SIMBOLISMO - POESIA SIMBOLISTA
SATURNINO DE MEIRELES
(1878-1906)
Saturnino Soares de Meireles Filho- Nascido e falecido no Rio de Janeiro. Amigo e discípulo de Cruz e Sousa. Dedicou-se tanto ao poeta negro e paupérrimo, que reservava, para ele, a quarta parte de seus parcos vencimentos de empregado humilde. Ganhava, apenas, duzentos mil réis por mês.
Morto Cruz e Sousa, pagou a edição das "Evocações" e ainda contribuiu para a publicação dos "Faróis". Adquiriu, no Cemitério São Francisco Xavier, o terreno onde se ergue o mausoléu do amigo. E, finalmente, foi um dos fundadores e sustentadores da revista "Rosa-Cruz" (1901-1904), cuja finalidade era cultuar a memória de seu ídolo.
Sem dúvida, o chefe desse grupo, um dos mais importantes do movimento simbolista.
Fonte da biografia: www.clubedapoesia.com.br
TÉDIO
Tudo se acaba aos nossos olhos perto
Numa brancura que de ver nos cansa,
Como se então de névoas um deserto
Se abrisse assim sem luz nem esperança.
E nessa névoa que nos deixa incerto
E num abismo sem sentir nos lança,
Como se o olhar se visse então coberto
Sentimos se apagar nossa lembrança.
Sentimos um torpor indefinido,
Um vago sentimento adormecido
Como da morte as frias mãos felinas.
E nesse triste desalento infindo
De todo o céu sentimos ir fluindo
Neblinas e neblinas e neblinas...
SER HUMILDE
Ser humilde e sentindo-se o primeiro,
Na penumbra ficar dessa grandeza;
Ser feliz e trazer essa tristeza
De sempre andar da vida forasteiro;
Ser humilde e viver no mundo inteiro,
Como um deus sobraçando a natureza;
Ser assim e ter máxima certeza
De ficar para sempre prisioneiro;
É ser da fé a lâmpada impoluta
Que claro marca do destino o norte
Abrindo as portas para nova luta.
É ser de Deus esse perfil sereno,
É andar na vida e já sonhar na morte,
É ser tão grande sendo tão pequeno.
ESTRELAS
Amo-as assim serenamente frias
Nesse vago crepúsculo sonhado,
Lembrando as formosuras fugidias
Que um ouro Dane já tivesse amado.
Amo-as assim tão brancas e erradias,
Como se fossem para o seu noivado,
Cantando então as fundas nostalgias
Que em lírios abrem nosso amor velado.
Estrelas tristes que o silêncio canta
Nas harpas frias desse véu deserto
Que todo em névoas nosso ser quebranta.
Estrelas tristes, pálidas estrelas,
Que eu quisera de mim sentir bem perto
E só na mão poder então contê-las.
TEMPLO OCULTO
Desce enfim a ti mesmo sem receio,
Como quem desce à própria sepultura,
Com esse riso vago de quem veio
Por entre os roseirais da desventura.
Desde sem ver a glória do torneio
Dos que só de ouro trazem a armadura,
Na luz consoladora do teu seio
Encontrarás a luz de outra ventura.
É na paz dessa eterna florescência
Que sentimos de perto a consciência
Como de Deus o misterioso vulto.
É por esse caminho iluminado
Que entramos afinal nesse noivado
Transpondo a porta desse templo oculto.
VIDA OBSCURA
Como um lírio que nasce e que fenece
Por entre as rochas de uma gruta escura,
Tu foste assim do berço à sepultura
Com um sorriso de um anjo que adormece.
Não se ouviu de teus lábios uma prece
Que deixasse do mundo uma censura,
Foste mesmo uma rosa de ternura
Que por entre os espinhos estremece.
Levaste assim contigo o teu segredo,
Como se fosse uma harpa não tocada
Ou uma flor nascida num degredo.
Foste só uma pálida esperança,
Uma saudade nunca desvendada,
Um sonho muito vago de criança.
Extraídos de Astros mortos (1903)
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