WLADEMIR CAZÉ
(Petrolina, Pernambuco, 1976)
Publicou "Microafetos" (poesia, Edições K, 2005), "ABC do Carnaval" (cordel, Edições K, 2009) e "A filha do imperador que foi morta em Petrolina" (caordel, 200e, 2a ed. 2009). Mantém o blog: www.silvahorrida.blogspot.com
De
Wladimir Cazé
MACROMUNDO
Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2010. 63 p.
ISBN 978-85-606722-4
O SOL, COMO INVESTE
Não como a espuma de fofas nuvens,
que, se algo encobre, tocar nada pode;
nem da lua o contato, sem gume
mas com a fibra, que fere, de um sabre;
e nem a lã ou seda que o céu põe
sobre a terra em repouso suave;
como ataque incessante de unha
que à parede adere, que investe
tendo de um tapa o estalido, o sol
é tatuado em pedra ou em pele.
DOIS URUBUS
1.
Agoniza sozinho,
um abutre pútrido,
desnutrido, tardiamente vivo,
na lama plástica preta esticado,
sob bicadas de um urubu
(soturno verdugo noturno).
2.
O urubu sombrio
cata com o bico
a carne da galinha velha
na monótona mortalha espalhada,
migalhas amanhecidas
sobre a tumba fria.
GAIVOTAS 3
Duas gaivotas se cruzam
num cais, possível esquina
ou desacerto de ruas,
e o céu é duplo, cinzazul.
Como a noite vem, severa,
separar suas venturas,
produzem sílabas ásperas,
rogos, avisos, perguntas.
MOLUSCO
O vento sopra
sobre a rocha
onde a concha
dobra o som
dentro: outro
sopro venta.
A onda quebra
contra a pedra;
o mar não cessa
de pôr no casco
do molusco em colapso
o tempo quase intacto.
ALIMÁRIA
Penetrantes, insetos
se instalaram no armário
e agora imperam no assoalho,
nas paredes, no teto.
Formigas no azulejo do banheiro,
bichos de todos os tipos<
besouros, mosquitos.
Cupins comendo a madeira dos móveis,
minúsculos produtores de areia amarela.
Então eles começam a roer os livros.
Página publicada em outubro de 2010. |