Fonte: www.escritorassuicidas.com.br/
JUSSARA SALAZAR
Nasceu em Pernambuco, em 1959. Vive em Curitiba desde 1985. E artista plástica, com várias exposições realizadas pelo país. Como poeta, tem produzido livros-objeto em seu estúdio, edições artesanais com pequenas tiragens assinadas, entre os quais Navíovo - Uma epopeia moderna ou A história moderninha da viagem da estrela pelas dobras do tempo; Plânctum; Inscritos da casa de Alice; Canónicas; e Jardim dos Retratos, entre outros. Tem poemas publicados na revista Medusa e em sites como o do Memorial da América Latina, no qual há também entrevista (www.memorial.org.com.br). Foi incluída na antologia "Pindorama - 30 poetas de Brasil", organizada por Reynaldo Jiménez para a revista Tsé—Tsé de n.° 7/8 (Buenos Aires, outono/2000).
TEXTOS EM PORTUGUÊS Y EN ESPAÑOL (ver também)
Plegária
Verde, âmbar as
pedras,
e as violetas rosadas –
eternas e o humo que
cobria o chão negro
como a noite, e quisera
falar-lhe em seu idioma
antigo
e recordar os lobos
correndo ao redor da
casa e a hera selvagem
cobrindo os vestidos e
os animais, pequenos,
nos bordados coloridos e
ramitos a entreabrir-se
brancos e escuros, cristal
de la luna ao reflexo
como a aparição das
lebres e das ovelhas
correndo os campos sob
as nuvens e a subterra
profunda do horto na
pele do ar em minutos
precisos, envolvendo o
tempo quando vi morrer
o sol, e o vento girando,
soprando mirações da
cor da água, nas rosas e
nos insetos. Quisera falar
seu idioma antigo e
guardar-lhe nas luzitas
do espelho como os
cravos também tão
antigos sobre a toalha
branca, e uma lua de
seda derrama um rosário
de ouro mais os rumores
de um sonho, quisera.
Poemas extraídos de PASSAGENS. Antologia de poetas contemporâneos do Paraná. Seleção e apresentação de Ademir Demarchi. Curitiba: Imprensa Oficial do Paraná, 202. 428 p. (Col. Brasil Diferente)
Os anões
como quasímodos quase
gentes ao espelho ao cada um
nalgum do canto em torno de
um cá a casa das rosas na casa
dos sonhos diminutos duo
entes que entrepasseiam tour
o tempo pelo tempo giram
suas vestes vozes de veludo
pia-máter vez do zero ser do ater
liliput pôs se então do sol
ao plexus.
Alice nos vê por
detrás da vidraça
por detrás do logos olho
me o sempre vemos uma alice agora
grã e seu vestido muito
clara
seus os olhos no bordado
peaux a pele vai alice
vítrea
aos rosados animais e ao relevo
rumo saltitante se da rapidez a
razia invisível lava na pureza
a reza no vermelho no espelho
sem alguma quase elipse há
um quase instar um quase amor
pontos-cruz saltam à glosa
o feltro sobre os cabelos portanto
laços flutuando na água.
Águas de luz
o ar em ondas agita a cambraia leve
lúnulas de sol e a luz
no desvio de suas águas
trama ecos de si e derrama
corpúsculos que submergem
ao fundo do lago e a hera amorosa
navega, enlaça o espelho do rio
e seus delfins
romãs entre os cordeiros em brancas
as raízes enroscam se pela pele
e pêlos de alice.
(O mapa)
a palavra água molha
o verso e beija
e seus olhos atrás do meu
olhar quando o silêncio
atravessa a noite:
o território líquido
das distâncias sem dor
(De Inscritos da casa de Alice)
SALAZAR, Jussara. Carpideiras. Rio de Janeiro: 7Letras, 2011. 106 p. 14x21 cm. Foto da capa: João Urban. ISBN 978-85-7577-828-9 Col. A.M.
VI
Coro de Bonecas:
A velha galinha faz gorda a cozinha!
Canta espreita o gavião
Alma, tu quem serás?
Alma, tu de onde virás?
Cordeiro na noite ao chão
No brejo ou jardim estará?
Virá da mata ou confins?
Só o tempo é que dirá
Se virá iluminando
Ou na brasa vem pisando
Cantarei até o fim
XII
Coro de Anjos:
Quem quer ver a barcarola
Que vai se deitar aã mar
Nossa Senhora vai nela
Vão os anjos a remar
Nau em flor de laranjeira
São Miguel há de escutar
Sua camisola e madeixas
Hei-de vê-las flutuar
Nas manhãs que essa fada
Moura fidalga ordenar
SALAZAR, Jussara. Natália. Curitiba, PR: Travessa dos Editores, 2004. 130 p. 16x21 cm. ISBN 85-89485-15-3 “ Jussara Salazar “ Ex. bibl. Antonio Miranda
CÔNCAVO-OLIPANTE
Para Fábio Campana
Conheceu da dor o amor provou poliu
o ouro-templo como deflagrasse
à mancheia o texto
subiu desceu talismã nas palavras
ágape-casca-mandrágora
fosse criança que cítara à glosa galáctica
ou tauto-deusa desenrolando tânatos na noite tânagra flabelo no
sopro
ofício
apocalipsa a terra redonda
afia afio na desmesura solidão que corta
água pingando
escorre disforme no corpo e sela
lauda me livra-nos dessa aurora pedra
da peste
olho do caos do cão flor da infinita escuridão.
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TEXTOS EM PORTUGUÊS Y EN ESPAÑOL
JUSSARA SALAZAR
Jussara Salazar nació en Pernambuco en 1959. Vive en Curitiba. Poeta y artista plástica, realiza exposiciones de sus esculturas y objetos, y produjo artesanalmente libros-objeto de pequeñas tiradas: Plánctum, Solbelo Lunar da Noite, Vinte-Poemas de bolso, Marca D’Agua, Naviovo y Da Fábula das Coisas «son algunos de ellos». Su última publicación es inscritos da Casa de Alice (1999).
Estraídos da revista TSÉ=TSÉ n. 7/8 Otoño 2000. Buenos Aires Argentina.
Tradução de R. J., revisados por J. S.
A hora dos insetos
Noite alta aromam raízes
circundam as asas vítreas
e arvorezinhas deslizam nos dedos;
leve o tigre aura em halos que o sol
noturno das pedras silenciosas
guarda qual corpo – e oráculo –
feito a ânsia d’água-mãe.
lapso de líquidos o silêncio a boca da casa
e os fragmentos de um jaspe
ugazes lavam
seu suave canto.
La hora de los insectos
noche alta aroman raíces
circundan las alas vítreas
y arbolitos deslizan los dedo;
leve el tigre aura en halos que el sol
nocturno de las piedras silenciosas
guarda cual cuerpo – y iráculo –
hecho el ânsia de aguamadre.
Lapso de líquidos el silencio la boca de casa
y los fragmentos de un jaspe
fugaces lavan
su suave canto.
O retorno da noite
o eu entardece curvo
deita se fragmentário azul em
cânticos desmancha se
o nada em
grafia nebular encobre
l e v e s r e f r a ç õ e s ;
partículas à espera de
um quase instar intactas
diorama acende se em anseios
pelo que virá.
El retorno de la noche
el yo atardece curvo
se deja fragmentario azul en
cânticos se desmancha
la nada en
grafia nebular encubre
l e v e s r e f r a c c i o n e s ;
partículas a la espera de
un casi instar intactas
diorama se eleva en ânsias
por lo que vendrá.
Dia de dança
signo escrito (órgão) criva
o verbo insuflando os pássaros
em nascentes qual geometria
marca o mapa um incunábulo
que estrela ar de um ouro outro
a margem de um adágio :
a hora do exato em flecha acerta
dígito o alvo em um curvo quase.
Día de danza
signo escrito (órgano) acribilla
el verbo insuflando los pájaros
en nacientes cual geometria
marca el mapa un incunable
que estrella aire de un oro outro
al margen de un adagio :
la hora de lo exacto en flecha acierta
dígito el Blanco en un curvo casi.
S o b r e u m a v i a g e m
a o i n t e r i o r d o e s p e l h o
“Três quarks para Muster Mark”
(James Joyce)
o tempo ronda as
runas sob a sombra
à copa de minúsculas árvores
sobre à mesa ao fim da tarde
pela superfície convexa
que adentra
o espelho verte-se noite
ao fluxo profundo
acendem-se
uns pequenos pontos
de luz em refrações
que a chuva derrama
o u n i v e r s o
passeia o negro veludo da mente.
(na água pequenas flutuações de densidade
curva e o azul no reflexo dos raios gama)
(Para Stephen Hawking)
Sobre un viaje
al interior del espejo
el tiempo ronda las
runas bajo la sombra
copa de minúsculos árboles
sobre la mesa al fin de la tarde
por la superfície convexa
que adentra
el espejo se vierte noche
al profundo flujo
se elevan
unos pequeños puntos
de luz en refracciones
que la lluvia derrama
el universo
passea la negra mata de la mente.
(en el agua pequeñas fluctuaciones de densidad
curva y el azul en el reflejo de los rayos gama)
II BIENAL INTERNACIONAL DE POESIA DE BRASÍLIA – Poemário. Org. Menezes y Morais. Brasília: Biblioteca Nacional de Brasília, 2011. s.p. Ex. único.
Cabe ressaltar: a II BIP – Bienal Internacional de Poesia era para ter sido celebrada para comemorar o cinquentenário de Brasília, mas Governo do Distrito Federal impediu a sua realização. Mas decidimos divulgar os textos pela internet.
FalbaláS
(Brevíssima taxinomia dos sentidos e movimentos)
Sedosos
Asas de insetos multiplicam se fólios assim macios e há uma princesa cujas saias acetinadas brilham no escuro aveludado da noite. Alguns cipós da hileia ao tocarem quem neles esbarra entre os igarapés trazem à memória dessa matéria suave produzindo encantadora sensação de alegria. Contam sobre as folhas de um exemplar do livro dos anjos que possui tão grande delicadeza que ao seu toque suas folhas agitam-se à mínima respiração do leitor. Pétalas de flores e os passos de certo monge nas pedras frias da montanha também fazem parte dos sedosos.
Alados
As asas dos anjos quando alçam voo produzem pequenos ruídos farfalham desdobram o vento ainda mais se é brisa marinha e alguns peixes escamados deslizam em voo aquático dançarino produzindo linhas múltiplas na superfície espelhada da água. Partículas de pó invisíveis também pertencem aos alados, às vezes provocando espirros em quem muito se aproxima delas. Fadas luminosas, roupas nos varais e cortinas acendem o espírito em meio aos sonhos dessa espécie sendo Ícaro também um alado. Ya-wará felis quando salta desenha no ar a vontade de deus em sua infinita sensualidade solar.
Açucarados
Segundo sabe-se são originários da Arábia e desmancham na água de modo adocicado. Os folhados são os primeiros desse gênero e podem ter muitíssimas camadas como lâminas delicadas e deleitosas podendo chamar-se também apfelstrudels quando elaborados com a fruta do paraíso. Alguns frutos também possuem inúmeras camadas que ao se abrirem exalam um perfume característico e o único inconveniente é atrair assim formigas selvagens.
sonoros
O corpo dos sonoros é difícil de ser avistado, são gordos leves ao mesmo tempo podendo em poucos segundos propagar-se ao ar vibrante por infindas camadas atravessando paredes. O fogo quando incendeia o mato com suas muitas línguas de calor desdobra sonoritats inconfundíveis forrando um imenso tapete de cinzas silenciosas assim como os pianos se desdobram por oitenta e oito fólios como os dentes de uma grande boca.
Às vezes a chuva derrama um som melancólico em seus véus translúcidos sendo como a flor do maracujá muito eficaz para embalar o sono.
milagrosos
Dobras e sinuosidades movimentam-se em torno dos mantos milagreiros e Verônica dobrou 1330 vezes o sudário em fólios misteriosos e secretos. Até hoje ninguém conseguiu decifrar os códices dessa mortalha sagrada. A massa da obreia faz a hóstia se multiplicar infinitamente na alma dos cristãos sendo assim um falbalá de natureza panis sacratíssimo. Algumas auras sanctu-santíssimas são avistadas às vezes pairando múltiplas pelo ar ou
na Pedra de Ara o altar das relíquias de santos, especialmente os mártires.
ondulados
As cachoeiras são os fólios aquáticos mais belos que existem assim como a superfície do rio quando embala folhas nômades que se atiram dos galhos vendo-o passar. Dizem que os espelhos possuem o mais perfeito sistema de multiplicação desdobrando o mundo até o âmago mais profundo com seu olho mágico. Muitos objetos perderam-se dentro desses cortinados misteriosos e Borges afirma que os espelhos escondem antigos mundos soterrados em suas ondulações. O espanhol Salvador Dalí possuía uma invejável coleção de ondulados.
Vegetais
Dão-se ao vento tempestades e dobram se folhas infinitas e variadas sobre a esfera terrestre. Nesse gênero incluem-se também as hortaliças como alface repolho e acelga ou as flores com seus desdobramentos pétalas alcachofras. Os vegetais marinhos quando vêem à superfície flutuam podendo atravessar oceanos inteiros; são profundamente místicos creem em um deus que os criou para alimentar o corpo e o espírito dos homens. Algumas pessoas relatam experiências verbais com esses falbalás.
perspicazes
As tesouras quando abrem suas 2 lâminas em cruz são afiadas e cortantes podendo dividir opiniões e superfícies assim como os punhais, facas e navalhas são os perspicazes mais fatais; o mundo pode ser retalhado em pedacinhos inúmeros. Os espadachins desde o tempo mais antigo são conhecidos pelo bem saber sobre o manejo dos perspicazes com destreza e habilidade e os olhos humanos também classificam-se nesses fólios ágeis. As alacrãs, essas amam a aridez e a astúcia e orgulham-se de seus aguilhões sendo a oitava constelação do Zodíaco situada no hemisfério sul, a 16h30min de ascensão reta e 30° de declinação sul nas infinitas esferas celestiais.
Página publicada em fevereiro de 2009; ampliada e republicada em abril de 2010; amplida em julho de 2012; ampliada e republicada em março de 2015. Ampliada e republicada em abril de 2019.
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