PAULO CARDOSO
Pernambucano de São José do Egito, nascido a 23 de março de 1939. . É bacharel em Direito pela Unicap. Publicou Árvores sem sol (1964), Poemas (1992), Salva de versos (1992), As veias da noite (1993),Os passos da insônia (1994), Fronteira de dois chãos (1995) e A pedra dos oráculos (1996). Membro da UBE-PE e Academia Recifense de Letras.
( Pernambuco – Brasil )
( 1939-2002)
DA VIAGEM
No vasto panorama que aprecio
de bruços na janela da lembrança,
dou rédeas ao corcel que a vista alcança
e ao meio da viagem me extravio.
Doideja a caravana no confuso
traçado das veredas. Tonto, sinto
e vejo bifurcar o labirinto
nas armadilhas do ar baço de difuso.
Sob o brilho das luzes destiladas
nas vias das estrelas escondidas
as musas cantam odes distraídas
e os deuses pisam uvas sazonadas.
O inconformismo d´alma irrequieta,
o bálsamo da seiva; ele aviltava
os sonhos de um menino que sonhava
com sonhos ilusórios de poeta.
Perdido, fui ao máximo que pude
na escalada de abismos e de montes,
e me encontro, afinal, nos horizontes
em estado de paz e plenitude.
( Vigília, 2000)
SONETO FLUVIAL
Rcife está moderna. Com mil polos.
Mas presa às intempéries e aos tormentos
dos veios d'água que se ocultam, lentos,
no vasto pantanal do subsolo.
De alicerces fincados sob o solo
os muros seculares dos conventos
não resistem às chuvas nem aos ventos:
escorre o pó sanguíneo dos tijolos.
Tem céu azul e sol que cedo alveja
avenidas e praças. Talvez seja
o retiro das moças enganadas.
Das náufragas estrelas: sete-estrelo
e o cruzeiro do sul navegam pelos
dois rios da cidade safenada.
De
Paulo Cardoso
A PEDRA DOS ORÁCULOS
Capa e ilustrações de Cavani Rosas.
Recife: Editora COMUNICARTE. 1996.
57 p. ilus. p&b
UM SONHO EM PORTUGAL
Viajei a Portugal de madrugada.
Pelas ruas estreitas de outras épocas
visitei velhos prédios sem estética
com cegos azulejos nas fachadas.
Vi à margem de aquáticas douradas
(recanto de harmonia tão poética)
waldemarinas expressões sintéticas
a Ferreira de Castro dedicadas.
O silêncio das pedras era surdo
como o canto de um pássaro viúvo
retraído em profunda solidão.
Foi assim que sonhei Lisboa antiga:
um rebanho de pombos na avenida
voando sobre mim em saudação.
CONVÍVIO COM O SILÊNCIO
Prefiro consumir noturnas musas.
Delas é que mais flui a essência poética
irrigando e regando a forma, a estética
e as dúvidas das métricas confusas.
Meus versos são lavados pelas chuvas
que caem finas nas manhãs desérticas,
muitas vezes levadas pelas célicas
e indestinadas passageiras nuvens.
Em silêncio se entendem surdos-mudos.
A solidão é a casa dos viúvos
— revivência de lutas e de glórias.
Na grade de azulejo existe um rosto
que o fascínio de ver, antes exposto,
ficou microfilmado na memória.
Página publicada em setembro de 2011
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