PAULO SILVA ARAUJO
Paulo Silva Araújo, poeta simbolista, médico, farmacêutico e cientista, nasceu em Niterói (RJ) em 25/7/1883 e faleceu no Rio de Janeiro em 22/10/1918. Foi membro da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro e patrono, na Academia Fluminense de Letras, da cadeira nº 31. Depois que se tornou espiritista, na última década de sua existência, ele proclamava com desassombro suas novas convicções. O soneto acima faz parte do livro Antologia dos Imortais, obra psicografada pelos médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira.
SOMBRA E LUZ
Surde a aurora sublime – angélica pintura...
Em breve, murcha a luz qual bela flor sem vaso...
Débil raio de sol passeia pelo ocaso,
E cai, bruxuleante... E morre em fímbria escura...
Vai o vento brejeiro, ao calor que o tortura,
A brincar de espremer mil cachos, ao acaso,
De nuvens colossais do firmamento raso...
Vem a chuva que esparze o olor da terra pura...
Nosso espírito, assim como o dia triunfante,
É vida e resplendor em trânsitos nervosos,
Insaciáveis quanto o fogo crepitante...
Alma! Doma o querer! Vence o passo erradio!
Falena – subirás em voos prodigiosos,
Nume estelar transpondo o báratro sombrio!
SONETOS. v.2.Jaboatão dos Guararapes, PE: Editora Guararapes EGM, s.d. 151 - 310 p. 16,5 x 11 cm. ilus. col. Editor: Edson Guedes de Moraes. Inclui 171 sonetos de uma centena de poetas brasileiros e portugueses. Ex. bibl. Antonio Miranda
A UMA CRIANÇA MORTA
Os mistérios do Além evocaram-te o Ser
A essa longa e fatal viagem, sem retorno...
Quantos enganos novos vis, ansioso, ver,
Nas planícies sem fim, das paisagens em torno...
As graças a espargir da tua mocidade,
Revestindo de luz todos os arredores.
Deixas da vida o tédio, envolvido em saudade.
Da morte ao perceber as atrações e flores...
Vais, risonho, a seguir, coroados de rosas,
O cortejo gentil, castíssimo, celeste,
Dessas viagens sem cor, brancas, tuberculosas...
Nossa Senhora amada te proteja os passos
E os carinhos de mãe te dê, que não tiveste,
Estreitando-te muito entre os divinos braços...
ABBEVILLE
Fica Abbeville a meio do caminho.
Modesta aldeia, entre Paris e o mar...
Puxa o arado um cavalo e, de mansinho,
Que belos os bois nos campos a pastar...
Margaridas silvestres, brancas, suaves...
Aves a andar, simples, rurais, graciosas...
As aldeiãzinhas andam como as aves,
Margaridas de lábios cor de rosas...
Em Abbeville o trem pouco demora...
Quantos sonhos me dás, vila pequena
Que da janela o meu olhar namora...
Lavro, feliz... Sou camponês... casado
Rico de amor de uma aldeã serena
Que, enlevada, me vê guiando um arado...
SÓ
No regaço da noite, ermo e conciso,
Reina o silêncio que é dos cemitérios;
A paz vem perturbar desses mistérios,
Ao longe, o eco de um perdido riso...
Neste pequeno e ignoto paraíso,
Neste quarto, em que zombo dos impérios,
Virgem de angústias e de vitupérios,
Passa-me a vida como num sorriso...
Aqui, não temo os males e os egoísmos
E deste ideal a amada fantasia,
Floresce-me no peito, longe dos abismos...
Neste retiro do meu claustro pobre,
Imerso do meu Sonho na poesia,
É que eu compreendo o Só de Antonio Nobre.
Página publicada em novembro de 2019
Poesia espírita
Página publicada em novembro de 2019
|