MARCELO DINIZ
Marcelo Diniz Martins, nascido em Niterói em 1967. Marcelo é doutor em Ciências da Literatura - Semiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor, poeta e compositor.
Extraído de
POESIA SEMPRE. Revista semestral de poesia. Ano 10. Número 17. Dezembro 2002. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional do Livro, 2002. 260 p. ilus. col. Editor geral Marco Lucchesi. ISSN 0104-0626 Ex. bibl. Antonio Miranda
Ócio
O sono não aguarda pautas
e, no espelho, um canto de quarto,
uns retratos que ninguém olha.
O sol novamente se arrasta,
confere o cálculo e se afasta
sem deixar vestígio de glória.
As palavras todas na página
e aquele mesmo armário aberto,
aquele mesmo espelho absorto.
Se a luz traduzisse em segredo
a distensão dos semitons,
cada nuança de sua incidência
oblíqua e filtrada, a modorra
teria o dorso de uma fêmea.
Agulhas
Não precipitemos as
coisas: essa vertigem
que parece insuflar
fôlego, palpitação
ao inanimado ainda
é muda, saibamos
perceber esse estado.
Não devotemos ainda
às pedras ou a qualquer
outro ente que nesse
perímetro nos afete
o discurso esperado
do cosmos, não estimemos
apelos dos astros no que
ainda é simples vibração
inaudita e presente
nesse íntimo espanto.
Sintamos apenas — não
denominemos o amor —
na língua as agulhas
do instante translúcido,
o conteúdo evanescente
após estourada a fina
esfera de toda metáfora.
Página publicada em agosto de 2018
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