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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

http://www.epigrafias.blogspot.com.br/

MIRIAM PAGLIA COSTA 


Poeta e jornalista, nasceu em Londrina (Estado do Paraná) em 1947. Em 1969, ganhou o primeiro prémio de poesia do Festival Universitário de Londrina. Publicou poemas em jornais e revistas. Em junho de 1981, lançou a plaquette de poesia "Sete eus", edição de autor, com que participou do IV Congresso Interamericano de Escritoras (Cidade do México). É editora de Cultura da revista "Visão".
 

 

De
Miriam Paglia Costa
COLAR DE MARAVILHAS
Ilustrações de Darcy Penteado
São Paulo: Massao Ohno – Roswitha Kempf Editores
s.p.  ilus. col.  Formato 22x15 cm

 

 

I

contra sarampo é

pijama vermelho de bolinhas

chá colhido no quintal

 

meninas enjoadas saram

num zás-trás

mamando leite com hortelã

mas no colo

 

nos óculos do avô

reflexos distraem o medo

de retratos, mortos e fantasmas

 

bichos noturnos não resistem

a história bem contada

 

a mão roda a colher

roda, roda

evita derrames de fervura

três vezes na panela

e verte a massa esfumaçada

no prato sem desenho

mingau de aveia esquenta o bucho

mão de ferro não esquenta

ainda

os traseiros dos levados

nervos nem fervem nem derramam

de manha

 

olhos amorosos são remédio

e rezar o santo anjo anoitecendo

 

luz amarelenta

vela febres contra escuro

um jeito no lençol, dobra no cobertor
tudo consola
tudo são certezas

(...)

 

101 POETAS PARANAENSES (V. 1 (1844-1959)  antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI.  Seleção de Admir Demarchi.  Curitiba, PR: Biblioteca Pública do Paraná, 2014.  404 p. 15X 23 cm.  (Biblioteca Paraná)  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

DE COLAR DE MARAVILHAS

 

| VI |

 

a procissão caminha

passos, meninas do colégio

à frente, minha prima

bela e lampeira

em sua caixa de boneca

já não chora, já não diz — "Mamãe"

muda

desfila o dia de gala

seu medo passou completamente

 

vão todos sombrios

em uniforme de luto

só ela está de cor-de-rosa

fantasiada

anjo até os pés

 

minha prima vai à tumba

ela que não entrava em canto escuro

nós a seguimos entre flor e choro

porque dói

o pé no sapato de verniz

a festa interminável

 

é grande o cemitério nos confins

tristes seus pássaros de bronze

empoleirados sobre túmulos

há retratos, letras, saudades

mas a procissão avança

rápida para olhos que soletram

 

a freira manda cantar

sai trôpego o hino

tudo é lento, engasga

ninguém quer enterrar a caixa

fechada com boneca

 

pela primeira vez tocamos terra

com mãozinhas enluvadas

lançando punhados no buraco

é roxo o pó que cai

empedra o som, batendo na madeira

 

sujo inteiramente

como as luvas

um homem feio vem

chapéu de feltro velho, abas ensebadas

e com pá completa seu serviço

 

a procissão desaba nas aleias

 

dia seguinte

embaixo da limeira

uma voz de prima não brinca de carniça

não canta introito de pega-pega

— balança caixão

—balança você

— dá um tapinha na bunda e vai esconder

 

|XI|

 

ô meu deus, quero de volta

minhas colegas de escola

blusa engomada picando nó sovaco

o castigo de gala

freiras chatas, revistando tudo

e reza antes da aula

dia de ser anjo prolongado

 

ô meu deus, quero de volta

O fogo daquele inferno

com diabo de tridente

e vermelho

 

| XX |

 

a noite é quente e ruinosa

onde plantou meu avô sua barba

e sua honra

das paredes da casa

restam madeiras

eretas e modificadas

dos filhos espalham-se os destinos

 

a vizinhança já foi chácara

campo de pelada e batalhas

zona do meretrício

caminho de tropa e lama

rua asfaltada e buracos

 

já houve horta, bichos esquisitos

mortes, desespero e festas no local

não há mais espírito pioneiro

tudo se disciplina e urbaniza

 

hoje meu avô está plantado

no chão que ele desbravou

e sua semente de pobre

macaroni e aventureiro

vingou nessa terra roxa

lado de cá do Tibagi

onde continuará havendo

trabalho, desespero e festa

 

 

BAR SELETO

 

vagas mensalistas aqui estacionam

pernas rodadas, caras batidas

buscam, quem sabe?

a vitamina que devolve a juventude

 

do vento do pastel aspiram sonhos?

 

sentam moles bundas nos banquinhos

olhos soltos sobre incertos objetos

e bebem

engolem o suco de tantas frutas

como se fosse lava

engolem tudo

 

diz-que vagabundas nunca morrem

pelo menos, só vivas aparecem no jornal

diz-que também não fazem falta

trocam de peruca

engordam, emagrecem

estão sempre no lugar sabido

 

mas

na hora vaga que precede o dia

bebem vitamina e comem

como crianças

o pastel que despenca seu recheio

 

— pendura a conta, ainda gritam

os saltos gastos já batendo na calçada

baiana, luzia, inalda, roseni, palmira

elas têm pressa

 

quando amanhece

todas as putas viram fadas

 

 

AD PERPETUAM REI MEMORIAM

 

maus

versos e bons planos

faço isso há anos

é chumbo o alfabeto que aprendi

escrevo

 

tenho todos os dentes

peso até excessivo

adoeço raramente

nasci no brasil

logo, não existo

 

cólicas líricas seguidas de vómito

meu diagnóstico

 

proletária do espírito

salário não paga minha fome

 

pedem pão, dou verbo

vergonha não rima nem resolve

 

às vezes desejo o terror

ilusão do justo restaurado

mas quem garante?

 

se o tapa é a lei da mão

instaura a selva

 

eu queria ser inocente

 

 

 

 

 

Página publicada em julho de 2011; ampliada e republicada em setembro de 2011.

 


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