MARIA ISABEL
MARIA ISABEL FERREIRA nasceu no Rio de Janeiro e o seu primeiro livro, publicado em 1942, foi acolhido com públicos louvores por Manuel Bandeira e Cecília Meireles.
Foi funcionária do Estado em sua cidade natal e sempre viveu afastada dos meios literários.
CAMPOS, Milton de Godoy. Antologia poética da Geração 45.
São Paulo: Clube de Poesia, 1966. 207 p. 16 x 23 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
CANÇÃO DA NOIVA
Mal de mim, não sou sozinha.
Jamais sozinha serei.
Tenho um povo de fantasmas
Morando nos meus recessos,
Habitando nos meus dias,
Comendo a minha tristeza,
Bebendo a minha alegria.
Como vieram sem nome,
Dei-lhes os nomes que achei,
Mundo, amor, loucura, fome...
Nomes colhidos nos ares,
Nomes erguidos da poesia.
(Se achares melhores nomes,
Como te agradecerei!)
Não sou sozinha, não sou,
Jamais sozinha serei.
Eles viriam comigo,
Os meus ciganos sem lei.
Roubar-te-iam meus beijos,
Desatariam em teu corpo
O laço do meu abraço.
Eles viriam comigo.
Para longes horizontes,
Carregariam sem pena
O ouro do meu olhar.
Não sou sozinha, não sou.
Eu mesma, jamais serei.
SAUDAÇÃO
Agora, que cheguei ao país das insondáveis fronteiras,
Poderei falar, poderei dizer as minhas deslumbradas palavras.
(Túmidas, enormes de esperança,
Como pesam as palavras que transporto!)
Terra alta e nobre, a ti
Nenhum espanto causará o meu discurso.
Contigo poderei falar do inexorável companheiro,
Do incessantemente meu,
Do sem rosto, cujo rosto lucila na minha sombra,
Do sem nome, cujo nome — vê — está cravado em meu lábio.
Sabes que devo falar da sua presença.
Nada precisarei contar, além da sua presença.
E o teu povo possui agudos ouvidos inclinados.
Que amplo perfume de liberdade
Rola no vento nascido de tuas plagas!
És a mais livre das terras.
Eu, peregrina, te saúdo.
Beijo teu solo, Poesia.
ABRUPTO AMOR
Abrupto amor, sobre mim desabado, como pedra do céu.
Mas minhas mãos — frágeis mãos — o sustiveram.
Logo quedou petrificado, longo e leve como um lírio.
E eu o cerro nos braços e nele adormeço meus olhos
[deslumbrados.
É para o mundo este amor e eu deverei levá-lo.
Ajudai-me, Senhor, e eu saberei levá-lo.
Ruas, eu vos percorrerei. Portas, eu vos transporei.
Faces, tereis a carícia das minhas mãos tornadas
[lúcidas e belas.
É para o mundo este amor e eu deverei levá-lo.
Porque Vossa estreia arde magnífica no meu abraço.
Página publicada em agosto de 2020
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