FRANCISCO BANDEIRA DE MELLO
Poeta, jornalista, advogado, nasceu no Recife em 29 de abril de 1936. E,m 1955: prêmio de Poesia do Estado de Pernambuco, com o livro "O pássaro narciso". Redator do Jornal do Comércio do Recife. Publicou, entre outros, o livro de poemas "A máquina de Orfeu".) Membro da Academia Pernambucana de Letras.
O HOMEM DE PEDRA
Hoje deu-me náuseas
a arte: força é cantar
os ritmos do escuro
as rosas sepulcrais
o nosso barro imóvel?
O mundo: caos e ordem.
E os nossos olhos flamam
de sonhos, no sal longínquo
dos lagos da espera.
Apagam-se as rosas
belas e verdes, na noite.
Ficamos sós embebidos
de esperanças e cinzas.
Quem estamos nós
quando estamos sozinhos?
que sol corrói nossa alma
perfumada e escura?
Prisioneiros, um dia
vestimos nossa mão de luta
de roxas desilusões
e pálidos abismos.
Prisioneiros, um dia
vestimos nossa mão
de luta, comícios de pedra.
(A máquina de Orpheu)
VELHO TEMA
Só eu sinto o que sinto
e mais ninguém
(e isto me consola também).
Quando eu vou pelas nuvens
de acanto
solitário e tranquilo
que coisas pergunto
além do meu brilho?
Porque bebo tanta cinza
se já sou maior
se já tenho patente
de ser o que sou?
Vou pela estrada sem brilho
sozinho sem ninguém
como se das trevas extrair
pudesse
a lembrança de alguém.
Depois eu sei que sou um quarto
do que poderia ser
uma estrela que brilha
com tal estribilho
que não sei viver.
(A máquina de Orpheu)
(Extraído da antologia A NOVÍSSIMA POESIA BRASILEIRA. Seleção de Valmir Ayala. Rio de Janeiro: 1962. (Série Cadernos Brasileiros, 2)
O EQUILIBRISTA
Tocávamos clarinete na corda bamba
subíamos às altas torres do Egito
passeávamos de pára-quedas
no sol sem fim dos dias de fogo
subíamos à capota do avião
por cima das nuvens
recitávamos poemas à lua
tocando nela.
Andávamos nos parapeitos dos edifícios
de um pé só na balaustrada dos abismos
não caíamos dos fios metálicos do circo
andando de cabeça para baixo
nem do alto da torre Eiffel correndo
sonâmbulo.
Só na vida é que não nos equilibrávamos.
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PERGUNTAS
o que vale Duvalier?
vale um vale de lágrimas
o que vale Stroessner?
o stress de um povo
e o general Ogania?
a agonia geral
e René Barrientos?
pouco mais que o barro
e Richard Nixon?
não vale nem isso
e o general Alvarado?
eu não sei o que vale
e o generalíssimo Franco?
menos do que o peso
e o Perez Jimenez?
nada bom se espere
e Fidel? e Fidel
vale um povo castrado
e Arthur Costa e Silva?
uma selva sem nada
(o que vale essa gente?
é o que me pergunto).
Francisco Bandeira de Mello.
Eztraído da revista poesia postal N. 5 INVENÇÃO DE POESIA Junho 2005, Org. Silvio Hansen, patrocinio Prefeitura do Recife. (folhas soltas em envelope para postagem).
Página publicada em fevereiro de 2009. ampliada e republicada em dezembro 2010 |