LEONARDO  GANDOLFI 
                        
                      Leonardo Gandolfi nasceu no Rio de Janeiro,  em fevereiro de 1981. É professor de Literatura Portuguesa na Faculdade de  Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Obra poética: No entanto  d´água (7 Letras, 2006) e 8 Poemas (2006). 
                        
                      Blog do autor: http://www.germinaliteratura.com.br/leonardo_gandolfi.htm  
                     
                      
                      POEMA  
                      extraído de 
                      NO  ENTANTO D´ÁGUA 
                      Rio de Janeiro: 7  Letras, 2006 
                      (Coleção  Guizos) 
                        
                        
                      – Quem são estes? 
                        
                      Da tartaruga retirar a tartaruga, 
                      deixá-la ser apenas a não tartaruga. 
                      Chove. As gotas molhariam seu atraso. 
                      Eis o primeiro ciclo, o da falta. 
                      A chuva insiste, toca as telhas de amianto. 
                      A casa está fechada e quem está lá dentro 
                      é a continuação da chuva e do amianto. 
                      Esse o segundo ciclo, o do gesto. 
                      Junto da casa, um quintal. Ainda não. 
                      Quem sabe quando a chuva parar de insistir 
                      eu compreenda as regras da perspectiva. 
                      O que se retirara retorna. Silêncio. 
                      À tartaruga chega-se por paciência. 
                      Terceiro ciclo, o das coisas repetidas. 
                        
                        
                      O coração subentendido do elefante 
                      desce por uma linha que vai dar ao lado 
                      do que se repetiu sem ter sequer e ainda 
                      acontecido uma só vez. Analogia. 
                      Junto do verso acima, novamente a casa. 
                      No quintal dois cachorros latem sem parar; 
                      um deles nada sabe acerca do elefante  
                      e de seu coração localizado às pressas. 
                      Entro na casa até que a casa deixe o texto.  
                      O elefante é do lado de fora. Por isso 
                      o quintal, os cachorros, os ciclos, a  linha. 
                      Interrompem-se então tamanho e referência.  
                      Talvez viesse pelas águas. Improvável. 
                      Sobre a copa das árvores a ventania. 
                        
                        
                      A casa está vazia não por mera ausência, 
                      mas para o aprendizado da subtração. 
                      E a chuva, porque cai desde o terceiro  verso, 
                      além de chuva é extensão desse elefante. 
                      A casa está vazia para que se saiba 
                      do desapego que há em insistir no mesmo. 
                      Mesa e pausa. A chuva caindo talvez 
                      e apenas como efeito de profundidade. 
                      Depois um dos cachorros. Não, acho que só 
                      seu deslocar-se repetido até a porta. 
                      A metodologia seguida do gesto. 
                      Alguns pássaros seguem para o noroeste. 
                      Tudo começa no elefante. Lentamente 
                      a bala dentro do tambor, as leis da física. 
                        
                        
                      Os pássaros aos poucos pousam no que sobra; 
                      o pouso repetindo-se até haver árvores. 
                      Espécie de equilíbrio natural nos ciclos 
                      que haja ainda e a partir de agora apenas  árvores. 
                      E por haver apenas árvores, chego ao 
                      cuidado que se ganha em se perder tais  pássaros. 
                      Assim, em cada projeção, seu negativo; 
                      no que algo se levanta, algo também cai. 
                      Compensação e equivalência. Revoada. 
                      Os pássaros e as árvores segundo os peixes 
                      que ausentes marianne moore quis próximos  ao jade. 
                      Em outro lugar deixo um jornal sobre a  mesa. 
                      As coisas são somente por faltarem todas. 
                      Substituição e excesso. Continua. 
                        
                        
                      Imitação do esquecimento o fato 
                      de a primeira pessoa não ter posto 
                      jornal algum na mesa. Mas espera. 
                      Olha como retorna a tartaruga. 
                      De seus ciclos inúmeros e três, 
                      a segunda pessoa esta terceira. 
                      Alguém, não sei, talvez um homem que 
                      chegasse em casa com o tal jornal. 
                      Me pergunto se já não o conheço. 
                      Ele se olha no espelho e vê o pai, 
                      depois pensa na chuva e na mulher. 
                      Entre os dias então escolhe um dia 
                      – anulação do dia anterior. 
                      Quem sai, sai de onde quando entra na casa? 
                        
                        
                      Ao elefante nada disso importa; 
                      seu coração inchado ainda desce 
                      ao vir por uma linha que vai dar 
                      ao lado das palavras de quem chega. 
                      E toca o chão. E quando o toca está 
                      tocando notas menos simultâneas  
                      que repetidas. Por exemplo, pássaros, 
                      jornal, cachorros, telhas de amianto, 
                      árvores, mesa, peixes e quem sabe 
                      até todo o catálogo das naus.  
                      Depois, lembro, alguém se olha no espelho. 
                      Ainda não. A paciência insiste. 
                      Sete anos de pastor jacob servia. 
                      Introdução. O tempo do elefante. 
                        
                        
                      Pausa e peixes. Mover-se em relação 
                      ao que se move permanece imóvel. 
                      Muda o registro, árvores mais pássaros 
                      igual talvez a casa menos chuva. 
                      Muda outra vez: a mesma marianne moore  
                      – que traduziu até algumas fábulas 
                      de la fontaine –  ao ler o verso abaixo:  
                      where there is personal liking we go. 
                      Sim, hoje marianne, amanhã jacob 
                      e assim seguindo, sob a mesma chuva, 
                      de nome em nome até tocar o chão, 
                      i.e., até que cicatriz alguma 
                      possa impedir que homônimos raquel, 
                      lia e filhos estejam entre os seus. 
                        
                        
                      Da tartaruga retirar o não 
                      que antecedia a coisa repetida. 
                      Não para confirmá-la, já que é de 
                      confirmação que a tartaruga inteira é  feita. 
                      Mas para contrapô-la ao elefante 
                      e a seu ainda inchado coração. 
                      Por isso que o que fica no lugar 
                      do gesto é seu reverso e também extensão. 
                      Colocar sobre a mesa tanto o pôr 
                      como o não pôr jornal nem coisa alguma. 
                      Anulação seguida de recuo. 
                      Chove. As gotas contra o amianto 
                      das telhas descobertas molhariam 
                      por três vezes o não da tartaruga.  
                        
                        
                      (No  entanto d’água, RJ: 7letras, 2006.) 
                        
                      
                      Página publicada em  novembro de 2007. 
                        
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                      TEXTOS EN ESPAÑOL 
                      Tradução de Gladys Mendía  
                       
                       
                        
                      Leonardo  Gandolf nació en Río de Janeiro (RJ), en 1981. Publicó en 2006 el libro de  poemas “No  entanto  d’água”. Fue profesor de Literatura  Portuguesa  en  la UFRJ, actualmente  realiza un   estudio  comparativo  entre   la poesía de Carlos de Oliveira y la de João Cabral de Melo Neto para su  tesis de doctorado.  
                        
                      
                        
                      Fuente: TRÁNSITO DE  FUEGO / TRÂNSITO DE FOGO - Selección de jóvenes poetas latinoamericanos / Selecção de jovens poetas  latinoamericanos 1972-1990. Selección y compilación / Seleção e compilação  Raquel Molina. Traducción al português / Tradução ao português Gladys  Mendía.  Caracas: Casa de las Letras  Andrés Bello, 2009. 
                       
                       
                        
                      La casa está vacía no por mera ausencia, 
                      mas para el aprendizaje de la sustracción. 
                      Y la lluvia, porque cae desde el tercer  verso, 
                      más allá de lluvia es extensión de ese  elefante. 
                      La casa está vacía para que se sepa 
                      del desamparo que hay en insistir en lo  mismo. 
                      Mesa y pausa. La lluvia cayendo tal vez 
                      y apenas como efecto de profundidad. 
                      Después uno de los perros. No, creo que  sólo 
                      su desplazarse repetido hasta la puerta. 
                      La metodología seguida del gesto. 
                      Algunos pájaros siguen para el noroeste. 
                      Todo comienza en el elefante. Lentamente 
                      la bala dentro del tambor, las leyes de la  física. 
                        
                        
                                         *** 
                        
                      Al elefante nada de eso importa; 
                      su corazón hinchado todavía baja 
                      al venir por una línea que va a dar 
                      al lado de las palabras de quien llega. 
                      Y toca el piso. Y cuando lo toca está 
                      tocando notas menos simultáneas  
                      que repetidas. Por ejemplo, pájaros, 
                      diario, perros, tejas de amianto, 
                      árboles, mesa, peces y quién sabe 
                      hasta todo el catálogo de navíos.  
                      Después, recuerdo, alguien se mira en el  espejo. 
                      Todavía no. La paciencia insiste. 
                      Siete años de pastor Jacob servía. 
                      Introducción. El tiempo del elefante. 
                        
                        
                                         *** 
                        
                      Pausa y peces. Moverse en relación 
                      al que se mueve permanece inmóvil. 
                      Muda el registro, árboles más pájaros 
                      igual tal vez la casa menos lluvia. 
                      Muda otra vez: la misma Marianne Moore  
                      — que tradujo hasta algunas fábulas 
                      de La Fontaine —  al leer el verso abajo:  
                      where there is personal liking we go. 
                      Sí, hoy Marianne, mañana Jacob 
                      y así siguiendo, bajo la misma lluvia, 
                      de nombre en nombre hasta tocar el piso, 
                      i.e., hasta que cicatriz alguna 
                      pueda impedir que homónimos Raquel, 
                      Lia e hijos estén entre los suyos. 
                        
                        
                        
                      Página publicada em  abril de 2009. 
                        
                  
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