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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto e biografia: http://www.letras.ufmg.br/literafro/autores

 

 

 

ÉLE SEMOG

pseudônimo de

 

 

LUIZ CARLOS AMARAL GOMES

 

 

 

Luiz Carlos Amaral Gomes, pseudônimo Ele Semog, nasceu em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, em 07 de dezembro de 1952. É formado em Análise de Sistemas, com especialização em Administração de Empresas pela PUC do Rio de Janeiro. No contexto de efervescência cultural e política que propiciou o ressurgimento do movimento negro a partir de fins da década de 1970, participou dos grupos “Garra Suburbana” e “Bate-Boca”, voltados para o estudo e a produção da poesia afrodescendente. Em 1977, integra as antologias Incidente normal e Ebulição da escrivatura, esta última publicada pela Editora Civilização Brasileira. Em 1978, lança o volume de poemas O arco-íris negro, em co-autoria com José Carlos Limeira. A parceria se repete no ano seguinte, com a publicação de Atabaques, livro onde se mantém o discurso de afirmação identitária e de denúncia da desigualdade social.

Em 1984, fundou o grupo Negrícia – Poesia e Arte de Criolo. Ativista e agitador cultural, coordenou o segundo e o terceiro Encontro de Poetas e Ficcionistas Negros Brasileiros. Coordenou também o setor de literatura do projeto “90 anos de Abolição da Escravatura”, com sede no museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro. Em 1980, recebeu da União de Escritores Brasileiros, moção especial do Prêmio Fernando Chinaglia. De acordo com Luiza Lobo (1993), Semog começa a escrever seus poemas num teor político, onde já se vê o traço urbano, humorístico crítico que desenvolve em seus livros de parceria com José Carlos Limeira. Entretanto, em seu último livro, Curetagem (poemas doloridos), a ideia da cicatrização do trauma do parto através da cicatrização do umbigo se frustra, e o poeta se vê 'como um tamarindo que todos sabiam que era azedo', atirado no real, 'navegar para mim não é preciso, sinceramente, não é', e conclui que é um 'objeto inadequado' de amor. (LOBO, 1993, 179)

Entre 1989 e 1996, foi presidente do CEAP – Centro de Articulação de Populações Marginalizadas. Foi co-fundador do jornal Maioria Falante, onde atuou até 1991. Foi Assessor do Senador Abdias Nascimento e Conselheiro Executivo do Instituto Palmares de Direitos Humanos.


Obra individual

Curetagem (poemas doloridos). Rio de Janeiro: Ed. do Autor,1987.

A cor da demanda. Rio de Janeiro: Letra Capital, 1997. (poesia).

Tudo o que está solto: poesias afro-brasileiras. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2010.

Guarda pra mim. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2015. (poesia).

 

 

 

 

 De: A cor da demanda, 1997:


 

 

Curiosidades negras

 

Para que serve um homem
se ele não for sempre
um ontem e um amanhã.

 

Como pode um ser pensante
não ser terra, água, fogo
se ele é planta, ar, bicho,
pedra que fere e constrói
na trajetória do ferro
forma e ar, de toda
a força que lhe faz ser.

 

Impossível, pois se é negro
separar o bom do ruim
o longe do perto,
os olhos da visão.

 

A natureza é uma coisa só
sendo um mutirão.

 

Que sentido tem um ser
negro

se não for dessa perfeição.

 

 

 

De: Atabaques, 1983

 

 

 

Atabaques

 

A farsa e a miséria

São apenas modernas

Mas os grilhões são os mesmos

E devemos rompê-los agora.

 

Hoje os espaços devem ser ocupados
No peito e na raça
Com a raça dessa força
Sem esperar a boa vontade
De obreiros filantrópicos.

 

Nosso lugar é nas escolas técnicas
Nas faculdades... nos escritórios
Onde eles exigem "a priori"
Pessoas de boa aparência.

 

Nosso lugar é na fábrica
Como operário especializado
Nosso lugar é no candomblé,
Na macumba, nos sambas
Nos ministérios e nos postos
De comando das Forças Armadas.

 

Devemos ainda ter posições negras
Humanamente negras,
No senado, na Câmara
Fazendo voz alta à NAÇÃO

 

É hora de ouvir os atabaques
Que nos chamam à participação
Deixar o coração e a alma livres

 

À disposição desse novo canto

Desse nosso fazer...

É a obrigação de hoje, intransferível:

Romper as teias,

Tecer e conhecer caminhos

Chamar quantos queiram ajudar

Pois não temos tempo de separar...

E ser homem é principalmente

Comer a vida.

 

Precisamos, com certa urgência
Sair das cadeias, da prostituição
Temos que limpar as mãos
E apagar as mágoas sem esquecer
Que as marcas são inapagáveis.

 

Pecados rondam nossas cabeças:

A fome, a família à margem das coisas...

Precisamos ter acesso às verdades contemporâneas

 

Precisamos espalhar entre os negros
Todas as respostas disponíveis
A esses porquês que nos perturbam
Assolando, angustiando nossas vidas.

 

SER NEGRO
SER NEGRO
SER NEGRO

 

Atender ao chamado
Dessa verdade inevitável!

 

SER NEGRO
SER NEGRO
SER NEGRO

 

Não aceitar jamais
O paternalismo carrasco
Que faz o coitado e o
Condenado

Exigir, negros que somos,
Que não chamem nossas
Crianças de macaquinhos,
Que não nos olhem desconfiados
Como se fôssemos todos bandidos.

 

SER NEGRO
SER NEGRO
SER NEGRO

 

Ensinar, negros que somos

O confronto com as contradições

Quando nos falarem

Que a luta é mais ampla,

Alerta que no seio dessa desgraça

Sempre nos sobrou inverdades como:

"Deus ajuda a quem madruga" ou

Que "um dia a sorte chega"

Saber todos os perigos

Ouvir todos os gritos

Pois o negro dorme e acorda

Brigando com tudo, contando com tudo

Sobrevivendo no peito.

 

Devemos exigir e ajudar

Que esses atabaques

Acordem Palmares tão disfarçada

Por entre as façanhas do aconchego

Ridículo dessas falsidades.

Acabou-se esse negócio de admitir

Que nos vendem os olhos

 

Às sutilezas que impõem

Que fiquemos em nosso lugar

Ouçam os atabaques

É ZUMBI, zumbido que vem de dentro.

 

 

 

 

De: Cadernos negros: os melhores poemas, 1998.

 

 

Dançando negro

 

Quando eu danço

atabaques excitados,

o meu corpo se esvaindo

em desejos de espaço,

a minha pele negra

dominando o cosmo,

envolvendo o infinito, o som

criando outros êxtases...

Não sou festa para os teus olhos

de branco diante de um show!

Quando eu danço há infusão dos elementos,

sou razão.

O meu corpo não é objeto,
sou revolução.

 

 

 

ANTOLOGIA DA NOVA POESIA BRASILEIRA . Org. Olga Savary. Rio de Janeiro: Ed.          Hipocampo, Fundação Rioarte, 1992.   334 p.   ilus    Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

 

 

 RETRATO

Perdi o movimento
do ciclo
virei domesticado
bicho de circo
desprovido de sentido
e dialética.
Aceitei tanto as grades
que me transformei em jaula
e me prendi dentro de mim.



SUTILEZAS

Lembro na
minha infância
que a mula preta
era assombração.
E no catecismo
quem pecava
ficava com a
alma negra.
O tempo passou,
passou...
e hoje ainda dizem
que preto também é gente.

 

 

 

Página publicada em agosto de 2020; página ampliada em setembro de 2020


 

 

 
 
 
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