ADRIANO NUNES
Adriano Nunes, servidor público federal, médico e poeta. Poeta. Sempre poeta. Tendo nascido no sertão alagoano, desde muito cedo entregou-se à poesia e entendeu que a mesma não teria qualquer lugar fixo, tempo preciso e nem poderia ser pesada pelo pensamento. Imerso em seu mundo intimamente poético, afirma, sem receio, aos amigos e leitores: "Não saberia viver sem as musas, sem a Poesia".
"Adriano Nunes é o poeta-dínamo da blogosfera. Através da sua arcádia eletrônica, "quefaçocomoquenãofaço", presenteia-nos com uma produção poética imensa, em qualidade e quantidade, ecoando seus , preciosos timbres, em alucinante obra em progresso. Exímio artesão do verso, Adriano incorpora influências múltiplas ao seu canto - dos simbolistas aos concretos - caracterizado por técnica apurada, condensação e incomum sensibilidade, que marcam profundamente o leitor, sem a aridez e o hermetismo característicos de grande parte da produção poética contemporânea." José Mariano Filho
NUNES, Adriano. Laringes de grafite. Porto Alegre: Vidráguas, 2012,. 104 p. 14x21 cm. ISBN 978-85-62077-10-4 Capa: Gal Oppido. Col. A.M.
Corpo
Para Régis Bonvicino
como concebê-lo
do tarso ao cabelo
sem medo de um erro?
(não seria um erro?)
como revirá-lo
(fala, fome, falo)
no verso, de fato?
com um ritmo exato?
como consegui-lo
agora, em sigilo,
pra vê-lo infinito
sob a luz do escrito?
como conhecê-lo
pela pele, apelo
tátil, em mim mesmo?
(pelo toque, a esmo?)
como dissecá-lo
no vão intervalo
da vida? (que traço
falta? forma? braço?)
como discuti-lo,
sem qualquer grilo,
sem os véus do olvido?
(o que é permitido?)
como descrevê-lo
com esmero, zelo,
sem nenhum tropeço?
(que regra obedeço?)
como desvendá-lo
de vez, num estalo
mágico? (divago...
pra que tanto estrago?)
como descobri-lo
(não será vacilo
dos olhos?) do umbigo
à voz que persigo?
como devolvê-lo
pleno, inteiro ou pelo
menos verdadeiro?
(através do cheiro?)
como repensá-lo,
ao cantar do galo,
conservando o fígado
friamente bicado?
como consumi-lo
(mão, mente, mamilo)
explícito, vivo,
sem um objetivo.
Coisas da cabeça
Para Haroldo de Campos
se pensasse pouso
pólen pluma prisma
se pensasse porto
ponta praça pista
se pensasse ponto
pranto prego pinta
se pensasse pomo
planta plasma pílula
se pensasse pouco
e sentisse ainda'
se sentisse polo
plano prado pilha
se sentisse porta
prédio pedra pino
se sentisse poço
pausa ponte pico
se sentisse pólvora
peso prece pique
se sentisse posse
e ainda pensasse
basta, coração!
Soneto IV
Para Pendes Cavalcanti
o pensamento
pesa o poema.
por que supõe
ser assim leve
como uma pena?
porque sequer
nada pondera
ou principia?
o pensamento
é mesmo cego.
porque não vê
que só o poema
tudo suporta,
tudo sustenta?
O poema
Para Ferreira Gullar
O poema é
Essa sala de estar
Onde - desafiando o
Infinito -
Umas às outras, as palavras
Passam a se conhecer
Perigosamente melhor.
Entendimento
Para Horàcio
diante do que ainda está
por vir, do raro entendimento,
sobre o que devo fazer
neste momento, sem pressa,
medos, angústias, sem erro
de cálculo, dar um passo
adiante do porvir,
desse instrumento sintático
a invadir-me a todo instante,
sobre o que além construir
com o que abrigo em mim, dentro,
com o arcabouço cinzento,
se um poema ou o que bem penso,
admito: quero o infinito
perto, as musas, todo canto: um
poema é mais importante.
Página publicada em julho de 2013.
|