PLÍNIO GUILHERME FILHO
GUILHERME FILHO, Plínio. Leções di vididas. Rio de Janeiro: 1978. 68 + 10 p. 16x22,5 cm. Poemas textuais e poema-processo. Capa: Dounê. “Orelha” por Joaquim Branco. Col. A.M. (EA)
SURFE
Como remador, escalo vésperas,
e costeio as ondas
por trás de tua arrebentação,
que de manso corcoveia,
constata e prenuncia,
enquanto, marenauta louco,
me equilibro
e, na prancha reta,
desvio, estico, galeio, prolongo
sob tal ímpeto que cresce,
contorce, cava, gira, debrua, espuma, consome,
e costura
um tubo aquático por onde deslizo
agoraora
e saio manso, ereto, suave,
sob gosto de caranguejos, cavalos-marinhos e cisnes,
do prenúncio de borrasca que amarelece a aurora,
não prevalecesse uma clara manhã
como por dentre o pássaro da tela de Magritte
30/07/77
INFÂNCIA
Morta, sem mais-o-quê,
no quintal, lagartixa:
as patas suspensas,
em sua sóbria dignidade.
Pela pedra partida
ao meio, salamandra:
pela cauda se refaz: infância,
em sua sóbria eternidade.
Tão vital a ela,
infância, lagarto:
assim morta, sem saber porquê:
o caco, a pontaria, a criança viva,
em sua sóbria felicidade.
Feita de chances a vida,
mais as tem quanto as tira,
e assim compensado, iguano:
futuro, em sua sóbria insanidade.
Insanos, quantos, tantos, todos,
na matança prática, catártica, crocodilo:
profilaxia da doença adulta,
em sua sóbria agressividade.
Farta a morte à distância,
feliz povoa a infância, réptil:
dá bom adulto, cidadão sem medo,
em sua. sóbria civilidade.
Vida — moderna, psicanalítica,
morna juventude agredindo —
até quando, em seu pesadelo, dinossauro:
terrível se avulta, apesar de morto
em sua sóbria
débil
infância.
Página publicada em setembro de 2012
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