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OMAR SALOMÃO
Sim, o carioca Omar Salomão é filho do poeta baiano Waly Salomão, mas ele é mais do que isso. Também poeta, letrista, escritor, cantor e, agora, artista plástico, o garoto de 28 anos /em 2011/ inaugura, nesta quinta-feira, na Galeria Mercedes Viegas, no Rio, a exposição “Turbulências são apenas nuvens no caminho” /glamurama.uol.com.br/
Extraído de
POESIA SEMPRE. Revista da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Número 26 - Ano 14 – 2017 - Editor Marco Lucchesi Ex. bib. Antonio Miranda
Boneca de pano
Como posso te encontrar?
Se eu perdido na cidade
Não encontro minha namorada
Se teme o sol e não pode com o mar
Como posso te contar as coisas belas
Que eu vi passar?
Se o vento bagunça ingénuo seus cachos
E seus olhos cansados se perdem no ar
Como posso te mostrar as pequenas coisas
As besteiras que me alegram o olhar?
Como posso te encontrar
Se onde quero estar é onde você nunca está?
A delicadeza, ah, a delicadeza...
Me diz,
Quando vou te achar?
Te olhar dormir E depois sumir
Como se nunca houvesse estado lá
São tantas coisas pra dizer
Boneca de porcelana
Não tema, é apenas o barulho do mar
Boneca de porcelana, onde você está?
Eu preciso lhe falar
Foi além. Penetrou seu íntimo e viu-se, sem
saída. Sem poder penetrá-la mais, por não
mais suportar seu peso, sua realidade. E sem
poder voltar, por haver se apaixonado pelo
seu íntimo. A vontade de sentir-se vivo e pu
lar. Pular no abismo como um trapezista que
se perpetua para sempre no ar. Pular como
se o ar fosse um labirinto e as nuvens ilusão.
Sem saber o que há abaixo. Sem se importar.
Mas e daí? E quando nada mais fizer senti
do? E quando tudo deixar de ser? E depois?
E depois? 0 que vem depois? E sem saber,
cortou a tela. Só pra ver, só pra testar, só pra
sentir. E saber, que não há mais volta, porque
o caminho é denso demais, porque as orelhas
garantem o equilíbrio. E tudo se retorce, aos
pedaços. Indefinido. Como um sonho que
muda sem razão. Indefinido. Como o vazio.
Nada mais faz sentido como antes, mas tudo
é tão claro, tudo é tão mais claro agora.
Ela apareceu pela primeira vez para mim num sonho. Um sonho simples, desses sem grandes novidades. O sol nublado emitia uma luz esbranquiçada, típica dos dias tristes. Era um dia triste. Triste e abafado. Me lembro bem da manteiga derretendo sobre a mesa. o suor escorria lento por entre as rugas da testa. 0 jornal não veio nesse dia. Nas ruas as pessoas penavam curvas, contando as horas, os segundos e algo mais. 0 mundo girava devagar. Já não se falava. Os pássaros não voavam. Faziam fila empoleirados nos postes e nas sacadas. Cansado, não suportando o peso do mundo sobre as costas, sentei-me por alguns instantes. Foi assim que ela surgiu. Esvoaçante, vinda não sei de onde. E o mundo finalmente parou. As horas pararam. Até o vento cessou e a chuva que ameaçava cair. não chegou. Foi tudo lindo e misterioso. Me lembro bem. era uma quarta-feira, foram só alguns segundos, mas foi tudo tão bonito que digo ter sido um sonho.
Página publicada em junho de 2019
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