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FESTAS DE NATAL

(Folclore)

Organização de:

MORAES FILHO, Mello.  Festas no Natal.  Rio de Janeiro: Livraria Contemporanea, 1895.  151 p.  (Costumes e tradições do Brazil)   11,5x19 cm   Ex. Bibioteca Nacional de Brasília, doação Aricy Curvello. 

 

POESIA BARDICA

REISADO

 

Reisado do Zé do Valle

Minha mãi assuba,
Fale como gente;
Assuba a pacio,
Falle ao presidente.
Peque no caboclo,
Dê-lhe com bordaão;
Qu´elle foi a causa
Da minha prisão.
A minha prisão
Foi ao meio-dia,
Nas casas estranhas
Com grande agonia.
O´ senhor meu pai,
Capitão-tenente,
Cada pé de canna
Era um pé de gente.
Morto de fome,
Morto de sêde,
Só me sustentava
Em caninha verde.
—“Dona, pro aqui?
Grande novidade...
“Vim soltar um preso
Cá n´esta cidade...
Senhor presidente,
Se dinheiro vale,
Trago aqui dez contos
Solte o Zé do Valle
—“ Dona, va-se embora,
Qu´eu não solto não,
Que seu filho é máu,
Tem ruim coração,
Matou muita gente
L[a n´esse sertão:
Da minha justiça
Não faz conta, não.
“Tenho meu lacaio
De minha estimação,
P´ra seu presidente
Não tem preço, não.
Senhor presidente,
Peço incontinente,
Solte o Zé do Valle,
Pelo Sacramento!
— Senhor presidente,
Não abra a porta, não/
Se eu sahir na rua,
Minha mãi, va-se embora,
Deixe de cegueira,
Qu´eu hei de ser solto
No Rio de Janeiro.
Quem tiver seu filho
Dá-lhe ensinaçao,
P´ra nunca passar
Dor de coração,
Quem tiver seu filho
Dê-lhe todo o dia,
Ao depois não passe
Dores de agonia.
Adeus, minha mãisinha,
Mãi do coração;
Dê lembrança à Anninha
E a mano João;
Mana, va-se embora,
Guarde o seu dinheiro,
Qu´eu vou me soltar
No Rio de Janeiro.

Falo exalação... (1)

 

  1. Desordem com resistencia, femimento.

 

 

Baile da Lavadeira

SAHE A 1ª LAADEIRA (cantando)

Antes que o sol saia,
Hei de madrugar
Nas margens de rio,
Onde vou lavar.

Passarei contente,
Muito divertida,
Com as mais companheiras
Da mesma lida.

Aqui ficarei
Bem acomodada,
Livre do calor,
E da enxurrada.

Neste cantinho
Ficarei contente,
dando lugar
Se vier mais gente.

SAHE A 2ª. LAVADEIRA  (cantando)

Eu vou caminhando,
Que o sol está alto,
Eu não sei se corro,
Eu não sei se salto;

Porém já vejo
Outra companheira,
É Damiana,
Que veio primeira.

FALLA A 2ª. LAVADEIRA PARA A 1ª.

Deus vos salve, maninha,
Aqui sejaes bem chegada,
De perigos e de sustos
De tudo sejaes guardada.

FALLA A 1ª. PASTORA.

Na verdade, Damiana,
Que muito tarde acordei,
E como vim na carreira,
Muito cançada cheguei.

FALLA A 1ª. PASTORA

De que pois estão corrias?
Viste acaso alguma féra,
Ou algum lobo faminto,
Ou viste tremer a terra?

FALLA A 2ª. PASTORA

Tenho andado sosinha,
Por bosques, penhas e vales;
Entre animais ferozes,
Mas sempre livre de males.

E assim, oho Damiana,
Dou graças ao Creador,
Pela mercê que me fez
De me dar tanto valor.

Cantam as duas Lavadeiras, seguindo para uma
horta a estenderem roupa.

Pastorinhas, grande dicta
Hoje todo mundo alcança,
baixou já dos Céos a terra,
Fructo da nossa esperança.


CANTA BENTA, passeiando na horta.

Grande pensão, grande lida,
Eu tenho na horta bela,
De regal-a, de cuidal-a.
Que não dê o bicho nella.

VOLTA

Quem quer comprar
Verduras mimosas,
Enquanto estão
Mui cobiçosas?

BENTA para as lavadeiras:

Grande confiança é a vossa,
De estenderem roupa nesta horta.
          (Joga com a roupa.)

CANTA BENTA

Quem quer comprar, etc.

SAHE A 4ª PASTORA, CANTANDO:

Ando procurando
Se alguém me viu
O meu carneirinho,
Que me fugiu.

Por mais que eu procure
Por todo caminho,
Não posso encontrar
O meu carneirinho.

Do meu carneirinho
Stulto, fugiu,
Não sei como o lobo
O não engoliu.

ADVERTENCIA

(Entra na horta de Benta, apanha o carneiro,
 e canta
)

Lá está na horta
De dona hortaleira:
Como está cançado
Da grande carreira?

BENTA PARA A 4ª PASTORA

Pastorinha, como entraste
Aqui, sem minha licença?
Olha que esta ousadia
Já me causa grande ofensa.

4ª. PASTORA

Ouve-me fallar primeiro.

BENTA

Desculpas não tens que dar,
Hide-vos deste logar.

4ª PASTORA

Benta, cá comigo,
Falle com modo atento,
Pois eu não hei de sofrer
De qualquer, atrevimento.

BENTA

Atrevimento, Filena!
Ignoro este tratar;
Não queiras pois deste modo
A minha fúria irritar.

4ª. PASTORA

Ora daime o carneirinho,
Não é vosso, pois é meu.

BENTA

Também tenho parte n´elle
Pelas hervas que comeu.

4ª PASTORA
Como isto pôde ser,
Agora me rio eu...

BENTA

Ora isto não se atura,
Eu estalo de paixão.

4ª PASTORA

Assim é, bela menina,
Pelo que diz tem razão;
Ora dai-me o carneirinho,
E basta de mangação.

BENTA

Levai pois o carneirinho,
Já d´elle me não importa;
Só quero saber por onde
Vós entraste nesta horta.

4ª PASTORA

Na carreira em que ele vinha
Saltando montes e vales,
Perdi de todo a razão
Precipitei-me nos males.

Saltei logo a vossa cerca,
Sem mais pequena detença,
Por não perdel-o de vista
Não vos fui pedir licença.

CANTA BENTA

Levai o carneiro,
Já creio ser vosso:
Ficar-me com ele
Conheço não posso.

CANTA A 4ª PASTORA, retirando-se:
Ficai embora,
Pastorinha bella,
As nymphas vos teçam
Mimosa capella.

O PESCADOR PARA AS LAVADEIRAS

Eu também vouté o rio
O meu côfinho buscar,
Para da minha pescaria
Algum peixinho ofertar. — (Vai-se).

SAHEN AS LAVADEIRAS, cantando.

O côfo do peixe
Que nós achemos
Na beira do rio
Tambem levemos.

Já que a fortuna
Nos entregou,
O dono esquecido
O não levou.

SAHE O PESCADOR, cantando.

Grande peça me fizeram,
Grande logro me pregaram;
Toda a minha pescaria,
Todo o meu peixe levaram.

AS DUAS LAVADEIRAS

Vamos às nossas cabanas
Nossos peixinhos tratar,
Que quem chupou o quitute
Sem peixe venha a ficar.

Ainda que venha o dono
Há de levar por um oculo.

CHEGA O PESCADOR AS LAVADEIRAS e diz:

Eu me vou chegando `a ellas
Antes que venha mais gente;
Hei de tomar o meu côfo
A forma de unhas e dentes.

Senhoras, dê-me o meu côfo
Que a mim é que pertence;
Sou obrigado á leval-o,
Disto me não dispense.

Senhoras, dê-me o me côfo,
Não quero graças agora,
Pois eu estou de jornada
E me quer ir embora.

          (Começa elle a puchal-as)

AS LAVADEIRAS

Você é que quer o côfo?
Há de levar uma bóta;
Não puxe assim pela outra,
Vá puxar sua avó-torta.

ADVERTENCIA

Pois que é isto, meu pastor,
Que contenda é esta agora;
Sabe isto como se faz?
Tome já, vamos embora.

AS DUAS LAVADEIRAS PARA A 4ª PASTORA

Todavia, pastorinha,
Olhe como é chibante,
Entregue o que nos tomou.
Aqui já no mesmo instante.

O PESCADOR PARA AS DUAS LAVADEIRAS

O que foi que eu lhe furtei?
Um caboré de guisado!
Eu furtei porque estava
Já de fome arrenegado.

FALLA A 4ª. PASTORA PARA O PESCADOR

Foi muito bem acertada
Esta peça que vos fez;
É para vó não cahirdes
N´outro lôgro outra vez.

PESCADOR

E demais, bellas meninas,
Não sabem que sucedeu?
Que hoje por nossa ventura
Jesus em Belem nasceu?

TODAS

Promptas ´stamos, mui contentes,
Pois é nosso desejo
Que por tão alto convite
As vossa plantas eu beijo.

CANTA O PESCADOR

Grande prazer
Temos na verdade;
Nasceu Deus menino
Por summa bondade.

          Repetem todos o mesmo.


CANTAM AS DUAS LAVADEIRAS

Aceitai, Jesus Menino,
Nosso coração sincero;
Aceiti, pois dentro nelle
Firmemente vos venero.

          Grade prazer, et.

CANTA O PESCADOR

Este lindo robalinho
Que vós me destes na linha,
Aceitair, não desprezeis
A humilde offerta minha.

          Grande prazer, etc.


Página publicada em abril de 2015





 

 







 

 

 
 
 
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