Home
Sobre Antonio Miranda
Currículo Lattes
Grupo Renovación
Cuatro Tablas
Terra Brasilis
Em Destaque
Textos en Español
Xulio Formoso
Livro de Visitas
Colaboradores
Links Temáticos
Indique esta página
Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


SÉRGIO NAZAR DAVID

SÉRGIO NAZAR DAVID 

Doutor em Teoria da Literatura (UFRJ, 2001), com Pós-Doutorado em Coimbra (2006). Poeta e professor de Literatura Portuguesa (UERJ). Membro do Centro de Literaturas de Expressão Portuguesa das Universidades de Lisboa e do Centro de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra.

Autor de Onze moedas de chumbo (poesia, 7Letras, 2001), Freud e a religião (ensaio, Jorge Zahar, 2003), A primeira pedra (poesia, 7 Letras, 2006 - indicado ao Prêmio Portugal Telecom 2007), O século de Silvestre da Silva - Vol. I - Estudos sobre Garrett, A. P. Lopes de Mendonça, Camilo Castelo Branco e Júlio Dinis (ensaio, Editora Prefácio, 2007) e O século de Silvestre da Silva - Vol. II - Estudos queirosianos (ensaio, FAPERJ / 7Letras, 2007).

Organizador da edição crítica de Cartas de amor à Viscondessa da Luz (7 Letras, 2004 - Quasi Edições, 2007), de Almeida Garrett.

 

De
A PRIMEIRA PEDRA
Rio de Janeiro: 7Letras, 2006

 

IV. MÁQUINA DE ESCREVER

 

Hoje um poema me fez sonhar de novo

com o dia em que fui matricular-me

na escola de datilografia perto da igreja

 

de São José. Foi um poema que fiz

de uma pedra, a primeira que um homem

construísse, depois de terminado o mundo.

 

Foi dela que pude subtrair-me e ser

outra vez aquele que aprendeu tudo

na vida numa máquina de escrever.

 

Meu coração também é uma máquina,

embora quase não aprenda nada.

Sua responsabilidade pelo que faço

 

é muita. Gritem os sábios, protestem

os radares, mas é assim que é a vida:

entregar-se e esperar, como esperam

 

no poema todos os poemas. Não vem

do coração o gesto de abrir o vazio.

É sua entretanto a selva que guardamos

 

a contragosto no umbigo. Aceito este

punhal rompendo-me o estomago, sempre

a se haver comigo. Arranjo-me corno posso,

e escrevo o que sinto. Li que os amigos
faziam isto. Vomitavam primeiro
o veneno, depois a tinta e os suspiros.

 

 

IX. SYGNE

 

Na janela do carro

ela sirgava infernos e pátios de terra.

Riu de si mesma,

mas sonhava ainda

estalar a gargalhada

nalgum beco ou linha da mão.

Teve medo.

Viu que lembraria as noites

em que farta

bebeu tudo que vinha,

e o que ficou

foi

muito mais do que a sede.

Não bastasse a vontade de soprar uma aresta do corpo

e emprestar vida ao fungível —

que soluça e ninguém ouve —,

ha ainda

a dor sem saída,

o pressagio perto do silêncio

(recomendável nas horas em que seria preciso

morrer).

Ninguém sabe direito.

0 que se espera

é que ela não se dê por vencida.

 

 

XXIII. DEEPER

 

Um limite surdo e absorto

em cada aresta do corpo...

E a pergunta: até quando?

A natureza humana talvez sirva

 

pra suportar isto, e seja o poço,

o pântano, o lodo, o nada

que em nos dorme e se agita.

Tudo que sinto é meu e estranho

 

(é disto que gosto tanto).

 

A poesia me pôs dentro da vida.

É esta a força que fica

dentro do mundo

que ergo antes do fim.

 

 

 

Extraído de

 

POESIA SEMPRE.  Ano 12. Número 18. Setembro 2004. Revista trimestral de poesia.  Editor Luciano Trigo.   Rio de Janeiro, RJ: Fundação Biblioteca Nacional, 2004.  Ilus.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

                Fado triste

        Um português dos sete mares disse
        que era preciso
        saber o que era este pungir de andarilho.
        A quem dar este voo
        entre velas, margens, proas?
        Em quem caberia este mar,
        se agora os piratas
        o deixam de navegar?

        Um poeta velho talvez
        dissesse em Lisboa tudo ama.
        Esta gaivota entretanto veio
        ferir-me no que quis da vida.
        O que o céu nos roubou
        de fundo e inteiro
        vai agora neste coração
        por tudo e todos contrafeito.

        Não estenda a mão
        nem erga os braços para amar.
        A alma está presa
        nas conchas, nas algas, no vestido,
        na maresia, na mágoa...
        Embaça-la é perde-la.
        Este barco negro que o vento
        afunda tem por divisa servidão,

 

        A primeira pedra

        Queria não escrever mais nenhum verso,
        que não houvesse mesmo ato algum
        a cometer, além das folhas em que piso
        ou do nada em que amanheço.

        E que depois do depois de depois
        de amanhã se não mais houvesse
        mundo, um homem ainda assim
        amanhecesse esquecendo-se

         de noite e abrindo a porta, o zimbório,
        o fino vão entre as telhas
        fizesse a primeira pedra.
        edificando-a com nunca antes fora

        pedra alguma feita: de vento, de
        puro silêncio, de azeite, com as vozes
        da gente que ficaram num radio,
        com o medo da gente que ficou no peito

        deste sobrevivente. Nós somos assim,
        estamos sempre no meio, e entendam,
        que há nisso qualquer mácula,
        apenas destino, que se pode cortar,

        seguir, bater na velha máquina Remington.
        Quanta cinza, dirá o homem.
        Depois de tudo a vida ainda cintila?
        Inexata, rude, proterva, nascendo

        quando os próprios astros se extinguem.
       

 

 

 

 

Página publicada em agosto de 2009; AMPLIADA em julho de 2018


Voltar para o topo Voltar para  Rio de Janeiro

 

 

 
 
 
Home Poetas de A a Z Indique este site Sobre A. Miranda Contato
counter create hit
Envie mensagem a webmaster@antoniomiranda.com.br sobre este site da Web.
Copyright © 2004 Antonio Miranda
 
Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Home Contato Página de música Click aqui para pesquisar