Foto/Fonte: http://experimentesercriativo.blogspot.com.br/
HÉLIO LEITES
(Lapa, 1951) é poeta, performer e bottom-maker. Trabalha com objetos como caixinhas de fósforo, botões, rolhas, latas, madeira e restos de material entalhado. Publicou Biografia não autorizada do fogo (1994) e mínimos (2010).
101 POETAS PARANAENSES (V. 1 (1844-1959) antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI. Seleção de Admir Demarchi. Curitiba, PR: Biblioteca Pública do Paraná, 2014. 404 p. 15X 23 cm. (Biblioteca Paraná) Ex. bibl. Antonio Miranda
NINHO
Minha especialidade em morada
é beira de abismo
extremo de rama
forquilhas do céu
frágil é ali que me edifico
em pena e palha
tênue
parede que me separa da lua
frágil vivo pelo prazer e desafio
de reconstruir-me
após cada temporal.
CARDUME
Quando eu desperto
desperta um outro dentro de mim
que por sua vez desperta outro
e esse a tantos outros
como se fosse um cardume
por isso eu navego assim
São tantos e tão diferentes
cantando dentro de mim.
*
No dia 29 de julho de 1992,
mataram o tigre que fugiu do circo
agora, a cidade dorme tranquila
um sono de chumbo
dorme também o tigre em seu pijama amarelo de listras
negras
e alguma coisa vermelha
pinga na capital ecológica
e a manchete dos jornais
já não é mais a jaula vazia
e o tigre voa vivo
pra dentro de todos nós.
ÓPERA-SONHO SEM TERRA
Esta terra não tem dono
Então me mostre a escritura
Nada aqui é de ninguém
É a verdade mais pura
Quem semeia, planta e colhe
Passa fome nesse chão
Quem explora come tudo
E a lei dessa nação
Tanta terra devoluta
Espalhada no sertão
Na mão de poucos
"Filhos da puta"
Esperando a plantação
Dia ainda vai chegar
que as porteiras vão se abrir
os cadeados arrebentar
e as nossas famílias tranquilas
da terra possam cuidar
Quem é contra o movimento
Já fechou essa questão
Dorme em seu apertamento
Em frente à televisão
Plantam soja, plantam soja
Só pensando em exportação
Me desculpe meu irmão
Nosso povo quer feijão
RESTAURADOR DE SONHOS
Quando o vento 'destélia' sua casa
Acaba 'desteliando' sua vida.
Reconstruir o ninho é seu ponto de partida.
FELIZ ANIVERSARIO
E no bolo que se acende
Só pra comemorar
O primeiro fogo na vida
pra criança apagar
GALO
Por ser dono do terreiro
com o rabo ele acende
o incêndio no galinheiro
NERO
Por fósforo tinha paixão
cada palito que acendia
ardia um quarteirão
CANONIZAÇÃO DE SANTA
HELENA KOLODY
Pra canonizar pessoas
E preciso milagres
Pra canonizar poetas
Apenas poemas.
Vou nascendo sempre
é só pintar uma chance
Página publicada em setembro de 2015
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