FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
Estreou-se na poesia, em 1966, com o livro “Areias”, 1966, publicando mais os seguintes: “Pedra em Sobressalto”, 1972; “Universo das Águas”, 1979; “Bar Carnaúba”, 1983; “Quinteto em mi(m)”, 1986; “Sonetos da Paixão”, 1988; “Poemas Ou/tonais”, 1991; “Poemas Traduzidos”, 1993; “Poesia in Completa”, 1998, comemorando os 30 anos de “tensa comunhão com a palavra”, no experiente dizer da Profª Nelly Novaes Coelho; Vir@gens, 2001, e Sonetos Escolhidos, 2003, na área da poesia. Participou da antologia “A Poesia Piauiense do Século XX”, organizada por Assis Brasil, e de outras antologias poéticas, inclusive no exterior (Estados Unidos, França, Cuba e Portugal).
Em prosa é autor de “Os Estigmas” (1984, reeditado em 2004), “Laços de Poder” (1991) e “Ternura” (1993). No ano passado ganhou o prêmio Fontes Ibiapina de romance, com o seu inédito “D. Xicote”, prêmio que, aliás, já lhe tinha sido conferido pela Fundação Cultural do Piauí ao romance “Laços de Poder”, nos idos de 1980.
Praticou também o conto inovador em “Eu e meu Amigo Charles Brown” (1986), “Por que Petrônio não Ganhou o Céu” (1999) e “Rebelião das Almas”, 2001.
É cronista (E a Vida se Fez Crônica, 1996) e crítico literário de renome (Linguagem e Comunicação em O. G. Rego de Carvalho, 1972/1997, 1ª e 2ª edição, respectivamente, e A Poesia Social de Castro Alves, 1979), tendo recebido prêmios em todos os gêneros literários que pratica. Além desses, devem ser considerados na mesma área “Piauí: Terra, História e Literatura” (1980) e “Literatura do Piauí” (2001). São ainda inéditos, esperando publicação, além do já citado romance “D. Xicote”, dois de poemas: “Itinerário de Passar a Tarde” e “O Coração do Instante”, mais uma biografia de seu pai: “Miguel Guarani, Mestre e Violeiro”.
Outros poemas do autor em: http://www.usinadeletras.com.br/
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
REVISTA DA ACADEMIA DE LETRAS DO BRASIL. Ano 4, jan./jun. No. 7 – jan./jun. 2022. Editor: Flavio R. Kothe. Brasília, DF: Editora Cajuína, Opção editora, 2023. 158 p. ISSN 2674-8495
CANÇÃO I
A tarde morre de repente
e a noite está em mim.
Quando te vais, amor,
quando te vais
é como se fosse para sempre.
Mas quando as asas do escuro
pousam sobre o mundo
enxergo-te em meus braços.
A noite é dos espíritos.
LIED I
[Texto em Alemão]
Der Nachmittag stirbt plötzlich
und die Nacht ist in mir.
Wenn du weg bist, meine Liebe,
ween du weg bist,
ist es wie für immer.
Aber wenn die Flügel der Dunkelheit
über der Welt landen,
sehe ich dich in meinen Armen.
Die Nacht gehört dan Geistern.
CANÇÃO II
Meu dia amanhece
Quando a preguiça me aquece.
Lá no jardim, borboletas
Tomam café com açúcar.
No campo os pássaros cantam
Passarinhando e passeiam.
E os que não sabem cantar
Admiram os cantores,
Como eu quando amanheço.
O dia começa cedo
Para os que sonham bons sonhos
De princesas e anjos da guarda
Saindo das borboletas.
LIED II
Mein Tag bricht an,
Wenn die Faulheit mich vergisst.
Dort in Garten, Schmetterlinge
Trinken Kaffee mit Zucker.
Auf dem Feld singen,
Fliegen und flanieren die Vögel.
Und die, die nicht singen können
Bewundert die Sänger,
Wie ich, venn ich aufwache.
Der Tag beginnt früh
Für diejeningen, die süß Träume träumen,
Von Prinzessinnen und Schtezengeln,
Die aus den Schmetterlingen herauskommen.
POEMA EM ALEMÃO-PORTUGUÊS
PAISAGEM POR DENTRO
Abro os braços
para a paisagem
descortinada janela a fora,
aos olhos que se arregalam.
E o coração:
- a vida é bela bebida aos poucos.
O verde enverdece o sol,
o amarelo traz fruta – esperança,
a saudade em chuva e orvalho
cai (dos tempos de criança).
Bate-me por dentro, nas laterais:
- as narinas sentem
e os ouvidos ouvem
o vento
e seus mistérios e eflúvios,
arrepiando a pele como tentáculos.
A alma que voava
me pousou
na beira do sonho.
QUANDO (poema sem adjetivos)
Amar é quando eu digo:
- “Amo!”
sem saber a quem?
Ou quando abraço e beijo
e tomo o seu sobejo?
Todos perseguimos
a pureza do amor...
e ele nos resiste.
O amor consiste
nessa ilusão do uno
que partiu-se.
Os adjetivos atrapalham
a vida e o amor.
O amor se despetala
é quando eu digo:
- “Amei!...”
PAISAGEM
“Toda paisagem tem um ar de sonho”.
Dante Milano
Mal os braços se abrem
a paisagem me come
o coração – corcel dos nervos.
Bebida em haustos
a vida bate,
enverdece o sol,
amarela os frutos – esperança.
E a saudade em chuva e orvalho
não cai roxa.
O tempo não avança.
Minhas lanternas corporais
são meninas vadias,
e os ouvidos ouvem pássaros,
mistérios, eflúvios,
arrepiando os tentáculos.
A alma que voava
me pousou
na beira de outro sonho.
O QUE MORRE
Casa e caminhos morrem desamados,
esquecidos, na solidão do Além.
Os segredos falecem de guardados,
e amores morrem quando morre alguém.
O porto morre. A onda se esvazia.
E o sonho esvai-se quando acorrentado.
A treva nasce do morrer do dia.
Morre o rico, o feliz e o desgraçado.
Nada é imortal, pois o que nasce vibra
somente um instante para a queda enorme,
eis que essa lei fatal tudo equilibra.
Morrem lembranças, fruto do passado,
e o presente e o futuro quando dorme
o homem sem fé, sem luz, abandonado.
À MINHA VILA
Entre dois chapadões – terra bendita,
de alma mais pura do que a branca areia,
terra que ouviu, de minha mãe contrita,
rezas a Deus, logo depois da ceia:
– És tão humilde e pequenina aldeia
que, pela vida, em nosso peito habita.
Qual semente daquele que semeia,
és semente do amor – terra bendita !
Tens do sol - o calor, o frio luar,
a gigantesca sombra do juazeiro,
da carnaubeira – o quente farfalhar.
Vê-se, em roda à capela, o casario
Como a adorá-la. Ó Jenipapeiro !...
De frente: o vale, o lajeado, o rio.
FILOSOFIA DO TRIVIAL
Acendido o cigarro, o fumo passa
a alongar-se pro alto, com desdém.
Outro cigarro acende-se: fumaça
voa do peito, vai procurar quem?
Porque tão longe em cinza se consome,
voltamos a pensar outra desgraça,
outra tristeza que não sei o nome.
E a nossa vida esvai-se e se adelgaça !
Por um momento cresce e se avoluma,
por um momento cria a dor das crenças,
para depois se transformar em bruma.
Pensando bem (ou mal), a vida passa:
– Um punhado de crenças e descrenças,
um minuto, um cigarro, uma fumaça !...
VISÃO DO RIO PARNAÍBA
(Com o perdão de Da Costa e Silva, o maior dos poetas piauienses).
Parnaíba, te vejo intensamente,
na dor de “velho monge” resignado,
a dar vida, prendido na corrente,
a derramar-te ao longe, e fatigado.
No rijo dorso levas, noite e dia,
lendas, canoas, barcos, pescadores.
E em cada braço, a verde ramaria
enfeitada de rendas e de cores.
Sem bordão, sem rosário, sem vaidade,
desafias o sol, a areia ardente,
abraçando cidade e mais cidade.
Nessa faina, ora calma, ora inquieta,
Humildemente, carismaticamente,
Cantas do canto que cantou o poeta.
MOURA, Francisco Miguel de. Sonetos escolhidos. Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2003. 188 p. 14.21 cm. ISBN 85-86276-43-X “Francisco Miguel de Moura” Ex. bibl. Antonio Miranda
Arte gráfica: Edson Guedes de Moraes
– Editora Guararapes – PE - 2016
MOURA, Francisco Miguel de. Francisco Miguel de Moura. Jaboatão, PE: Editora Guararapes EGM, 2015. 40 p. ilus.20,5x13 cm. Apresentação de Fernando Py. Inclui os poemas "Andarilha", "Confiteor", "Dúvida", "Essa chuva", "Eu e meu nome", "Meu Estado", "Amor bucólico", "O que fazer", "Perdida esperança", "Querenças", "Curriculum vitae", "Paralelo 2", "Soneto amigo"" Amarguradamente". Edição alternativa e limitada de Edson Guedes de Moraes. Ex. bibl. Antonio Miranda.
Veja o e-book: https://issuu.com/antoniomiranda/docs/francisco_miguel_de_moura
TEXT IN ENGLISH
SE NÃO FOSSE...
Deus foi quem fez do nada o nado
que despreza — águas do tempo.
Eu, nada no nada onde me afogo,
um líquido sem peso nem cor,
dura consolação sem suspiros.
Vomito palavras,
perpetro saudades do que não quero
e arrumo queixas no vazio.
Onde andava a onda de Deus
antes do tempo, antes de nada?
Bendito nada, onde estaria Deus,
de onde eu nasci, e meu poema!
TEXT EN FRANÇAIS
SI RIEN N´AVAIT ÈTÉ *
Si rien n´avait èté
Dieu fût celui du néant
fait le levant
qui dédaigne — les eaux du temps.
Moi, né dans le rien où je me noie,
un liquide sans poids ni couleur,
dure consolation san soupirs.
Je vomis des mots,
e fais durer des nostalgies dont je ne
veux
et j´arrime des plaintes dans la vide.
Où allait l´onde de Dieu
avant le temps, avant le néant?
Béni rien, où était Dieu,
d´oú je naquis et mon poème!
*Tradução de Jean-Paul Mestas,
poeta francês contemporâneo.
TEXT IN ENGLISH
SE NÃO FOSSE...
Deus foi quem fez do nada o nado
que despreza — águas do tempo.
Eu, nada no nada onde me afogo,
um líquido sem peso nem cor,
dura consolação sem suspiros.
Vomito palavras,
perpetro saudades do que não quero
e arrumo queixas no vazio.
Onde andava a onda de Deus
antes do tempo, antes de nada?
Bendito nada, onde estaria Deus,
de onde eu nasci, e meu poema!
TEXT EN FRANÇAIS
SI RIEN N´AVAIT ÈTÉ *
Si rien n´avait èté
Dieu fût celui du néant
fait le levant
qui dédaigne — les eaux du temps.
Moi, né dans le rien où je me noie,
un liquide sans poids ni couleur,
dure consolation san soupirs.
Je vomis des mots,
je fais durer des nostalgies dont je ne
veux
et j´arrime des plaintes dans la vide.
Où allait l´onde de Dieu
avant le temps, avant le néant?
Béni rien, où était Dieu,
d´oú je naquis et mon poème!
*Tradução de Jean-Paul Mestas,
poeta francês contemporâneo.
TEXT IN ENGLISH
Translated by Teresinka Pereira
LITERATURA. Revista do Escritor Brasileiro. No. 35 Ano XVII setembro 2008. Editor: Nilto Maciel. Brasilia: 2008.
Ex. bibl. Antonio Miranda
O TEMPO E A HORA NOW IST THE TIME
O tempo é a hora Now is the time
da verdade — dura: of truth — hard:
Cavalo de pau. Stud horse.
Não há pergunta, No question,
nem “não sei”, not even “I don´t know,
esconder. hiding.
É esperar o rouco canto Just wait for for the horse singing
do galo, ou o freio brusco of the rooster, or the sudden break. Não olhe pra ninguém, Don´t look to others,
é o seu. Because it is yours,
Não adiante contestar Don´t discuss it
nem desdizer, or pretend you did not see it.
nem fingir o que se vê. Time is hear,
O tempo e a hora, we all guessed it.
todos adivinham.
A esperança não vem perto. Hope is not near.
TEXTOS EN ESPAÑOL
Traducción de Gabriel Solís
MI CANTO
Canto mientras el mundo
me pinta de esencias
sensuales
mi placer es contraste:
sólo me oigo cual vehículo
raspando el polvo asfáltico
canto más porque tengo un
líquido problema gutural
en mi voz original
mi canto sale del cuerpo por la
mirada
quebrado
y en tus ojos se rehace.
ABANDONOS
El poema pálido perdido
de cien años
tuberculosamente amor/tajado
la luz lunar que perdí
del antes de la serenata
a la vida en los libros
de latín - no vi/vida
el tiempo en la silla de la televisión
en la sala de visitas
la vida di-vi-di-da
entre peleas y migajas
y así
¿porqué hablar del sueño
¿ que pasó?
¿ —pasó?
? —sonó?
? ó?
MOMENTO EN LA CARRETERA
El canto del pájaro me trae
un halo perdido de deseos.
Paso en largos sorbos,
apresurado,
sin lágrimas ni sed.
Preciso de ternuras
actuales (difíciles).
Me conecto al paisaje de la luna,
desconecto los pies de la flora,
y piso los pirilampos.
La fuerza es grave, desciende,
y voy descendiendo al fondo,
al más profundo valle
de mí. ..
¿Cómo hacerme?
¡Arre! No aguanto más
tanto paso perdido,
tanto sudor del revés,
callando las rendijas
de un pasado amordazado.
DEL LAS COSAS SIMPLES
Barco amarrado en el muelle
mar amarrado en la playa
cuerpo amarrado en el barco
ropa amarrada en la piel
(nombre amarrado al destino)
zapato contra zapato
barco amarrado al mar
pez amarrado al barco
mar amarrado al mar
playa amarrada al sol
clase amarrada a la clave
carne amarrada a la sal
nada libertad nada.
Extraído de POESÍA DE BRASIL, 1.ARICY cURVelLo; tradução de Gabriel Solís. Bento Gonçalves:Proyecto Cultural SAur/Brasil, 2000. 188p.
Poemas de Francisco Miguel de Moura (1933 – , Brasil) traduzidos ao alemão
Por: Marcos FreitasEm: 12/08/2022, às 12H49
POEMA EM ALEMÃO-PORTUGUÊS
CANÇÃO I
A tarde morre de repente
e a noite está em mim.
Quando te vais, amor,
quando te vais
é como se fosse para sempre.
Mas quando as asas do escuro
pousam sobre o mundo
enxergo-te em meus braços.
A noite é dos espíritos.
LIED I
Der Nachmittag stirbt plötzlich
und die Nacht ist in mir.
Wenn du weg bist, meine Liebe,
wenn du weg bist,
ist es wie für immer.
Aber wenn die Flügel der Dunkelheit
über der Welt landen,
sehe ich dich in meinen Armen.
Die Nacht gehört den Geistern.
CANÇÃO II
Meu dia amanhece
Quando a preguiça me aquece.
Lá no jardim, borboletas
Tomam café com açúcar.
No campo os pássaros cantam
Passarinhando e passeiam.
E os que não sabem cantar
Admiram os cantores,
Como eu quando amanheço.
O dia começa cedo
Para os que sonham bons sonhos
De princesa e anjos da guarda
Saindo das borboletas.
LIED II
Mein Tag bricht an,
Wenn die Faulheit mich wärmt.
Dort im Garten,
Trinken Schmetterlinge Kaffee mit Zucker.
Auf dem Feld singen,
Fliegen und flanieren die Vögel.
Und die, die nicht singen können
Bewundert die Sänger,
Wie ich, wenn ich aufwache.
Der Tag beginnt früh
Für diejenigen, die süße Träume träumen,
Von Prinzessinnen und Schutzengeln,
Die aus den Schmetterlingen herauskommen.
[tradução ao alemão por Marcos Freitas] Publicado na
Revista da Academia de Letras do Brasil, Ano 4, Número 7 - jan./jun. - 2022, Brasília - DF. ISSN 2674-8495. Editora Cajuína.
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