PAULO BANDEIRA DA CRUZ
Paulo Bandeira da Cruz é um sonetista exímio. Tem a volúpia do soneto harmonioso. O poeta é arcanjo, marinheiro e saltimbanco. (..) E o nosso Autor ama especialmente o Apocalipse, porque o cita frequentemente nas suas epígrafes. Trata-se de uma intimidade impressionante com o livro profético, como testemunho, como desafio, como mensagem." ANTONIO CARLOS VILLAÇA
De
Paulo Bandeira da Cruz
CIRANDA DE SONETOS
Rio de Janeiro: José Olympio; Recife: Fundarpe, 1985. 73 p.
O MANEQUIM
Esta é a lei da praga da lepra no vestido de lã
ou de linho, quer na urdidura, quer na trama,
ou em qualquer coisa feita de pele, para os declarar
limpos ou para aos declarar imundos.
LEVÍTICO, 15:59
Um corpo guarda no íntimo
a dança do seu vestido
ambos crescem, ambos dormem
presas de enredo e tecido.
Um corpo veste a paisagem
e a veste cobre o sentido
por isso um corpo se veste
ficando, às vezes, despido.
Lavando o pano se lava
um corpo que está medido
(suspenso às mangas da cava).
Se morrem, vão de arremesso
e seguem — corpo e vestido —
fechados num mesmo avesso.
ORAÇÃO
Pai nosso que estás vestido
com minha roupa de dor
fio de invisível tecido
ou a linha do equador.
Utilizo tuas luvas
(minhas mãos de lutador)
manipulo teus milagres,
de anjo e prestidigitador.
Multiplico tua imagem
porque sou teu criador
soprando o barro e a ferrugem
que te sustentam no andor:
Mas glorifico o teu nome
com minha fome (de amor).
Página publicada em setembro de 2010
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