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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

LUIGI RICCIARDI

 

Luigi Ricciardi nasceu em Londrina (PR), em 1982. É formado em Letras e tem mestrado em Literatura na Universidade Estadual de Maringá (UEM). Atua como professor de literatura e francês. É idealizador do projeto “Mutirão Artístico” e da revista literária Pluriversos. É autor de dois livros de contos, Anacronismo moderno (2011) e Notícias do submundo (2014). O seu romance Aquilo que não cabe, ainda inédito, esteve entre os finalistas do Prêmio SESC de Literatura 2013/2014. Vive em Maringá (PR).

 

 

101 POETAS PARANAENSES (V. 2  (1959-1993)  antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI.  Seleção de Ademir Demarchi.  Curitiba, PR: Biblioteca Pública do Paraná, 2014.  398 p. 15X 23 cm.  (Biblioteca Paraná)

 

SAMBA DE AUSÊNCIAS

 

Só por hoje vou deixar você partir Sem escândalos

Hoje deixo você levar todas as minhas coisas

Aquela camiseta dos Beatles

Um dos livros do Kerouac

Meu caderno de poesias anotadas

Só por hoje ou eternamente

Sentarei sem peso naquela mesa

Sorvendo meu café cheirando à insanidade

A insanidade de partilhar a cama com você

Não conversaremos como de costume

E eu ficarei sereno ao ver você sair

Deixando suas chaves sobre a mesa

Hoje eu posso ficar inteiro

Sem nenhuma peça faltando

Leve aquele vestido vermelho com você

Aquele que você deixa sempre no sofá

Quando eu te chamo com os olhos

Antes do samba que sempre nos entoa

Só por hoje solto o vínculo de meu vício

Vá, sim, e leve meus fios de cabelo

Que se desprendem no teu pescoço

Já roxo de minha demência

Vá, pois o mundo é de mortes

E a fatalidade é o que nos rege

E o seu entendimento

E a maior das maturidades

Mas pretendi levar a vida a sorrir

Emaranhando ficção e realidade

Assim te envio sem selo

Desprende-te do cais do teu vício

Só por hoje, amanhã já não posso prever

Mas, antes de ires, roube-me um beijo

Como roubaste minha dignidade

Vá ao samba no domingo e escute as línguas

Perca um pouco da tua vida nas esquinas

Suba no morro, no desterro pontiagudo

E perguntes por mim

Talvez esteja mais presente nos relatos

Do que aqui, depois do gozo

Finja que é alguém que vai feliz e não se importa

Faça como eu nesse meu falso descaso

Tentando se redimir por não sermos capazes

De nos amarmos mais do que nossos egos

Viva a falsidade de um amor

Do qual todos temos direito

Nessa falsa ordem de perfeição

Volte se quiser algum dia

Dê três batidas na porta e entre

Sente no sofá e prepare uma bebida

Contando-me sobre bocas que te sugaram

E sobre as toras que te permearam

E te contarei os púbicos que beijei

E orelhas que abocanhei

Traga-me uma rosa para companhia

Assim terei com quem conversar na solidão

Na tagarelice de sua mudez imutável

Arraste alguns centímetros para o lado

A alça do teu sutiã e verás minha loucura

De te recusar poeticamente te aceitando

Trago-te os pomos, engula-me os músculos

Soletre-me sinestesicamente

Tocando penugens, púbis, morando-nos dentro

E na vulvecência juvenil orgasma-me perene

E não te vá embora antes de me deixar lembrança

Pois algo se leva de cada encontro

Deixa-me um pacote de cinismo

Colocá-lo-ei na dispensa

E dele me servirei cada vez que olhar tua foto

Herdarei o teu olhar cínico

Quando ler os versos que me escreveste

E me lembrarei desse peito vazio

Que se preenchia de minhas salivas

Que se enchia da volúpia de meu cetro

Antes da murchidão natural

E da incompreensão eterna entre fumaças de cigarro

E do olhar longínquo pelas janelas da mente

E do fitar no teto vazio de nós mesmos

Para hoje e sempre

Dê-mo-nos essa insensata lascívia

Dê-mo-nos a desfaçatez que nos une.

 

 

CARTA PARA QUEM QUISER LER

 

Agora fui normalizado Entrei nas regras

Comprarei um carro do qual eu não preciso

Trocarei de modelo e marca a cada dois ou três anos

Farei horas extras pra acumular um pouco mais de dinheiro

E dar entrada na casa que todo mundo sonha

Vou ver os amigos morrendo e um dia também morrerei

Mas antes farei algumas coisas

Típicas àquelas que todas as pessoas fazem

Porque simplesmente se deve fazer

Não, não farei isso, recusarei o que você me fez

Foi você que me normalizou.

Enquanto você não me aceitava

Enquanto você criticava esse meu jeito asséptico

Essa minha falta de interesse no mundo

Essa verruga que eu criei dentro de mim

Esse desalinho com o estabelecido

Essa desmentira que me desconstrói

Esse catarro que me grita pandemonicamente claro

Essa febre desmedida, sim

Enquanto eu era esse livro despaginado

Era você que me enfrentava,

E era você que me dizia que eu estava errado

E eu me afirmando no seu aborrecimento

Eu me era, porque no contrário era que eu me fazia

Você não devia ter me aceitado, ter me simplificado

          Eu me fazia na diferença, no avesso, no vazio

No polo, na descrença, no negrume.

 

Agora sou claro pra você, agora você me entende

Você me estende a mão, você diz que compreende as dores

do outro

Você me joga um feixe de luz e me acorda de um sonho melhor

Você me traz ao comezinho.

Agora eu fico enjaulado, sou zoologizado.

Vá e me deixe de lado

Quero ver aquele absurdo que acontece na esquina

Sob um anúncio brilhante e cegueta.

Quero morder minha língua e sentir o sangue escorrendo pelo corpo.

Quero pegar minha bebida quente sob o balcão

Acordar com ressaca dois dias depois.

Eu quero o mundo pegando fogo, numa autodestruição

demoníaca.

Os buracos destruindo as calçadas

As fissuras engolindo a miséria da alma, triturando paredes

Porque infinitamente sou aquele berro inaudível

Que se avalancha sob os tetos desprotegidos

Recolhendo as histórias mais absurdas

Suprimindo as salas acarpetadas

Entenda, querida, nesse meu coração violáceo

Eu perdoei tudo e a todos

Mas não vou impedir a catástrofe

Seria uma forma de autoperdão, e isso eu não posso fazer

Eu sou um luto pronto

E é por isso que levo as minhas coisas

Pode ficar, eu já paguei o aluguel (...)

 

 

 

Página publicada em maio de 2016


 

 

 
 
 
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