WALDEMAR DIAS DA CUNHA
Afirmei ser Waldemar poeta que-busca-pelo-ser e nessa busca - permanente, incessante, incansável - que o ser da palavra é posto frente a frente com o ser das coisas e das gentes. DAVID MUSSA
No marasmo natural da poesia brasileira — natural porque produzido por um período longo durante o qual a poesia foi aqui posta a serviço de tudo, como se ela não fosse, inclusive, em si, uma forma de existência, mas só pudesse justificar-se quando presa a uma seita, a uma ideia, a um plano, a uma campanha, a uma igreja — nesse marasmo natural surge agora uma poesia que é alta e limpa forma de conhecimento. É a de Waldemar Dias da Cunha, cujo primeiro livro estou apresentando. Sua poesia vem de longe.
Como a realizou sempre em transe e numa tentativa de descobrir mais sobre o homem e sua mundologia, nunca lhe ocorreu publicá-la. Fazia poemas como quem exerce um ministério religioso, sentia o verso como técnica de aperfeiçoamento pessoal. Cumpria sua missão de erguer poemascom a talvez convicção de que a poesia pode melhorar o homem. ANTONIO OLINTO
CUNHA, Waldemar Dias da.O rito da fala. Rio de Janeiro: Seta Edições, 1971. 144 p. (Coleção Cápsula, I) 14x21 cm. Capa de Wladimir Dias-Pino. Col. A.M.
1
IV
Não me fora
difícil o feito
de fundir com raios
suas imagens
que antes
eram indecifráveis —
gravadas estavam
em suas
falas
no fundo abismo dos mares —
Eram simples
dardos de ouro
lançados de seus
cavalos de
fogo
que em
fúria
desceram nessas
águas —
submersas
em total
entrega
nos umbrais
da cidade
eterna
v
Seus rastros ficaram nos
astros
deixando na coroa do tempo
o tronco de todas as
raças —
fora na laca da lua suas penas
feitas da massa das estrelas
que encheram o trono deste
poema —
vindo de sistemas desconhecidos
atravessando mares de
galáxias
enquanto culturas de outros sóis
já o têm no seio dos
mais lidos
VII
Vozes que saem das profundas
jamais navegadas águas
no cristal de antigos mares —
vozes que transmudo em
arte
no controle das palavras
através de tantas raças —
rasgai a luz que me devora
voltai meus olhos pra fora
sangrai-me em torno da fala!
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