Foto de Francisco FariaFonte: /www.revistazunai.com.br/
JOSELY VIANNA BAPTISTA
Josely Maria Biscaia Vianna Baptista nasceu em Curitiba em 1957. Formada em Letras Hispânicas, com especialização em Semiótica, traduziu Cortázar, Carpientier, Cabrera Infante, Mutis, Goytisolo, a antologia de poesia neobarroca cubana e rioplantense Caribe Transplatino (Iluminuras) e o Paradiso de Lezama Lima, entre outros.
Publicou os livros de poesia Ar (1991), Corpografia (1992) e Outro (em co-autoria com Arnaldo Antunes, no álbum de arte homônimo de Maria Angela Biscaia, 2001).
Veja também: POESIA VISUAL DE JOSELY VIANNA BAPTISTA
TEXTO EN ESPAÑOL (ver)
See also TEXT IN ENGLISH e EM PORTUGUÊS
RIVUS
A água mede o tempo em reflexos vítreos. Mudez
de clepsidras, no sobrecéu ascendem (como anjos suspensos
numa casa barroca), e em presença de ausências o tempo
se distende. Uns seios de perfil, sono embalando
a rede, campânula encurvada pelas águas da chuva.
No horizonte invisível, dobras de anamorfoses;
sombras que se insinuam, a matéria mental.
RESTIS
Um vento anima os panos e as cortinas oscilam,
fronhas de linho (sono) áspero quebradiço; o sol passeia
a casa (o rosto adormecido), e em velatura a luz
vai desenhando as coisas: tranças brancas no espelho,
relógios deslustrados, cascas apodrecendo em seus volteios
curvos, vidros ao rés do chão reverberando, réstias.
Filamentos dourados unem o alto e o baixo
– horizonte invisível, abraço em leito alvo:
velame de outros corpos na memória amorosa.
De
AR
São Paulo: Iluminuras;
Fundação Cultural de Curitiba, 1991.
n a m a d r
u g a d a a
g u d a q u
a l a d a g
a a á g u
a p i n g a
d e s t r a v a r a l í n g
u a d o t r a v o d u m
a f r u t a á c i d a :
á r i d a d a r i a d i a
m e n t e : c a n t á r i d a
III
a m o r a m a s o m b r a n a
m o r a d a d o i p ê p é t a
l a s t e m p o r ã s , e e u
t e b e i j o e n q u a n t o
f i g o s c a e m d o c é u
c o m o c o m e t a s
R E F R A C T A
para vera e Milton
o segredo
do
a b r a ç o
e s t á
n a
g r aç a
d e
q u e m
f a z
o
a g r a d o
—
á g u a
r e c o r t a n d o
o n a d o
d e
u m
p e i x e
s e m
d e i x ar
r a s t r o
para leminsky
junho 1989
penso e surpreendo dentro
esse peso suspenso
entre fuga e allegro
entre risos e abismo
resgato fragmentos
e vestígios do vértigo
(espreito, rima leonina,
as naus, bits e ítacas
de tuas russas cismas,
as lengua-lengas feras
de teus trobares raros)
entre sóis e êsseoésses
miro etrelas-desastres
e desorientes ferozes
rumo ao ouro quase-Órion
de um perhappiness
entre o novo e o velho
só vejo o vero fogo
que te tornou eterno
só vestígios do vétigo
desde que o caos
deixou de ser acaso
OS POROS FLÓRIDOS
I
Entre a lisura vã das dunas movediças,
ou entre a sombra lassa – zefir brônzeo –
que o sol alonga em ondas nas planícies de ônix.
Em raras simetrias, nos losangos
laranja que se enlevam, volúveis, aos desejos
do vento. Sob a cambraia opaca das imagens,
entre eloendros, febres, entre dentros.
Torrentes de rápidos
sobre pedras lisas, sobre pedras ásperas,
sobre pedras ríspidas, sobre pedras límpidas.
Tudo é igual e diferente de si mesmo.
Leitos de rios secos, securas de estrume,
restos de sementes, relevos do vento.
Arboresce selvagem entre os dendritos
-marca d’água na rocha, um grafito
hiperbóreo-, lascando-as (paliçadas)
em florestas de pedra. Inflorescendo,
fosco, em negrume de eclipse.
Troncos acarvoados que dormem
sob o solo.
Lascas de pedra fraturada
- solo branco de rastros,
nenhum sinal de passos.
Sol e lua incessantes
- pedra, fratura, estilhaço -
quase consomem os ossos dos bichos mortos.
Esculturas de cal, gesso moldado,
são os textos em branco desse espaço.
Sonhos que esquecemos noutros claros
fragmentos de textos insulados.
ou num poema náufrago, enleado,
caligrama salgado de sargaços
jogando entre as marés.
Entre os dedos lenhosos de teus pés,
em meio aos caules lisos, retorcidos
cordames de um barco abandonado
às tempestades de sol e sal.
Em chuvas de alfabetos secretos
-a curva de n num graveto, o volteio
do u num pedrusco-, ou num estudo
de Long para tubos de órgão: tocos negros,
pontudos, embarcadouro tosco.
E na serpente de seixos alinhados
que se pensam
mesmo sem que a luz brilhe sobre eles,
e se pensam pelos dedos
voltados sobre eles
como flores secas
que se abraçam a si mesmas
em raras tranças castanho-
quebradiço que a aragem
esgarça.
flor coral do cáctus
plástico sobre a areia,
a tulipa calcária
no púrpura da concha:
surpresa de si mesma
a cor se reverbera,
e num vermelho de lacre (hermafrodito
sobre a lava negra)
mimetiza o milagre.
No invisível de olhos
que se fecham em silêncio
Como dedos sobre pedras,
como se quisessem desenhá-las.
Nas coisas que se pensam
mesmo sem que a luz
brilhe sobre elas.
(Folha seca, leonina,
pétala rubra, folha fulva, opaline,
pétala crespa: veludo vermelho-bispo
perdido entre a educação dos cinco sentidos
ou fragmento de flor que o ar
transformou em ânimos de cor?)
Num rosto de paisagem que se devasta
ao tempo, esse tempo que em acenos
consome o que se anima ao sol, e
no desejo de um anjo adolescente.
Planície de seixos onde o vento esculpe,
lentamente, a paisagem de um rosto.
Rente à delicadeza das plantas,
e em seu retorcimento de securas.
Nas letras desmaiadas
das cartas nunca lidas, na goma opalescente
das pétalas ressecas, entre
a zarabatana aérea das sementes.
Você me diz:
o mar parece ver-te
ouro na praia (meias-luas
a sombras das folhas
sob o eclipse).
A imagem reinventa
em teu rosto a paisagem.
Entre os corpos
brancos do sal evaporado
a febre porejando
seus anéis de serpente.
Respira em fissuras, sob o vento
nordeste, em escamas transparentes
(as órbitas vazias) misturadas à areia
de um peix em agonia. No outro eu
que é teu (imagem sobre imagem),
poesia sem enigma, lucidez sob a luz,
De superfícies as nuvens sem céu.
e se esquece entre as pedras,
solitário,
como os pássaros suicidas dos desertos.
III
Fim de tarde, as sombras suam
sua tintura sobre as cores, extraem
da fava rara da luz o contorno das coisas,
as rugas na concha de um molusco,
grafismos, vieiras milenares com reservas
de sal, poema estranho trançado
em esgarços de oleandros,
enquanto corpos
mergulham em câmara lenta,
e nada é imagem
(teu corpo branco em mar de sargaços),
nada é miragem
na tela rútila das pálpebras.
As sombras suam, ressumbram,
e essa é a sombra mais certa das sombras
calcinadas que me cercam.
Quero levá-la no corpo,
como um amor, como inscrição rupestre
no granito, como o verso
que um tuaregue cola ao corpo.
Quero levá-la no corpo,
como um amor, como inscrição rupestre
no granito, como o verso
que um tuaregue cola ao corpo.
Quero levá-la comigo, como um amor,
como essa ausência azul que assombra
a noite e sonha o contorno de um rosto
no escuro, como se quisesse desenhá-lo.
Nenhum lugar. lugar algum perdura.
Um ventre a sombra alisa, um plano
o sol levanta, cumes que o vento
plissa. Sol branco, sol negro, o vento
apaga os rastros da areia, apaga
os passos da língua. E o sol
a pino assola, o frio da lua cresta
a pele que se solta,
o suor do corpo em febre
que se solta, e as peles são silêncios,
poemas que se deixam,
e o lugar é aqui, e lá, e ontem,
e as letras voam, revoam,
espreitam como cobras sob a areia
(camaleões se escondendo em si mesmos),
espiam as peles que se espalham, página
ou pálea, corpo que se desveste, desmente,
desvaira: tudo é miragem.
Um som de antigas águas apagadas.
É miragem a rima, a fábula do nada,
as falhas dessa fala em desgeografia,
a fala hermafrodita, imantação de astilhas,
a voz na transparência, edifícios de areia.
Mas teu olhar o mesmo, em íris-diafragma,
fotogramas a menos na edição do livro,
e o enredo sonho e sol, delírios insulares,
teu olhar transparente, a imagem
margem d’água, e as fábulas da fala,
as falhas desse nada – superfície de alvura
ou árida escritura.
Na moldura de página,
marginalia de escarpas.
VI
A luz seja de zênite, ou sombra amazônica,
o corpo (espessura) estar além do corpo,
e estar também em si, como a cor em si mesma.
Vislumbra a lucidez, feliz, suas ausências,
e os inversos se unem, as raias se rasuram
à vária, e nunca igual, magnífica maniera:
imanta ao visível a matéria invisível,
infólios incorpóreos desfolhados por cegos
(e o suor nos poros,
ásperos).
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FANTASMA CIVIL. XX Bienal Internacional de Curitiba 2013. Organização Ricardo Corona. Curitiba, PR: Fundação Cultural de Curitiba, 2013. 43 cartões com imagens aéreas de Curitiba e, no reverso, versos de poetas paranaenses. Projeto gráfico Medusa. Obra inconsútil. ISBN 978-85-64029-08-8 Inclui os poetas: Josely Vianna Batista, Lindsey R. Lagni, Ademir Demarchi, Luci Collin, Fernando José Karl, Roberto Prado, Sabrina Lopes, Bruno Costa, Amarildo Anzolin, Carlos Careqa, Roosevelt Rocha, Camila Vardarac, Marcelo Sandmann, Vanessa C. Rodrigues, Anisio Homem, lGreta Benitez, Ivan Justen Santana, Mario Domingues, Marcos Prado, Bianca Lafroy, Estrela Ruiz Leminski, Sérgio Viralobos, Alexandre França, Helena Kolody, Wilson Bueno, Paulo Leminski, Alice Ruiz, Zeca Corrêa Leite, Édson De Vulcanis, Afonso José Afonso, Homero Gomes, Leonardo Glück, Hamilton Faria, Emerson Pereti, Andréia Carvalho, Ricardo Pedrosa Alves, Priscila Merizzio, Marcelo De Angelis, Adalberto Müller, Cristiane Bouger.
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BRIC A BRAC - Brasília, DF: L3/J Empreendimentos Culturais Ltda, s.d. Editores: Luis Turiba, Luis Eduardo Resende (Resa). Lucia Miranda Leão, João dos Reis Borges. Capa: Resa Celaví. 96 p. ilus. Col. 23 x 31 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
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JOSELY VIANNA BAPTISTA
TEXTO EN ESPAÑOL
Josely Vianna Baptista nació en Curitiba en 1957. Sus libros de poesía: Ar (1991), Corpografia – autópsia poética das passagens (1992) y el inédito Os poros Flóridos, estos dos últimos en colaboracíon con el artista visual Francisco Faria. Tradujo a Lezama, Borges, Carpentier, Perlongher, etc. Ideó la colección Cadernos da Ameríndia – poesia e mito Mbyá-Guarani/Nivacle (3 vols., 1996). También con Francisco Faria publica periódicamente Musa paradisíaca, página de cultura con temas relacionados a las três Américas, en periódicos de Panamá y Santa Catarina. Entre sus vários proyectos actuales, prepara na antologia de poetas cubanos contemporâneos junto con José Kozer [Traducciones de R.J., excepto el canto III de «Os poros flóridos» (por Roberto Echavarren), revisadas por J.V.B.]
Extraídos da revista TSÉ=TSÉ n. 7/8 Otoño 2000, Buenos Aires, Argentina
LOS POROS FLORIDOS
I
Entre la lisura vana de las duna movedizas,
o entre la sombra laxa – cefir brónceo –
que el sol alarga en ondas en las planícies de ónix.
En raras simetrias, en los losanges
naranja que se elevan, volubles, a los deseos
del viento.
Banjo la gasa opaca de las imágenes,
entre oleandros, fiebres, entre dentros.
Torrentes de rápidos
sobre piedras lisas, sobre piedras ásperas,
sobre piedras ríspidas, sobre piedras límpidas.
Todo es igual y diferente de sí mismo.
Lechos de ríos secos, sequedades de estiércol,
restos de simientes, relieves del viento.
Arboresce solvaje entre los dendritos
-marca de agua en la roca, un grafito
hiperbóreo , - lascándolas (palizadas)
en florestas de piedra. Infloresciendo,
fosco, en negrura de eclipse.
Troncos acarbonados que duermen
bajo el suelo.
Lascas de piedra fracturada
- sólo blanco de rastros,
ninguna señal de pasos
sol y luna incesantes
-piedra, fractura, astillazo –
casi consumen los huesos de los bichos muertos.
Esculturas de cal, yeso moldeado,
son los textos en blanco de ese espacio.
Sueños que olvidamos en otros claros
fragmentos de textos aislados.
o en un poema náufrago, enlazado,
caligrama salado de sargazos
jugando entre las mareas.
Entre los dedos leñosos de tus pies,
en medio de los troncos lisos, retorcidos
cordajes de un barco abandonado
a las tempestades de sol y sal
En lluvias de alfabetos secretos
-la curva de n en una astila, o volteo
de u en un pedrusco-, o en un estudio
de Long para tubos de órgano: tocones negros,
pontudos, embarcadero tosco.
Y en la serpiente de guijarros alineados
que se piensan
aun sin que la luz brille sobre ellos,
y se piensan por los dedos
vueltos sobre ellos
como flores secas
que se abrazan a si mismas
en raras trenzas castaño –
quebradizo que la brisa
hace perder.
La flor coral del cactus
plástico sobre la arena,
el tulipán calcáreo
en el púpura de la concha:
sorpresa de si mismo
el color se reverbera.
y en un rojo de lacre
(hermafrodita –
sobre la lava negra)
mimetiza el milagro.
En lo invisible de ojos
que se cierran en silencio
como dedos sobre piedras,
como si quisiesen dibujarlas.
En las casas que se piensan
aun sin que la luz
brille sobre ellas.
(¿Hoja seca, leonina, pétalo rubro, hoja rubia, opalina,
pétalo crespo: terciopelo rojo-obispo
perdido entre la educación de los cinco sentidos
o fragmento de flor que el aire
transformó en ânimos de color?)
En un rostro de paisaje que se devasta
al tiempo, esse tiempo que en señas
consume lo que se anima al sol, y
en el deseo de un ángel adolescente.
Planicie de guijarros donde el viento esculpe,
lentamente, el paisaje de un rostro.
Al ras de la delicadeza de las plantas,
y en su retorcimiento de sequedades.
En las letras desmayadas
de las cartas nunca leídas,
en la goma opalescente
de los pétalos resecos, entre
la cerbatana aérea de las simientes.
Tú me dices:
el mar parece vertir
oro en la playa
(medialunas
las sombras de las olas
bajo el eclipse.
La imagen reinventa
en tu rostro el paisaje.
Entre los cuerpos
blancos de la sal evaporada
la fiebre resumando
sus anillos de serpiente.
Respira en fisuras, bajo el viento
nordeste, en escamas transparentes
(las órbitas vacías). mezcladas a la arena
de un peje en agonía.En el otro yo
que eres tú (imagen sobre imagen),
poesía sin enigma,lucidez bajo la luz,
De superfícies las nubes sin cielo.
e se pierde entre las piedras,
solitario,
como los pájaros suicidas de los desiertos.
III
Fin de tarde, las sombras sudan
su tintura sobre los colores, extraen
del raro grano de la luz el congorno de las cosas.
las arrugas en la concha del molusco,
grafismos, valvas milenárias con reservas
de sal, poema extraño trenzado
en escarzos de oleandros,
mientras los cuerpos
se arrastran en cámara lenta,
y nada es imagen
(tu cuerpo blanco en mar de sargazos),
nada espejismo,
en la tela rutila de las pálpebras.
Las sombras sudan, trasudan,
y ésa es la sombra más cierta
de las sombras calcinadas que me cercan.
Quiero que tome mi cuerpo
como un amor, como inscripción rupestre
en el granito, como el verso
que un tuareg pega al cuerpo.
Quiero llevarla conmigo, como un amor,
como esa ausencia azul que asombra
la noche y sueña el contorno de un rostro
en el oscuro, como si qusiese diseñarlo.
Ningún lugar. Lugar alguno perdura.
Un vientre la sombra alisa, un plano
el sol levanta, cumbres que el viento
apaga los rastros en la arena, apaga
los pasos de la lengua. Y el sol
asola a punto, el frío de la luna abrasa
la piel que se desprende,
el sudor del cuerpo en fiebre
que se suelta, y las pieles son silêncios,
poemas que se dejan,
y el lugar es aqui, y allí , y ayer\
y las letras vuelan, revuelan,
acechan como cobras en la arena
(camaleones escondiéndose en sí mismos),
espían las pieles que se extienden, página
a pálea, cuerpo que se desviste, desmiente,
desvaría: todo es espejismo.
Un son de antiguas aguas apagadas.
Espejismo la rima, fábula de la nada,
las fallas de ese habla en desgeografía,
el habla hermafrodita, imantación de astillas,
la voz en transparencia, edifícios de arena.
Pero tu mirar el mismo, en iris-diafragma,
fotogramas de menos en la edición del libro,
y el enredo sueño y sol, delírios insulares,
tu mirar transparente, la imagen
margen de agua, y las fabulas del habla,
las fallas de esa nada – superfície de albura
o árida escritura.
En la moldura de la página
marginalia de escarpas.
VI
La luz sea de cenit, o sombra amazónica,
el cuerpo (espesura) este más allá del cuerpo,
y este también en sí, como el color en sí mismo.
Vislumbra la lucidez, feliz, sus ausencias.
y los inversos se unen, las rayas se borran
a la varia, y nunca igual, magniífica maniera:
imantada a lo visible la matéria invisible,
infolios incorpóreos deshojados por ciegos
(y el sudor en los poros,
ásperos).
Correspondencia celeste. Nueva poesía brasileña (1960-2000). Introducción, traducción y notas de Adolfo Montejo Navas. Madrid: Árdora Ediciones, 2001 – Obra publicada com o apoio do Ministério da Cultura do Brasil. Ex. bibl. Antonio Miranda
Vivos em meu corpo (sílex in
visível) o breve nos dedos,
o selo dos beijos se lendo
em segredo (um viés de medo)
— vivo o deslize se sins ra
refeito (avesso silêncio de
seixo em seu veio), e esse t
empo inteiro em meu corpo s
uspenso: no chá de teus olho
s madeleines molham os meus
a t r o p e l o s
duelo solo
de sol a sol
hálito et halo
de sol a sol
de sol a soul
o ar em ars
Vivos en mi cuerpo (sílex in
visible) lo breve de los dedos,
el sello de los besos leyéndose
en secreto (un bies de miedo)
vivos el desliz de síes ra
refacto (avieso silencio de
guijarro en su filón), y este t
iempo enterro en mi cuerpo s
uspendido: en el té de tus ojo
s madelaines mojan mis
a t r o p e l l o s
(De Ar (1991))
duelo solo
de sol a sol
hálito et halo
de sol a sol
de sol a soul
el aire en ars
(De Ar (1991))
CANTO 3 (FRAGMENTO)
Nenhum lugar. Lugar algum perdura.
Um ventre a sombra alisa, um plano
o sol levanta, cumes que o vento
plissa. Sol branco, sol negro, o vento
apaga os rastros da areia, apaga
os passos da língua. E o sol
a pino assola, o frio da lua cresta
a pele que se solta,
o suor do corpo em febre
que se solta, e as peles são silêncios,
poemas que se deixam,
e o lugar é aqui, e lá, e ontem,
e as letras voam, revoam,
espreitam como cobras sob a areia
(camaleões se escondendo em si mesmos),
espiam as peles que se espalham, página
ou pálea, corpo que se desveste, desmente,
desvaira: tudo é miragem
CANTO 3 (FRAGMENTO)
Nenhum lugar. Lugar alguno perdura.
Um vientre la sombra alisa, un plano
el sol levanta, cumbres que el viento
plisa. Sol blanco, sol negro, el viento
apaga los rastros de la arena, apaga
los passos de la lengua. Y el sol
de punta asola, el frío de l aluna quemada
la piel que se suelta,
el sudor del cuerpo en fiebre
que se suelta, y las pieles son silêncios,
poemas que se deja,
y el lugar es aqui, y allá, y ayer,
y las letras vuelan, revuelan,
acechan como cobras bajo la arena
(camaleones escondiéndose en sí mismos),
espían las pieles que se esparcen, página
o membrana, cuerpo que se desviste, desmente,
desvaría: todo es espejismsso
(De Os poros floridos (1996))
RESTE
Um vento anima os panos e as cortina oscilam,
fronhas de linho (sono) áspero queimadiço; o sol passeia
a casa (o rosto adormecido), e em velatura a luz
vai desenhando as coisas: tranças brancas no espelho,
relógios deslustrados, cascas apodrecendo em seus volteios
curvos, vidros ao rés do chão reverberando, réstias.
Filamentos dourados unem o alto e o baixo
Horizonte inivisível, abraço em leito alvo:
velame de outros corpos na memória amorosa.
RISTRE
Un viento anima los panos y las cortinas oscilan,
fundas de lino (sueño) áspero quebradizo, el sol recorre
la casa (el rostro adormecido), y em la veladura la luz
va dibujando las cosas: trenzas blancas en el espejo,
relojes deslustrados, cáscaras pudriéndose en sus volteos
curvos, vidrios al ras del suelo reverberando, haces.
Filamentos dorados unen lo alto y lo bajo
Horizonte invisible, abrazo en lecho albo:
velamen de otros cuerpos em la memoria amorosa.
(De Imagens do mundo flutuantes,
em Revista Inimigo Rumor, 5 (1998))
TEXT IN ENGLISH e EM PORTUGUÊS
DESCONTRÁRIOS – UNENCOUNTRARIES: 6 poetas brasileiros: Nelson Ascher, Regis Bonvicino, Haroldo de Campos, Duda Machado, Josely Vianna Baptista e Paulo Leminski. Projeto e coordenação editorial Josely Viana Baptista, projeto gráfico e desenhos Francisco Faria, versões dos poemas para o inglês Regina Alfarano et al. Curitiba: Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Curitiba/ FCC; Associação Cultural Avelino Vieira / Bamerindus, 1995. 158 p. ilus. Edição não comercial. Ex. bibl. Antonio Miranda.
Os poros floridos
(canto III)
Fim de tarde, as sombras suam
sua tintura sobre as cores, extraem
da fava rara da luz o contorno das coisas,
as rugas na concha de um molusco,
grafismos, vieiras milenares com reservas
de sal, poema estranho trancado
em esgarços de oleandros,
enquanto corpos
mergulham em câmara lenta,
e nada é imagem
(teu corpo branco em mar de sargaços),
nada é miragem
na tela rútila das pálpebras.
As sombras suam, ressumbram,
e essa é a sombra mais certa
das sombras calcinadas que me cercam.
Quero levá-la no corpo,
como um amor, como inscrição rupestre
no granito, como o verso
que um tuaregue cola ao corpo.
Quero levá-la comigo, como um amor,
como essa ausência azul que assombra
a noite e sonha o contorno de um rosto
no escuro, como se quisesse desenhá-lo,
*
Nenhum lugar. Lugar algum perdura.
Um ventre a sombra alisa, um plano
o sol levanta, cumes que o vento
plissa. Sol branco, sol negro,
o vento apaga os rastros da areia, apaga
os passos da língua. E o sol
a pino assola, o frio da lua cresta
a pele que se solta,
o suor do corpo em febre
que se solta, e as peles são silêncios,
poemas que se deixam,
e o lugar é aqui, e lá, e ontem,
e as letras voam, revoam,
espreitam como cobras sob a areia
(camaleões se escondendo em si mesmos), espiam as peles que se espalham, página
ou pálea, corpo que se desveste, desmente, desvaira: tudo é miragem.
Um som de antigas águas apagadas.
É miragem a rima, a fábula do nada,
as falhas dessa fala em desgeografia,
a fala hermafrodita, imantação de astilhas,
a voz na transparência, edifícios de areia.
Mas teu olhar o mesmo, em íris-diafragma,
fotogramas a menos na edição do livro,
e o enredo sonho e sol, delírios insulares,
teu olhar transparente, a imagem
margem d'água, e as fábulas da fala,
as falhas desse nada - superfície de alvura
ou árida escritura.
Na moldura da página,
marginália de escarpas.
(Os poros flóridos, 1995)
Florid pores
(canto III)
Late afternoon, the shades exude
their dyeing over the colours, extract
from the light's rare grain the contour of things,
the grooves on a molusc shell,
graphis, millenary scallops with salt
reserves, strange poem woven
among oleander frays,
while bodies
dive in slow motion
and nothing is image
(your white body in a sea of gulfweed),
nothing is mirage
on the eyelids' shining screen.
The shades perspire, transpire,
and that is the surest shade
of the burnt shades that surround me.
I wish to leave it on my body,
like a love, like a rupestrian inscription
into granite, like the verse
a Tuareg clings to his body.
I wish to have it with me, like a love,
like a blue absence that shades
the night and envisions the contour of a face
in the dark, as if trying to portray it.
*
No place. No place ever lasts.
A swell the shade levels, a level
the sun raises, peaks the wind
plaits. White sun, black sun, the wind
erases the tracks on the sand, erases
the traces of language. The high
noon devastates, and the cold moon grooves
the skin that breaks,
the body exudes its fever
that breaks, and the skins are silences,
some poems left behind,
the place is here, and there, and yesterday,
the letters fly, and flow,
peeking like snakes in the sand
(chamaleons hiding in themselves),
peeping the skins that spread, page
orpalea, a body decloth ing, disclosing,
deluding: all is mirage.
A sound of very old, faded flows.
It's mirage the rhyme, the fable of nothingness,
the flaws of the speech in no geography,
the hermaphroditic speech, splinters magnetized,
the voice through transparency, buildings made of
sand.
But your gaze the same, an iris diaphragm,
photograms lacking in the book publication,
the plot dream and sun and insular deliriums,
your transparent gaze, the image
a water edge, and the syllable fable,
the flaws of such nothingness - a surface of blankness
or writings of barrenness.
On the pale page frame,
marginalia of slopes.
Translated by
Regina Alfarano
with the author
VEJA e LEIA outros poetas do PARANÁ em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/parana/parana_index.html
Página publicada em maio de 2008; ampliada e republicada em abril de 2010; página ampliada em dezembro de 2018; ampliada e republicada em junho de 2019; Página ampliada e republicada em dezembro de 2020
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