RITA MONTEIRO
Rita de Cássia Dutra Monteiro nasceu no Rio de Janeiro a 2 de agosto de 1955, filha de pai carioca e mãe catarinense. Em 1965 mudou-se com a família para Salvador. Depois para Recife, onde ingressou no curso de Arquitetura da UFPE. Paralelamente, lecionou inglês por 3 anos, estudou alemão e dança e iniciou seu trabalho profissional.
Terminado o curso e verificando-se um grande interesse pelo Patrimônio e Memória Cultural do país, passou a trabalhar nas obras de restauração do Convento e Igreja de Santo Antônio em João Pessoa, nas quais até então encontra-se empenhada. A atual fase em João Pessoa tem se caracterizado por uma intensa transformação interior, dentro do relacionamento com o meio físico e social. Os poemas apresentados refletem parcialmente este período, em que não estão ausentes as preocupações de ordem social, mas em que se refletem principalmente as de ordem psicológica, num transbordamento essencial ao ser, no tanto que lhe custa e marca o processo de amadurecimento.
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A PRESENÇA DA POESIA PARAIBANA: Marcos Tavares / Edmilson da Silva / Pedro Jorge Ramalho / Rita Monteiro. "Prêmio de Ficção e Poesia Jurandy Moura". João Pessoa: Secr. de Ed. e Cultura, 1981. 84 p. 14 x 21 cm.
Capa e ilustrações: Tônio -
Coletânea de textos premiados no concurso de ficção e poesia “JURANDDDDDY MOURA”, promovido pela Secretaria de Educação e Cultura do Estado, através de su- a Diretoria Geral de Cultura.
Tecido II
Longa é a solidão da noite
que me devasta o corpo a mente o sonho
numa beleza rude e melancólica
Longa a agulha que me cose a carne
que aberta ontem hoje arde
cor de delírio ave que debate
Longa ausência a percorrer o ente
e a saariana sede que ele sente
açoita a tempestades ventos já sem mar
Longo tempo a se perder em fuga
e tua face tão nova, tão rugas
repousa em meu peito, entre seios, a me acalentar.
Tecido IV
Longo, contínuo ser a «e esvair na noite
de solidões que esbarram em linhas de horizonte
de almas que se deixam abandonar
Foge, ténue linha que nos envolve os corpos
a mesma que balança nestes tortos
medos, sonhos do ar
Luzes, dançam ao redor desperdiçadas
crescem em cores e sons — madrugada
que finda a nos acalentar
Tu, que dormes neste perto tão distante
revoada de pássaros errantes
és suave voo — doce pousar
Tecido VII
O amanhecer é minha nau
velas de sonho plenas,
murmúrios — no vento poemas
pérolas, conchas,
espumas derramadas
do mar, segredo apenas.
Neste meu mar, um lenço branco,
lanço-me a ti sem retorno
viajo-te neste roteiro morno
inflo com ânsia meus panos
na brisa, malha de enganos
que ao raiar tece o sono.
Breve, meu sol se espanta
e seu calor se molha em violentas ondas
louca alma a espalhar forças tontas
correntes, que represadas rompem,
alucino-me aos teus rochedos no ontem
faço-me em partes sem conta.
Morto de fúrias, livre de longas cadeias,
faz em mansas praias seu altar,
lança-me em desesperança meu mar
e assim me deixa, como um pássaro da areia,
entre as sobras dos meus próprios desencontros,
no abandono em que o sol vem se deitar.
Tecido XIII
A colcha que teço
numa enorme chama de criar
nasce de ti — fio tênue
com as cores que ferem meu caminhar
O manto este, com que me cubro
embora curto é já quente
nasce de dentro — premente
manifesto do ente com o mundo
As mãos que nele trabalham
cheias de tanta energia
sejam alegres ou tristes
fazem dos calos guarida
Por isto percorrem e percorrem
longas tramas trançadas no ar
e sabendo quanto as solidões corroem
perdem-se a buscar no fio um comprimento que não há.
Página publicada em agosto de 2019
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