a farinha dos dias,
os dentes trincando a pele da feroz existência,
o rolar dos minutos no relógio náufrago da manhã,
o zumbido da mosca contra sua imagem no vidro.

 

No silêncio da casa, quando estremecem os móveis
e trepidam os eletrodomésticos nas redomas de vidro,
zunindo em uníssono cantochão entre as moedas
nítidas do sol e as moendas trituradoras de emoções,
a polia que range a palavra contra a indiferença,
o destino dos pratos e talheres prisioneiros, lentamente
desfazendo-se em barro e mortal ferrugem.

 

As coisas morrem sem pânico enquanto olhamos
distraídos o vento que levanta as cortinas da sala.

 

Só as coisas são nítidas e têm alma, e acreditam
na vida eterna.

 

 

La nitidezza delle cose

 

 

 

Nel silenzio di casa, quando il legno scricchiola,
aspetto i movimenti degli ingranaggi del tempo,
la manifestazione evidente della macchina del mondo,
le pale del mulino che macinano la farina dei giorni,
i denti che recidono la pelle della feroce esistenza,

lo scorrere dei minuti dell'orologio naufrago del domani,

lo ronzio della mosca contro la sua immagine nel vetro.

 

Nel silenzio di casa, quando tremano i mobili

e oscillano gli elettrodomestici nel riflesso del vetro,

stridendo in un coro liturgico tra le monete

nitide sotto il sole e le pale che tritano emozioni,

e la puleggia che bisbiglia parole contro l'indifferenza,

il destino delle posate e piatti prigionieri, lentamente

si disfano in argilla e ruggine mortale.

 

Le cose muoiono senza panico mentre guardiamo
distratti il vento che solleva le tende della stanza.

 

Soltanto le cose sono nitide e hanno un'anima, e credono
nella vita eterna.

 

 

         A mesa da família

 

Madeira crestada de tempo.

Resina impregnada de tempo.

Assim a mesa e a família reunida,

e os riscos de faca no cerne da madeira,

e o vinho derramado, a mancha,

o sal, a lágrima, sol na madeira.

A mão que alisou o sulco, o veio,

a mão gretada de tempo: madeira.

Árvore noturna caída, pelo machado ab

árvore de tempo plantada.

A volta da mesa, sentados, o pai

a mãe, os filhos: álbum de retratos.

A mesa permanece no meio da sala:

         o mais: sombras.

 

 

                   Il tavolo della famiglia

 

Legno invecchiato dal tempo.

Resina impregnata di tempo.

Così il tavolo e la famiglia riunita,

e i rischi del coltello nella carne del legno,

e il vino versato, la macchia,

il sale, la lacrima, sole sul legno.

La mano che levigò il solco, la vena,

la mano graffiata dal tempo: legno.

Albero notturno caduto, abbattuto dall'ascia,

albero piantato dal tempo.

Seduti attorno al tavolo, il padre,

la madre, i figli: album di ritratti.

Il tavolo rimane in mezzo alla stanza:

o di più: ombre

 

 

Chuva antiga

 

A chuva escreve

hieróglifos

na janela

do ônibus.

Cada pingo

traça um sonho

cada sonho respinga

uma saudade

e desenha um rosto

na paisagem

que passa.

A chuva termina

o sonho acaba

e o ônibus vai embora

sem se importar

com teu rosto

e com meu sonho.

 

 

 Pioggia antica  

La pioggia scrive
geroglifici
sul finestrino
dell'autobus.
Ogni goccia
traccia un sogno
ogni sogno allontana
una nostalgia
e disegna un volto
nel paesaggio
che scorre.
La pioggia cessa
il sogno finisce
e l'autobus se ne va
e non gliene importa
del tuo viso
e del mio sogno.

 

Naufrágio

 

         Para Guilhermino Cesar

 

O meu castelo
é o mar aberto
praias de areia branca.

 

Sou amante
de sereias
afogadas.

 

Faço meu jardim
de algas, anêmonas
e quimeras.

 

Vivo entre ameias
de cascos afundados
e arcas de tesouro.

 

Sou o que ficou

do meu próprio naufrágio.

 

 

Naufragio

 

          Per Guilhermino Cesar

 

Il mio castello

è il mare aperto

spiagge di sabbia bianca.

 

Sono amante
di sirene
affogate.

 

Costruisco il mio giardino
con alghe, anemone
e chimere.

 

Vivo fra parapetti
di chiglie affondate e
 arche del tesoro.

 

Sono ciò che rimane
del mio naufragio.

 

 

 

Silêncio

 

Não penses que este silêncio
é simples ausência de vozes,

 

há o espanto da flor nascendo
abismo de pássaro noturno

 

riscando o espelho furtivo da memória.
(O silêncio é semente de algo mais antigo.)

 

No silêncio a vivência adelgaça
uma realidade de fruto.

 

Não penses que este silêncio
é simples ausência de vozes.

 

 

Silenzio

 

Non pensare che questo silenzio
sia semplice assenza di voci,

 

c'è lo stupore del fiore che sboccia
abisso di passero notturno

 

che graffia furtivo lo specchio della memoria.
(Il silenzio è il seme di qualcosa di più antico.)

 

Nel silenzio l'esistenza assottiglia
una realtà di frutto.

 

Non pensare che questo silenzio
sia semplice assenza di voci.

 

 

O caminho inviolável

 

Nem todos somos maus.
Há em alguns uma certa ternura.
Noutros uma maneira especial de sorrir.
Nos cumprimentamos corteses na rua,
apertos de mãos macios, leve mover de lábios.
E continuamos o caminho inviolável.

 

 

        Il cammino inviolabile

 

Non siamo tutti cattivi.

In alcuni c'è una certa tenerezza.

In altri, un modo speciale di sorridere.

Ci salutiamo cortesemente per la strada,

aperti con mani morbide, lieve movimento di labbra.

E continuiamo soli il cammino inviolabile

 

NEW BRAZILIAN POEMS.  A bilingual anthology after Elizabeth Bishop.  Translated &       edited by Abhay K.. Preface by J. Sadlíer.  Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2019. 128 p.  16 x 23 cm.   ISBN 978-85-7823-326-6   Includes 60 poets in Portuguese and English         

                                                            Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Sou brasileiro

 

Por trás da janela
vejo o país
que me condena:
cidades e campos,
rios e ruas
na retina.
Prisioneiros somos
da perspectiva
que nos afasta
do que é em nós
mais terra e sangue.
Por isso nos escondemos
atrás de mesas executivas,
folheamos manuais
de covardia.
Há de chegar o dia
dizer
com orgulho: brasileiro,
muito prazer.

 

 

I´m Brazilian

Through the window
I see the country
which condemns me:
cities and fields,
rivers and streets
in the retina.
We are prisioners
of the perspective
that keeps us away
from what is in us,
more earth and blood.
That´s why we hide
behind executive tables,
leaf through manuals
of cowardice.
The day is coming
to say
with pride: Brazilian,
please to meet you.

 

 

MEYA PONTE. REVISTA QUADRIMESTRAL DE LITERATURA. No. 16  Editor: Arnaldo Sarty.   Pirenópolis,  Goiás: 2003.   162 p.  16 x 22,5 cm.    

 

Só a canção conhece

       1

Sombra de uma sombra
sou
pelo caminho
e dou-me feito dor
de quem perdeu
o destino
mas não o sentido.

O caminhar se faz
do impressentido
voo.

Tateio na luz
tal cego
no diamante.


FEITO PÉROLA

de uma concha
subitamente alerta.

Chaga aberta
no peito
sem desejo

procuro
o obscuro
o odre de água
fresca
no escuro.

Palavra de um deus
mordido
no calcanhar

ecoa no ar
escoa    ar
entoa    ar
e entorna

água votiva
volitiva
vomitiva.

Palavra a ser
dormida
comida
na ceia
e na cama
entre seios
entre pernas
de quem
ama.

Entre liames
e ciladas
sou homem
defendendo
um nome

sou homem
combatendo
a fome.

2

Sombra perdida
na esquina
da    vida
dádiva de um deus
primitivo
e esquivo
vou     e      voo
em vão em voltas
de uma luz eterna
envolto
em trevas
e travas

Nada sei de um deus
que me desencaminha
feito agulha e linha
tecendo sombra     e
sombra
entre dourados      e
sóis
e
sóis

 

       SOU

Bato na porta do tempo
e ecoa o vento
o oco o
o                ovo
o               povo
o               polvo
o               pó.

3

Órfão de um deus
num jogo de dados
ainda assim sou
guerreiro
e        sol
dado

lutando a favor
e contra
na labuta
dos dias
no amanho
da terra
no assalto.

4

Bárbara a voz
apruma em canto
a desvalia.

O que alia  pranto
desencanto
de querer ser mais
o sonho    a porfia.

Arremesso e fuga
música
e nota
astronauta


DE UMA OUTRA
                             ETERNIDADE

 

              Sombra entre sombras
somos
só o amor amanhece
só a canção conhece.

 

*

Página ampliada e republicada em janeiro de 2023



 

*

Página ampliada e republicada em janeiro de 2022

 

 

 

 

 

***

 

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Ampliada e republicada em outubro de 2017; ampliada em agosto de 2018; ampliada em setembro de 2019; página ampliada em dezembro de 2020

Página ampliada e republicada em dezembro de 2020; ampliada em janeiro de 2021

 

 



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