VINICIUS LIMA
VINÍCIUS LIMA (1977) é jornalista, ensaísta, tradutor, antipoeta e anarquista. Publicou de forma independente e artesanal os livros Herbarium (2013) e Planta de Pé (2014). Traduziu, entre outros, Nicanor Parra
(A Batalha Campal & Outros Poemas), Leopoldo María Panero (Dionysos)
Alejandro Jodorowsky (No Basta Decir) e Marosa di Giorgio (La Guerra de los Huertos). Desenvolve pesquisas no campo da Ecocrítica e Poéticas da Voz. Praticante de Agroecologia. Vive em Londrina.
LIMA, Vinicius. animais floridos. Belo Horizonte, MG: Anome Livros, 2016. 100 p. 13x21 cm. Editor Wilmar Silva de Andrade. Ilustração da capa: Silvio Alvarez. Colagem “Pavão Mirabolante” ISBN 978-85-98378-95-4 Ex. bibl. Antonio Miranda
heraclito machine
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relva raia sua plástica de cor
fúria entre seus suores
anfíbio sugando lodo na pedra úmida
amantes se sugando sangrando sexo
rubra obra o carvão matura a ossada fria
entre os respiros da fogueira
forte fragrância frutada
longitude do cedro sobre nossos pés
amassando nosso pulmão
amansando todo desespero tatuado
na pele prenhe do sol
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tudo havia começado com a lua dançarina
e seu vestido da cauda de prata
leite pulsante nas veias dos morcegos que bebem
os frutos coloridos pregados na noite cega em p&b
abençoada religião dos espectros portáteis
das peçonhentas criaturas musicais
que pra sempre nos cantam suas árias gris
a respiração do cateto
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forquilha óssea no corpo aceso constrói as sete fa-
ces do vento maduro sanguínea herpertologia sa-
grada que abre o horizonte preso nos olhos da rã
úmida de chuva e rio gelado descendo goela abaixo
da noite vermelha os raios conduzem como fôlego e
estremecem as árvores encurvadas na trilha íngre-
me abrir a fumaça vegetal com as mãos delicadas
do louva-deus adormecido no bosque como um so-
nho vivo dentro do meu sonho ou das plantas que
crescem nutridas de sombras e dilúvios
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o peso do vento quando escorre sobre meus om-
bros sussurra seu nome como sopro sagrado ou
canto animal atravessando meu áspero alfabeto
nutrido na harpa-útero da noite dentro de mim ao
beber o cristal celeste engolindo os raios cuspidos
contra o chão afio as unhas nas pedras que faíscam
sua gargantas oh lobo azul da cabeça de prata oh
árvore infinita que sustenta o mundo as estrelas nos
empurram pra dentro da terra pro sono profundo
da terra enquanto vaga-lumes nos guiam a noite
engolindo
floresta azul
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imaginação verbo
liberdade liberdade
tudo
entre
o texto
e o real
existe
tudo
dentro
do poema
é
vivo
e
voa
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erguer um muro entre o que existo e o que invento
pra depois demolir
imagina
cão é um cão caçando o próprio vulto
e dentro de minha cicatriz
os mortos desviam-me o olhar pois estremeço
como folha ou denso arbusto no
outono azul
com as mãos pra trás cruzadas nas costas
a sombra esconde seus tentáculos
expande limites até os grãos invisíveis do ar
colhidos pela língua
torrão energético dormente ao núcleo animal
CONTRASTE DA AMÉRICA: antologia de poesia brasileira. Organizador Djami Sezostre. São Paulo, SP: Editora Laranja Original, 2022. 189 p. ISBN 978-65-86042-40-5.
Ex. biibl. Antonio Miranda
HERÁCLITO MACHINE
(1)
curto-circuito na música que atravessa o nervos dos cervos
iluminuras gravada nas palmas das mãos
de Rimbaud
bárbaro imberbe da embainhada adaga
leia-se girassol que persegue a luz até que o pescoço
se quebre
e a carne resseque
sou um vagabundo sujo de fuligem e pés alados
sou uma tempestade perdida dentro de um missal
(2)
uma rainha vestida de trapos me olha nos olhos
e vejo o oceano que me acena
as ondas tumultuosas
e a espuma cremosa que dragou Ulisses e todo passado
mitologia de flora feita de raízes e liquens
desgrenhada cabeleira apontando pro céu
clareira inundada de insetos e animais estourados de luz
(3)
a chuva lava os cascos que crescem por dentro dos cavalos
como o sol cresce dentro da terra sua ígnea ossada
como o trigo estica as unhas e amadure seus cabelos
contra as cercas farpadas
eu vi as sombras engolirem penhascos luminosos
eu vi bocas famintas devorando os degraus dos sonhos
e cabeças comprimidas por fuzis botas e tanques
encaixotadas se expostas no museu-realidade
ao penetrar neste bosque diante de mim postado
pois é de lá que eu venho e por onde nasce o mundo
*
Página ampliada e republicada em julho de 2023
Página publicada em novembro de 2016
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