Fonte: de uma matéria de Heloisa Buarque de Holanda,
no Jornal do Brasil, sobre o poeta:
http://acd.ufrj.br/pacc/literaria/rendemchefe.html
CHACAL
Chacal (Ricardo de Carvalho) nasceu no Rio de Janeiro, em 1951. Mais conhecido como músico e letrista — com parcerias célebres com Lulu Santos, 14 Bis, Blitz e outras bandas e compositores de sucesso —, Chacal é também, e sobretudo, um poeta criativo, original, irreverente. Surgiu com Muito Prazer , Ricardo (1971) e desde então colabora em antologias, revistas impressas e eletrônicas, em performances, como autor e editor de livros, cronista, guionista, o escambau.
Quem primeiro o indicou para o nosso Portal de Poesia foi nosso amigo Ricardo Muniz de Ruiz, que inclui Chacal na antologia República dos Poetas. Agora é quando.... Deparamos com textos muito expressivos na antologia 41 Poetas do Rio (Funarte, 1998), organizada por Moacyr Felix, de onde fizemos esta breve seleção. Uma homenagem, uma prova de admiração pelo artista.
Recentemente reaparece na Antologia comentada da poesia brasileira do século 21, organizada por Manuel das Costa Pinto, em edição da Publifolha (2006).
LIVROS PUBLICADOS: 1971 (RJ) – Muito Prazer, Ricardo (Ed. do Autor); 1972 (RJ) – Preço da Passagem ( Ed. do Autor); 1975 (RJ) – América ( Ed. do Autor); 1977 (RJ) – Quampérius (Nuvem Cigana); 1979 (RJ) – Olhos Vermelhos (Ed. do Autor); 1979 (RJ) – Nariz Aniz (Ed. do Autor); 1979 (RJ) – Boca Roxa (Ed. do Autor); 1982 (RJ) – Tontas Coisas (Ed. Taurus); 1983 (SP) – Drops de Abril (Ed. Brasiliense); 1986 (SP) – Comício de Tudo (Ed. Brasiliense); 1994 (RJ) – Letra Elétrika (Ed. Diadorim); 1998 (RJ) – Posto Nove (Ed. Dumará/ Rioarte); 2002 (RJ) – A Vida é curta pra ser pequena (Ed.Frente); 2007 (SP) – Belvedere (Cosacnaify e 7 Letras)
PRÊMIOS: 2008 ( SP ) – APCA ( Associação Paulista de Críticos de Artes ); pelo livro BELVEDERE – poesia reunida; 2004 (RJ) – Prêmio URBANIDADE 94 (Instituto de Arquitetos do Brasil pelo CEP 20.000.
(Dados bibliográficos atualizados pelo próprio Chacal, em setembro de 2009)
TEXTOS EM PORTUGUÊS - TEXTOS EN ESPAÑOL
O OUTRO
só quero
o que não
o que nunca
o inviável
o impossível
não quero
o que já
o que foi
o vencido
o plausível
só quero
o que ainda
o que atiça
o impraticável
o incrível
não quero
o que sim
o que sempre
o sabido
o cabível
eu quero
o outro
(De BELVEDERE (1971-2007). Rio de Janeiro: 7 LETRAS; São Paulo: COSACNAIFY, 2007)
Imagem extraída da obra: SÓTER, Navegante ao Léu. Artes: Zé Nobre. Brasìlia: SEMIM edições, 2011. 111 p. Apoio SINPRO. ilus. col.
SENTINELA
teu jeito de elefanta contraído me angustia.
quem sou eu, quem és tu nessa manhã que se anuncia?
sentinela, minha nega, estou tomado pelo teu sentimento.
posso dizer que um elefante passa em mim.
com seu passo lerdo, um tanto tardo de ser.
quando tu assoas tua tromba, sentinela, me assombra.
quem não ficaria sem ar com o teu passar resfriado
com teu ventre que abrange o mundo paralisado?
sentinela. sentinela quem te deu esse nome bacana?
por que sais de manhã toda trêfega e sós voltas sei lá quando?
sentinela, esse jeito avoado de quadrúpede no cio me assanha.
alguns te chamam elefanta, outros aliá e todos tem razão
menos eu sentinela, menos eu que sou assolado pelo
teu sentimento.
por que não vieste a esse mundo, um walk talk, um disc man ?
assim poderia operá-la ou escutar hendrix quando quisesse.
mas não. vieste elefante e para escutar teu berro lancinante
teu ronco visceral, fico impassível como um hidrante.
vai, sentinela, vai !
cambaleante pelas tuas do rio. boa sorte. seja feliz. até logo.
[da revista Inimigo Rumor n. 17, 2005]
DENTES DE AÇO
eu te arranco um pedaço com meus dentes de aço
e faço e refaço no peito e no braço
e te arranco um pedaço com meus dentes de aço
e você acha pouco e diz que eu sou muito louco
mas eu não dou carne a gato
e não vou pagar o pato dos teus sais dos teus ais
eu quero é mais
planetas estrelas cometas
virgínia Sofia Roraima
bem... não se fala mais nisso
até que você descubra
que a bomba H a bossa nova
está na ponta da língua
OSSOS DO OFÍCIO
sempre deixei as barbas de molho
porque barbeiro nenhum me ensinou
como manejar o fio da navalha
sempre tive a pulga atrás da orelha
porque nenhum otorrino me disse
como se fala aos ouvidos das pessoas
sou um cara grilado
um péssimo marido
nove anos de poesia
me renderam apenas
um circo de pulgas
e as barbas mais límpidas da Turquia
PAPAGAIO
estranho poder o do poeta.
escolhe entre quase e cais
quais palavras lhe convêm.
depois as empilha papagaio
e as solta no céu do papel
UMA OUTRA
se você acha que morar num apê
encardido we abafado rua Siqueira
campos um cabeça de porco botar
gravata todo dia para ir de ônibus
trabalhar na rua senador Dantas e
quando pinta tempo e grana batalhar
uma trepada se você acha que dormir
puto e acordar puto é uma eu já acho
é outra.
UMA PALAVRA
uma
palavra
escrita é uma
palavra não dita é uma
palavra maldita é uma palavra
gravada como gravata que é uma palavra
gaiata como goiaba que é uma palavra gostosa
De
NARIZ ANIZ
(da trilogia CARA A CORES)
Capa – desenho PicassoCapa
impressa em silk screen1979
vamos bater 1 papinho
bem popinho
vamos bater 1 pozinho
***
homem com cheiro de peixe
peixe com cheiro de homem
um por dentro do outro
nas marés de lua cheia
na praia dos idos de março
no píer da praça quinze
no barco
***
esses garranchos
como garrincha
garrelincha
e mata um João.
***
na prefeitura qui loucura;
entre os presidentes
os descontentes, cadê meus
dentes? Perdi
num acidente.
***
ontem hoje amanhã e sempre
a mesma coisa
às vezes varea
escassa rarea
vaza enche esvazia
depende do dia
CHACAL. Murundum. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. ISBN 978-85-359-2168-7 72 p. Capa e projeto gráfico: Rodrigo Araújo. “Composta em Din e impressa pela Geográfica em ofsete sobre papel Paperfect da Suzano Papel e Celulose.” Col. A.M. (EE)
MEIO ASSIM
tava atrasado.
o metrô ia sair.
corri.
a porta se fechou.
metade de mim foi.
outra ficou.
uma que já era,
ficou mais ensimesmada.
olhando o relógio
falando no celular.
a outra, tagarela,
levantava leviana
a saia das moças,
uivando intempestiva.
se alguém
encontrar uma delas,
avise a outra.
eu vou ver
se estou na esquina.
POESIA JOVEM ANOS 70. Seleção de textos, notas, estudos biográfico, histórico e crítico e exercícios por: Heloísa Buarque de Hollanda, Carlos Alberto Messeder Pereira. Colaboração: Lula Buarque de Hollanda. Consultoria: Leila Miccolis, Maria Amélia Mello. São Paulo, SP: Abril Educação, 1982. 112 p. 15x21,5 cm. “ Heloísa Buarque de Hollanda “ Ex. bibl. Antonio Miranda
CHACAL. Tudo (e mais um pouco). Poesia reunida (1971-2016). São Paulo: Editora 34, 2016, 408 p. 408 p. 13,5x18 cm. ISBN 978-85-7326-629-0 Ex. bibl. Antonio Miranda
SETE PROVAS E NENHUM CRIME
havia a mancha de sangue no jaleco
e nenhum corpo
havia o olhar rútilo, o rosto crispado
e nenhum motivo
havia o cheiro impregnado no copo
e nenhuma digital
havia o vírus, o bilhete, a arma branca
e nenhum assassinato
havia em vão a confissão
e nenhum ilícito
havia a cadeira de rodas vazia
e nenhum suspeito
havia um gato emborcado no aquário
e peixe nenhum
(De Belvedere, 2007)
CAMARIM
adentrei o camarim
como um encouraçado potenkin
com mil marinheiros sublevados
fazendo algazarra dentro de mim
(De Comício de tudo,1986)
ANATOMIA
pego a palavra no ar
no pulo paro
vejo aparo burilo
no papel reparo
e sigo compondo o verso
(De Comício de tudo,1986)
GANSO
só afogando o (passo de) ganso
vamos tirar o (brasil do) atraso
TEXTOS EN ESPAÑOL
Foto extraída de:
MORDZINSKI, Daniel. A literatura na lente de Daniel Mordzinski. Textos de Adriana Lisboa e Victor Andresco. São Paulo: SESI-SP editora, 2015. 412 p. ilus. col. ISBN 978-82075-604-2 Textos em português e castelhano. Ex. bibl. Antonio Miranda
CHACAL
Rio de Janeiro, 1951. Poeta y letrista. Uno de los nombres más conocidos de la Generación Marginal y de la poesía marginal de los años 70. Comenzó distribuyendo sus libros mimeografiados en la playa de Ipanema. En 1975 participó del grupo de poetas Nuvem Cigana, que buscaba recuperar la poesía hablada y cantada. Como músico y letrista fue una gran presencia en el rock carioca de los años 80, de Blitz, Barão Vermelho, Lobão y Lulu Santos.
En 1990 creó el proyecto CEP 20.000 (Centro de Experimentación Poética), evento multimedia que se mantiene vivo. Recibió el Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte).
Ha escrito piezas de teatro y crónicas y fue guionista de TV Globo. Su poesía de acento beat, pop y urbano está en cerca de 15 libros, entre ellos, Muito prazer, Ricardo (1971), Quampérius (1977), Boca roxa (1979), Drops de abril (1983), Posto nove (1998), A vida é curta pra ser pequena (2002) y Belvedere (2007).
A seguir, textos extraídos de la revista venezolana (en la web) LA COMUNA DE BELLO. N. 2, abril 2014
Meio assim
tava atrasado.
o metrô ia sair.
corri.
a porta se fechou.
metade de mim foi.
outra ficou.
uma que já era,
ficou mais ensimesmada.
olhando o relógio
falando no celular.
a outra, tagarela,
levantava leviana
a saia das moças,
uivando intempestiva.
se alguém
encontrar uma delas,
avise a outra.
eu vou ver
se estou na esquina.
Medio así
estaba atrasado.
el metro iba a salir.
corrí,
la puerta se cerró
mitad de mí fue.
Otra quedó.
una que ya era,
quedó más ensimismada.
mirando el reloj
hablando en el celular.
la otra, habladora
levantaba liviana
la salida de las mozas,
aullando intempestiva.
si alguien
encuentra una de ellas,
avise a la otra.
yo voy a ver
si estoy en la esquina.
Aquilo que sobra
gosto daquilo que sobra.
daquilo que as pessoas desprezam.
na feira, recolho entre os dejetos
a semente da abóbora, a folha da mandioca.
no empório, compro o farelo do trigo, do arroz.
gosto de me alimentar de coisas nutritivas.
pessoas principalmente.
mas nossa cultura, assim como os grãos, refina
as pessoas.
tira delas o mais nutritivo e deixa apenas o miolo
sem sustância.
por isso gosto do que sobra.
das pessoas desprezadas como eu.
Aquello que sobra
gusto de aquello que sobra.
de aquello que las personas desprecian.
en el mercado, recojo entre los desechos
la simiente de la auyama, la flor de la mandioca.
en el emporio, compro el residuo del trigo, del arroz.
gusto de alimentarme de cosas nutritivas.
personas principalmente.
pero nuestra cultura, así como los grados, refina
las personas.
saca de ellas lo más nutritivo y deja apenas el tuétano
sin sustancia.
por eso gusto de lo que sobra.
de las personas despreciadas como yo.
Rápido e rasteiro
vai ter uma festa
que eu vou dançar
até o sapato pedir pra parar.
aí eu paro, tiro o sapato
e danço o resto da vida
Rápido y rastrero
va a tener una fiesta
que yo voy a bailar
hasta que el zapato pida para parar.
ahí yo paro, saco el zapato
y bailo el resto de la vida.
Curral de Deus
Curral de Deus
cães ladram ao longe
galos abrem o berreiro
cigarras se despedem da vida
sapos coacham a verdade
e assim vai mais um dia
nesse curral de Deus.
Corral de Dios
Corral de Dios
perros ladran a lo lejos
gallos abren la gritería
cigarras se despiden de la vida
sapos croan la verdad
y así va un día más
en ese corral de Dios.
CHACAL E ANTONIO MIRANDA no CCBB
A poesia dos anos 70 destoando o coro dos contentes, e agora?
Sessão de entrevistas e leitura de poesia apresentada por Viviane Mosé.
NO CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL – Brasília, dia 10/9 de 2008 às 19 h
ASSALTARAM A GRAMÁTICA
Jovens e vivazes, provocadores e inovadores... Alice Ruiz... todos jovenzinhos..., Chacal e Chico Alvim, Cristina César, Paulo Leminski, Wally Salomão... e outros mais, num video imperdível, memorável, enviado por Edson Cruz, do Sambaquis, que recebeu do Giuseppe Zani, via Ricardo Aleixo, que... agora passamos adiante. Vejam e repassem....
COMENTÁRIO SOBRE A SUSPENSÃO DO VÍDEO:
Aqui está um bom exemplo da confusão referente à Lei do Direito Autoral no Brasil... Recebemos este vídeo pela Internet, de um dos personagens do vídeo, pedindo a difusão...
Foi o que fizemos. A produtora entrou com um pedido para o reconhecimento de seus direitos autorais. O vídeo não foi publicado em nosso Portal, apenas fizemos um link, a pedido de um dos poetas. A fonte onde está depositado deve ter suspenso a disponibilização do video até que se resolva a questão. Sem entrar no mérito do recurso da produtora, fica sempre aquela pergunta: em alguma instância os poetas participantes do vídeo vão receber por sua imagem? Mas a questão é outra: quando o Brasil vai adotar o FAIR USE, quando a divulgação for sem fins lucrativos, por interesse estritamente cultural? Fica aqui o link cego para representar o dano à cultura. Sem com isso querer contestar o pleito da produtora, cuja decisão cabe à justiça, nos estreitos, estreitíssimos, espaços da lei vigente, que estava em processo final de discussão para ser reformada e que atualmente está de molho... Uma lei só é boa quando for justa para todos.
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A CIGARRA – Revista Literária. Santo André, SP. Editora: Jurema Barreto de Souza.
N. 31 – Agosto 1997 Ex. bibl. Antonio Miranda
Página ampliada e republicada em maio de 2007; ampliada e republicada em janeiro de 2011. Página ampliada em julho de 2017. Ampliada em novembro de 2017. Ampliada em junho de 2019
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