AUGUSTO RODRIGUES
De
27 poemas de Augusto Rodrigues
Recife: Tipografia Marista, 1971
Álbum com fólios soltos. Uma tiragem especial de 116 exemplares, em papel Ingres, Fabriano, com desenho e assinatura do autor.
4
Seguir a palavra
e só possuí-la
quando contida e liberta
capaz de um só tempo
ser nuvem e vento
ou de abrir-se em flor
ou de fechar-se
para nela dentro dela
guardar o que
para existir não se revela
7
Para dormir
inclinar suavemente
a cabeça
até o encontro
do colo da amada
para acordar
despertar os olhos
e descobrir nas coisas
o que de sonho há
para amar
ver a amada como fruto
como flor
para que o ato de amar
efêmero como fruto
seja eterno como flor
17
Misturei
e por que não?
folhas de grandes árvores
com raminhos de agrião
o terno sentimento
e o fogo da paixão
a música do céu descida
e o mais puro canto chão
25
Lia Machado de Assis de cabeça pra baixo
escrevia rápido de trás pra frente
inventava a língua que falava
usava os sapatos na cabeça
e a todos indistintamente cumprimentava
como se todos
fossem seus irmãos
RODRIGUES, Augusto. Eu vi. s.l.: 1985. Edição comemorativa dos 72 anos do artista. Inclui 1 poema e 13 reproduções de gravuras coloridas do autor, em fotocomposição da Art Line Produções Gráficas, em papel couché mate 150 g/m3. Edição de 2500 exs, e uma tiragem de de 100 exs. numerados e assinados pelo autor. Formato 27x35 cm. Capa: Livio Maia. Ex. bibl. Antonio Miranda.
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Eu vi a moça alongar o braço
para alcançar a estrela fugidia
eu vi a sabiá, com jeito de rainha, descer
em nascente dia, no largo do boticário
eu vi a criança, debaixo da trama do tecido
leve e clara, pálida e morta
eu vi a réstia de sol indicando o caminho
de volta ao paraíso perdido
eu vi o vestido de noiva perdido num mar de pranto
eu vi as mulheres de guarda-chuvas abertos
temente às iras de Deus
eu vi o rio chora de pena da moça
que se esvaía em lágrimas
e a trança, eu vi, parecia tão forte
que poderia reter, no cais, um navio
eu vi, dentro de mim, Glauce, Heitor, Vitalino e
e meus irmãos de sangue
eu vi, ouvi, as batidas do meu coração
na existência de porta e vento
eu vi a borboleta no ar fazendo amor
eu vi o menino agarrando um trenzinho
como se ele fosse a tábua de salvação
eu vi nos olhos a melancolia da vaca
eu vi o velho desfazendo fio a fio
a trama dos seus pecados
eu vi, no botequim, a cabra de terno e gravata
jogando escravos de Jó
eu vi no espelho quebrado
a minha imagem em pedaços
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Página publicada em junho de 2009;
Página ampliada e republicada em dezembro de 2020
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