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SOLANGE REBUZZI

SOLANGE REBUZZI


(Rio de Janeiro, 1951)  é poeta, psicanalista e doutora em Literatura Brasileira. Publicou em poesia, entre outros, Leblon, voz e chão (2004), e o ensaio Leminsky, guerreiro da linguagem (2003).


Página da autora: www.solrebuzzi.com

 

 

A bota de inverno

 

Ela está em negro.

 

No trem, a mulher esconde-e

sob as pregas

de sombras azuis.

o frio respira

mãos de unhas cuidadas,

a pedra verde fascina a outra mulher.

Elas se olham rapidamente,

o trem-metrô-em-trilhos

carrega torres de Babel:

Línguas e olhares.

 

O corpo em crise

(fevereiro de 2005)

não percebe o poema

que começa.

                    Não me mexo,

Sinto os pés inchando

devagar. A pele parece ausente,

as unhas dos dedos

pedem espaço. Penso:

ao chegar em casa,

me deterei

- ao lavar os pés –

m a s s a g e a n d o  o s  d e d o s

(despidos de dóceis meias).

 

Algumas mulheres trazem consigo

 

os pés herança

 

na trama da linha que escorrega

 

sem derrame ou cicatriz.

 

 

Indianas

 

1

Cinco mulheres em véus e sandálias de plataforma alta.

Verão.

 

 

2

Eu não estava em Bombaim mas seus tornozelos tinham a tonalidade das pétalas de rosa, um pouco violeta. Corriam entre os carros assustadas.

Vislumbrei a calça jeans embaixo das dobras vermelhas da seda. Talvez, em função da maquiagem, da sensualidade do andar, eu tenha parado para olhá-las:

ritmo, perfume, cor...

Por um milagres elas surgiram. Foi como pude senti-las naquele longo boulevard Raspail.

 

3

Um pintor teria dito:

parem!

Degas pintaria a idade de seus pés ou de suas mãos? Matisse, os volumes e as formas

dos braços?

Abro um parêntese.

Fui ao dicionário. Procurei, sem saber bem onde estava indo, a palavra rubra.

Precisava do vocábulo para justificar meu poema que atraía sementes.

 

4

A “coisa” colorida. O vestido de uma Mulher pede para ser usado no plural,

v e s t i d o s  d e  M u l h e r e s.

 

Há mais coisas a dizer.

Narinas abertas respiram o ar quase púrpuro da luz.

 

Essas mulheres

na tela escritural,

não longe

uma das outras,

convivem com o final do dia.

 

5

Sobrancelhas arqueadas

à lápis noir

turquesa – entre – os olhos

não menos que outras cores

sobre a pele brilhante.

Um piscar de movimento brusco

é uma possibilidade

no novo mundo

do texto,

e distingue o jamais visto.

 

Enfim me rendo!

 

RUBRO – vermelho muito vivo; da cor de sangue.      

     

 

Poemas extraídos da revista POESIA SEMPRE (Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro), Número 26, Ano 14, 2007.

 

 

Página publicada em novembro de 2009.

 

 

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