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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

LUIZ OLAVO FONTES

 

Luiz Olavo Fontes é conhecido por sua atuação no período da nossa poesia marginal e da Nuvem Cigana, aparecendo em antologias que lançaram aquela moçada anárquica mas, a seu modo, contestadora da ditadura militar. Autor de uma obra considerável, vale mencionar o seu "Livro do príncipe" em que esbanja criatividade e uma erudição enviesada... Inventa  textos e declarações bem engendradas para  figuras da cultura universal como Lao Tsé, Santo Agostinho, Julio Cortazar, General Mac Arthur, Rousseau, Proudhon,  Jorge Luis Borges e até Marilyn Monroe, seja parodiando seja parafraseando, para dar sustentação a um príncipe que vai do sério ao grotesco, do verossímel ao absurdo, do apócrifo ao suposto... Divertido, cruel, vai da farsa ao paroxismo,  Vale a pena conferir. É divertido, é instigante, e até pedagógico... Dá receitas extravagantes e despistadoras,  cria aforismos desconcertantes....  sem evitar o besteirol.   Quem quiser, que leve a sério.   A. M. 

Luis Olavo Fontes

De
Luis Olavo Fontes
LIVRO DO PRÍNCIPE
Espantosos escritos de um príncipe no exílio

Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007
104 p.  ISBN 978-85-86579-95-0

 

INFÂNCIA DO PRÍNCIPE

Sonhava construir um caminho de ferro
Em território índio

E viajar de paquete
                   pelas Ìndias

 

DECLARAÇÃO DO PRÍNCIPE

A religião é o ópio do povo.
Eu, como não sou religioso, tomo ópio mesmo.

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O absoluto está
absolutamente
obsoleto.

 

DA SÉRIE: SOFISMAS INSOFISMÁVEIS

Todo gago escreve melhor do que fala.

 

SUSPIRO DO PRÍNCIPE

O pior dos suspiros é o último.

 

INDAGAÇÃO DO PRÍNCIPE
 
O que era mesmo aquilo
que nós mais queríamos?

 

 

Extraído de

 

HOLLANDA, Heloisa Buarque de, seleção e introdução. 
26 POETAS HOJE. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976.  206 p.  ilus.   18 cm. (Coleção de Bolsos Labor, 1) 

Inclui os poetas: Adauto, Afonso Henriques Neto, Ana Cristina César, Antonio Carlos de Brito, Antonio Carlos Sechin, Bernardo Vilhena, Carlos Saldanha, Chacal, Charles, Eudoro Augusto, Flávio Aguiar, Francisco Alvim, Geraldo Eduardo Carneiro, Isabel Câmara, João Carlos Pádua, Leila Miccolis,s Leonardo Fróes, Luiz Olavo Fontes, Ricardo G. Ramos, Roberto Piva, Torquato Neto, Vera Pedrosa, Waly Sailormoon, Zulmira Ribeiro.

 

 

                Relicário 74

               ah vida ingrata+
         chovem gatos sapatos lagos
         há dias
         impedem minha ida à praia
         remate de males
         o verão desaba lerdo
         dezembro natal frio como teus lábios
         foi-se a namorada
         fugiu com um polonês de butique
         pra Petrópolis
         é vislumbrar a felicidade e
         levar a porrada
         longo caminha da testa à terra|
         semana passada atolei no inferno
         solidão me esganou
         sem mais cartilagem todo morto
         telefono para mamãe combinamos
         esquiar na Europa até março
         ir a muitas boates
         esquecer-te pelo menos lá tenho
         Dominique Sanda que me ama

 

         Cegueira

        tenho vontade de ver
         as coisas como realmente são
         mas só consigo ver
         através de meus olhos

 

         Sol

        ouvindo
         o movimento dos barcos
         ondas surdas
         garrafas tarrafas
         explodindo
         à margem

         nasce

 

         Valor

        a vinda
         valeu a pena

         noite janta
         a carne viva
         dia abre
         a boca do tigre

         ao lado da cama
         gente que joga
         e amansa
         antes de conhecer a dança

         a vinda valeu
         a pena

 

         Retrato

         à noite chapadões sombreados
         ponteiam o esqueleto das margens
         o vapor resfolegante expelindo
         vagalumes carbonizados
         quantas estrelas tanta água
         penso no meu amor lendo Drummond
         com lentes de contato
         nervosa e linda sublinhando adjetivos
         treva ambulante
         a paisagem se descasca
         as mesmas estrelas
         as águas que passam
         meu radar está quebrado
         esqueci a mentira
         aclarou-se o mormaço
         a noite veste cabelos louros
         recém-cortados

 

         Meu amor de soslaio

        Faz tanto calor no Rio de Janeiro
        que é bom sentir essa neve
        partir de seu olhar

 

        Sequências

                nos encontramos no elevador
         depois nos beijamos
         descobrimos então que não nos conhecíamos
         que éramos do mesmo sexo que
         não podíamos nos beijar na boca
         não dormi nada essa noite
         é dia tenho um almoço curto
         demais o verão com seu suvaco peludo
         cheirando a ovo
         um mistério..

        

         Lúcifer

         um dia todos os peixes
         puseram a cabeça para fora da lagoa
         e me olharam

 

         Desconstrução

                nas paredes da casa resistem
         fotofrangalhos de tempo

         a memória se estafa no living
         o futuro espera no hall
         as janelas todas cerradas
         encobrindo as vozes do sol

         à procura de um silêncio escuto
         enquanto meu olhar foge
                  pela porta dos fundos                       

 

         Criação

                penso antes do grito
         um abraço de locomotivas
                                      o trem
         chacoalhando os líquidos
         e os óvulos e ovos e
         outras químicas

         primeiro era só submersão
         e uma fome submarina

         um dia o espaço  faltou
         e a bolsa estourou
         a vida

 

         Fug 42

        Tude a paranoia os assaxinatos têm me persg
         Timamente não sei razão não devo deixar pis
         Ercito principalmente a insegurança a total fal
         Tias principalmente mínimis no mais nu sem sol
         Emos partir viver no exilis

 

         Poema d´alba

        virou dia
         e o grilo
         virou passarinho
         tentou dormir
         pra não ficar sozinho

 

         Últimos sons da tarde

        o bairro que vejo em frente é silvestre
         a blusa que ele veste organza
         os sinos que oiço são de cosme velho
         nas axilas do corcovado seu cheiro sexy
         a tarde estremece mostrando feridas

         desbravaram a mata me tomaram ela
         só as andorinhas se equilibram
         o sol escapuliu de fininho
         trovões batem bastões de entrada
         nostálgica a noite assovia
         e cumprimenta os ausentes

 

         Propriedade privada
       
        não tenho nada comigo
         só o medo
         e medo não é coisa que se diga
  

 

 

Página publicada em julho de 2010; ampliada e republicada em junho de 2018.

 

 

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