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ALDIR BLANC

Fonte da foto: http://butecodoedu.blogspot.com

 ALDIR BLANC

 

(Rio de Janeiro, 2 de setembro de 1946 - Rio de Janeiro, 4 de maio de 2020).

Todo mundo sabe que Aldir Blanc é um dos mais renomados e  celebrados letristas de música do Brasil, com parcerias famosas principalmente com os compositores João Bosco e  Guinga. Suas letras, ao contrário do que  dizem os mais conservadores, são poemas. Mas ele também produz poesia no sentido estritamente discursivo do termo, em boa hora apresentados em livro:  — UM CARA BACANA 19ª  - CONTOS, CRÔNICAS E POEMAS ( Rio de Janeiro: Record, 1996).  Extraímos uma pequena   mostra para atestar o talento (aliás,  irrefutável) do poeta:


DESENCONTRO MARCADO

             Da série “Árias para Folha de Ficus” – I

É, não vem,
não vou.
Deixa pra lá,
depois se vê.
Você queima
e eu não ponho
a mão no fogo por você.



DUAS EM UMA


na boca,
a tua ambigüidade:

arpejos de asas
clara revoada

espelhos cobertos
face a trovoada.


POESMÍSCUO

Faz escuro mas eu cancro.
Vou-me embora de Pasárgada.
Lá, me funiquei com o Rei:
chutei uma drag queen,
sobre o peixe vomitei.
Que as belas sirvam a Vinicius
pra fazer letra com o Tom.
Cu de empregada é que é bom.


CLIMA-X

Quando, agonizantes, gozamos,

transcendemos

essa história de ser mulher
ou ser marido:

É como se você fosse terra
e eu tivesse chovido.

 

                       LETRAS DE MÚSICAS


DOIS PRA LÁ, DOIS PRA CÁ

 

     Composição: Aldir Blanc e João Bosco

 

 

Sentindo frio em minh'alma

Te convidei pra dançar

A tua voz me acalmava:

- São dois pra lá, dois pra cá

 

Meu coração traiçoeiro

Batia mais que o bongô

Tremia mais que as maracás

Descompassado de amor

 

Minha cabeça rodando

Rodava mais que os casais

O teu perfume Gardênia

E não me perguntes mais

 

A tua mão no pescoço

As tuas costas macias

Por quanto tempo rondaram

As minhas noites vazias

 

No dedo, um falso brilhante

Brincos iguais ao colar

E a ponta de um torturante

Band-aid no calcanhar

 

Eu, hoje, me embriagando

De whisky com guaraná

Ouvi tua voz murmurando:

— São dois pra lá, dois pra cá

 

O BÊBADO E A EQUILIBRISTA

 

         Aldir Blanc

 

Caía
a tarde feito um viaduto

E um bêbado trajando luto
me lembrou Carlitos.

A lua,
tal qual a dona de um bordel

pedia a cada estrela fria

Um brilho de aluguel.

E nuvens,
lá no mata-borrão do céu

chupavam manchas torturadas,
que sufoco.

Louco,
o bêbado com chapéu-coco

fazia irreverências mil
pra noite do Brasil.

 

Meu Brasil

Que sonha
com a volta do irmão do Henfil

Com tanta gente que partiu
num rabo de foguete.

Chora
a nossa pátria, mãe gentil,

choram Marias e Clarices*
no solo do Brasil.

Mas sei
que uma dor assim pungente

Não há de ser inutilmente,
a esperança

dança na corda bamba de sombrinha,

e em cada passo dessa linha

pode se machucar.

Azar,
a esperança equilibrista

Sabe que o show de todo artista

tem que continuar...

 

 

Nota: no livro aparece “Clarisses” mas em sítios na web aparece “Clarices” com “c”, lembrando a escritora Clarice   Lispector.

 

 

 

BLANC, Aldir  ]  VIANNA, Luiz Fernando.  Aldir Blanc. Respostas ao tempo: vida e letras.  Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013.  312 p.    Ilus.   ISBN 978-85-7734=307-2   Capa e projeto gráfico do miolo: Rico Bacellar. Foto da capa: Paulo Rodurigues Júnior.  Col. A.M.   

 

Casa de marimbondo

 

                      JOÃO BOSCO e ALDIR BLANC

 

Meu samba é casa de marimbondo:

Tem sempre enxame pra quem mexer

Não sabe com quem está falando

Nem quer saber, nem quer saber, nem quer saber

Tem gente, aí que. acha

Que samba é contravenção

Eu saco bem o tipo

E sou de opinião

Que é nego acredita

Que sempre tá com a razão

Meu samba sempre, diz:

Essa Não! Essa Não! Essa Não!

Se o morro fica fazendo média

E aceitando a situação

Meu samba chega e, de cara feia

Dá decisão, dá decisão, dá decisão.

 

Dasdô e o gato

 

          CRISTÓVÃO BASTOS E ALDIR BLANC

 

Dasdô, se o destino separou nós dois

Devorve o gato, que o resto a gente vê depois

Sinto farta do teu amor

Mas sofro mais sem Nabucodonossor

É sofrimento pra ninguém botar defeito

O gato é minha cara e desse jeito

Você não vai sentir a minha farta

Sem os dois perto de mim

Ando até com pressão arta

Tropeço nas ruas da vida

Bebendo no bar do Bexiga

E a lua hoje é minha inimiga

E faz prosa de mim

Sei que a Dasdô com pose de teatro

Punhala o gato e transforma em tamborim

Ai mato a gata pelo gato

E a saudade fez do mato

Toma conta do canteiro

Dasdô e Nabucodonossor
Nenhum dos dois presta

E o que me resta

Do mundo inteiro

 

 

Página publicada em dezembro de 2008.

 

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