GALBA DE PAIVA
Galba de Paiva, poeta gaúcho, nascido em 1893, faleceu em 1938. Formado em Direito no Rio de Janeiro, desenvolveu sua atividade profissional como administrador e magistrado no Rio Grande do Sul. Parceiro do músico Marcelo Tupinambá como letrista da música “Soldadinho de Chumbo”.
MARIA-GILMA
Minha filha, nem sempre a vida é boa.
Nem tudo o que se quer às mãos nos vem;
Mesmo a felicidade — a que atordoa —
Não representa a síntese do bem.
És a menor de todas... mas, ressoa
Dentro em meu coração, o teu, também.
Minha filha, nem sempre a vida é boa,
Mais amarguras que alegrias tem.
Ampara-te à virtude. Estuda e pensa.
Não cobices o fruto mal colhido;
Resume na bondade a tua crença!
Se casares então, haja o que houver,
Ama teu lar, teus filhos, teu marido,
E, pelo sacrifício, sê mulher!
PAIVA, Galba de. Folhas… (1º milheiro) Bagé, RS: Typographia da Casa Maciel, s.d. 112 p. 15x22 cm. Cópia mimeográfica do livro, encadernada.
(Abaixo, textos com ortografia atualizada:)
PERANTE A DÚVIDA
Penso. E que sou? Diz-me a vaidade — tudo!
Mas a razão imperturbável — nada!
E olhando a vida fico absorto e mudo,
Vendo-a de sonhos puros constelada.
A inspiração segreda-me contudo:
“Canta! Eleva-te á Patria-Iluminada…
“E o previdente espírito sisudo:
“Chora! Se és pó, é certa a derrocada…”
Ah! quanta cousa para ser pesada,
Nessa comedia, nesse grande entrudo,
Onde a alma vive sempre enclausurada!
Mas do termo final já não me iludo:
—Basta a triste certeza de ser nada,
Basta a vaga esperança de ser tudo…
ABATIMENTO
Abandona-me a força de outras eras
De suster a esperança, que consola…
Mas o meu coração sente, deveras,
Que o maior bem é não pedir esmola.
Iluminam-me as tuas primaveras
E esse perfume que de ti se evola…
Mas, ah! vacila, ante razões sinceras,
A que nos prende resistente mola.
E se me julgas muito descuidado
Do sofrimento que me está latente,
É que o destino se me torna duro:
Pois no alívio das magoas do passado,
Na ilusória ventura do presente,
Paira a incerteza desse meu futuro.
CANTAREI
“Cantando espalharei por toda parte
Se a tanto me ajudar engenho e arte.
CAMÕES
Cantarei! Entre sons, esta vida modesta,
Hei de passar assim como a cigarra , embora
Sinta no íntimo doer, na harmonia da festa,
A minha alma infeliz, sensível e sonora.
Cantarei! Para ter a gloria, que me resta,
De isolado poder sondar, a qualquer hora,
A rima que esvoaça a rir, doirada e lesta,
Nascida do interior de um coração que chora.
Cantarei! Pois um prêmio ainda ambiciono e quero:
É o consolo, depois de haver cantado tanto,
Que Ela ao menos saiba o quanto me faz triste.
IX
(Mlle. F. C. )
Duas palavras só. Desculpe-me a franqueza.
Está longe de mim qualquer ideia oculta…
Senhora. Uma singela e rápida consulta,
Feita com sentimento e com delicadeza.
Desejava saber porque sua alma culta
Esbate-se em capricho e permanece presa
A quem não reconhece a infinita grandeza
Que no seu gesto eu leio e em seu olha avulta.
Um gracejo incivil nunca um bem nos resulta…
Nem pretendo ferir sua altivez ilesa
A um conselho de amor que, no seu caso, insulta…
Expresso-me, porém: — sua graça e beleza
Merecem muito mais que uma cabeça estulta!
Perdão. Não foi por mal. Desculpe-me a franqueza.
Página publicada em novembro de 2016; ampliada em dezembro de 2016.
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