FERNANDO KOPROSKI
Fernando Koproski é poeta, nasceu em Curitiba em 1973. Tem composições em parceria com a banda curitibana Beijo AA Força. Como tradutor, selecionou, organizou e traduziu Essa loucura roubada que não desejo a ninguém a não ser eu mesmo amém (Sette Letras, 2005), antologia de poemas de Charles Bukowski.
Publicou os livros de poemas: Manual de ver nuvens (1999), O livro de sonhos (1999), Passagens - Antologia de Poetas Contemporâneos do Paraná (Imprensa Oficial do Paraná, 2002), Tudo que não sei sobre o amor (Travessa dos Editores, 2003), Como tornar-se azul em Curitiba (Kafka, 2004) e Pétalas, pálpebras e pressas, (Secretaria de Estado da Cultura/Imprensa Oficial do Paraná, 2004).Fonte da biografia e foto: www.travessadoseditores.com.br
TEXTS IN ENGLISH
síndrome de romeu
nesse armário de indiferenças
há tanto por vestir
mágoa lágrima rancor
felicidade, para e pensa
não sou mais um lugar
a me separar de onde vou
os que têm na alma morte imensa
faz o favor de não insistir
analgésicos nesta febre de flor
é que trago no sangue suspensas
tantas julietas
quanto meu ódio possa supor
em manhãs de insistências
tantas são as rosas
cortando os pulsos neste jardim
mas se ninguém mais vê jardins
apenas deixo nuvens
a tudo quanto não escrevi
amor
nesse armário de indiferenças
há tanto por vestir
meus poentes onde mesmo
os fui pôr?
ácidos líricos
meu bem, desculpe estar
hoje um tanto diferente
se penso mar, lê-se amar
e assim continuamente
mas não sou eu o problema
são os ácidos líricos talando
dissolvendo, transformando
tudo que escrevo em poema
tentei mentir, usar essa energia
para algo útil mas infelizmente
essa é minha sina, minha cisma
só o que eu vivo vira poesia
os ácidos líricos não mentem
essa vida ou será rima ou minha ruína
(De NUNCA SEREMOS TÃO FELIZES COMO AGORA. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009)
Mas se era um sonho, repetiu, num sonho pode.
Num sonho pode tudo. A água escorria da cachoei-
ra no dia claro enquanto as constelações brilhavam
sobre a cabeça entregue
Caio Fernando Abreu
ontem eu tive um sonho
esse verso poderia começar
qualquer poema
ontem eu tive um sonho
esse verso poderia muito bem
terminar qualquer poema
ontem eu tive um sonho
esse verso poderia simplesmente
ser todo o poema
*
atirado na órbita de um bar
sou logo arrastado ao seu centro
tarde demais desvio o olhar
mas a noite já está lá dentro
onde me espera me chama
um mesmo balcão sem dor
corpos cobertos de chamas
girando devagar ao seu redor
do vermelho nas bocas nos neons
não dá pra se ficar imune
crivado de drinks cravejado de sons
o mar e o amar se unem
na saída tropeçando em letras
a lua tenta me pegar desprevenido
fazendo um céu sem estrelas
disparo meu último verso no ouvido
*
de como um certo poeta fernando
resolveu dar uma de pessoa
mas algo acabou dando errado
surgiu na área um tal de marcos prado
um aqui, este ali, outro lá
sem contar aquele parado
não importa aonde olho há
um eu meu ao meu lado
tinha um dado a conselhos
sempre me deixava um caco
pensando que fosse meu espelho
foi o primeiro que fiz em pedaços
setenta e sete anos de azar
fácil então não tem sido
não param mais de falar
agora de novo no meu ouvido
meus eus, cá entre nós
vamos enfim chegar a um acordo
vocês, me deixem a sós
eu, viver vocês todos? nem morto!
Poemas extraídos de PASSAGENS. Antologia de poetas contemporâneos do Paraná. Seleção e apresentação de Ademir Demarchi. Curitiba: Imprensa Oficial do Paraná, 202. 428 p. (Col. Brasil Diferente)
ódio platônico
a tua dor que me desculpe
o que você sente nem tem mais sentido
amor então que me preocupe
mas o teu ódio não será correspondido
para odiar te falta destreza
nesse olhar mais mágoa que a tristeza
se ainda não tiver percebido
tua aspereza não me deixa comovido
nem se disser que o que você sente
para nós dois é suficiente
terá possibilidade
um dia você vai entender obsessão
e não ódio de verdade
o que se odeia quando se adia o coração
KOPROSKI, Fernando. Retrato do artista quando primavera. Rio de Janeiro: 7Letras, 2014. 128 p. 14x21 cm. ISBN 97895-421-0161-4
CASA, COMIDA E ROUPA ENCARDIDA
a poesia não me deu casa,
comida, nem roupa encardida
poesia, eu vesti tua camisa
arregacei as mangas dos versos
fiz coisas que de tanto duvidar
até deus acredita
escrevi com sangue, coração
e o que mais estivesse à mão
até com o que meu ódio ojeriza
poesia, eu vesti tua camisa
mas você não me deu casa,
comida, uma passagem pra Ibiza
te dei meu corpo, alma e musa
mas você ainda abusa
e pede mais do que precisa
até hoje não me deu
nem um pastel de vento
mas quer que eu viva de brisa
KOPROSKI, Fernando. Retrato do amor quando verão, outono e inverno. Rio de Janeiro: 7Letras, 2014. 128 p. 14x21 cm. ISBN 978-85-421-0160-7
DOR CRÔNICA
havia uma dor e havia você
vivendo em perfeita harmonia
em meu peito até o dia
de uma dor maior aparecer
menos mar e mais melancolia
mal sabia o que era, o que seria
eu mal sabia o que sentia
era uma vez uma dor doida,
uma dor que quanto mais dia
mais ardia em minha poesia
uma dor que competia com você
e aí então você se doía toda
você, a minha dor mais sincera
a minha dor mais atónita
a minha dor mais indiscreta
a minha dor mais gim tônica
a minha dor mais lancinante
a minha dor mais ávida
a minha dor mais durante
a minha dor mais grávida
[ KOPROSKI, Fernando ] Tendéu. CD produzido por Carlos Machado e Murillo Darós. Curitiba, PR: Estúdio “Clínica Promusic”, s.d. Arranjos: Carlos Machdo e Murillo Darós. Imagem da capa: de Sady Raul. Inclui letras de Fernando Koproski
KOPROSKI, Fernando. Tudo que não sei sobre o amor. Curitiba, PR: Travessa dos Editores, 2003. 83 p. 16x22 cm. ISBN 85-89485-04-8 Projeto gráfico e foto da capa: Juliana Teixeira Lima. Produção gráfica: Paulo Sandrini. Tiragem 1000 exs. Inclui um CD com doze música (violões Luciano Romanelli, sapateado Ana Lúcia Diaz) gravado no Mantra Estúdios, Curitiba, 2003. “ Fernando Koproski “ Ex. na bibl. Antonio Miranda
se fosse em virtude que se vivesse
quando um vício se distraísse
se quando vénus viesse
fosse em versos que me visse
não minhas vertigens
o que ela vestisse
viver seria tão simples
ventos
para o que as nuvens sonhassem
valsas
para o que os violoncellos
sentissem
em nuvens exaustas tanto azul
tanto quanto existisse
um poema de doze de junho
um poema para todos os que acham,
pensam, intuem, percebem,
desconfiam, descobrem,
e não conseguem disfarçar.
um poema para todos os que sabem.
sim porque há os que sabem,
os que sempre souberam.
ah, você sabe...
até mesmo eu sei de vez em quando.
um poema para todos os que dizem,
ou que sem querer falam,
em olhares, acenos, silêncios,
gritos, sussurros ou suspiros,
em cartas, e-mails ou telefonemas.
um poema para todos os que viram
e se lembram em cenas de cinema,
em quadros, fotografias ou letras de música.
um poema para os que falam
como querem as orquestras
ou como querem as orquídeas.
um poema para os que falam
até mesmo em três simples palavras,
o que é, o que foi, e tudo que ainda flor
um amor.
KOPROSKI, Fernando. Pequeno dicionário de azuis: poesia reunida (1995-2017). Rio de Janeiro: 7 Letras, 2018. 657 p. Capa: Paulo Sandrini. Foto da capa: Ingrid Schulze. capa dura. Inclui CD. ISBN 978-85-421-0651-0. Ex. bibl. Antonio Miranda
em meus olhos vive um pássaro
quando atiram uma pedra
no lago do olhar
as águas se turvam
inquietas
elas tentam transborda
em meus olhos vive uma pedra
quando um pássaro se atira
no lago do olhar
o azul das penas atordoa
azul
pensa ser mar toda a lagoa
PEQUENO DICIONÁRIO DE AZUIS
o vaga-lume se sente traído
pela luz ter escurecido
no meio da vida sem aviso
e sem aviso no meio do dia
sim, é muito persuasivo
o amargo mel da melancolia
sei que sirvo muito pra tudo
que não serve pra nada
música, lágrima, noite, magia
e onde mais o sol iria?
sim, é muito persuasivo
o amargo mel da melancolia
eu podia ter brilhado
muito mais do que merecia
bem menos do que devia
mas preferi queimar sozinho
meu brilho na página de um livro
e onde mais o sol suicidaria?
entre coreografar tudo que sinto
e musicar aqui esse labirinto
preferi o sonho que ardia
mas o sonho, grávido de infinito,
queimou mais que minha luz
ele cegou o sangue do coração
agora onde ponho a mão
transformo em rima ou ruína
o amargo mel da melancolia
desde que o sonho se fez fogo
o sangue nunca mais foi o mesmo
passei a viver numa branca escuridão
mas com o sonho eu não discuto
apenas com a poesia, essa sua mania
de calar minha boca com luz
tanto que tateio vida no escuro
mas debaixo da pele da página eu procuro
um pequeno dicionário de azuis
II BIENAL INTERNACIONAL DE POESIA DE BRASÍLIA – Poemário. Org. Menezes y Morais. Brasília: Biblioteca Nacional de Brasília, 2011. s.p. Ex. único.
Cabe ressaltar: a II BIP – Bienal Internacional de Poesia era para ter sido celebrada para comemorar o cinquentenário de Brasília, mas Governo do Distrito Federal impediu a sua realização. Mas decidimos divulgar os textos pela internet.
ódio platônico
a tua dor que me desculpe
o que você sente nem tem mais sentido
amor então que me preocupe
mas o teu ódio não será correspondido
para odiar te falta destreza
nesse olhar mais mágoa que a tristeza
se ainda não tiver percebido
tua aspereza não me deixa comovido
nem se disser que o que você sente
para nós dois é suficiente
terá possibilidade
um dia você vai entender obsessão
e não ódio de verdade
o que se odeia quando se adia o coração
in Tudo que não sei sobre o amor
(Travessa dos Editores, 2003)
abatimento cardíaco
a cada dor que não demonstro
a cada egoísmo sem rosto
a cada vez mais meu coração
encolhe dentro do meu corpo
a cada pureza que eu sufoco
a cada delicadeza sem gosto
a cada vez mais meu coração
encolhe dentro do meu corpo
a cada risco que não corro
a cada amigo que não escolho
a cada vez mais meu coração
encolhe dentro do meu corpo
a cada lágrima rápida escondo
uma lágrima lenta no teu rosto
a cada suavidade que não ouço
a cada nuvem mais nuvem de osso
a cada abatimento cardíaco
meu coração mais parece rouco
amor vai parar no fundo do olho
meu coração no fundo do poço
amor, pra que me dar atenção?
pra que me deixar assim de novo?
você abrindo caminho a fogo,
a sonho louco em minha direção
a cada verso onde eu propor
falar de você ao falar de amor
meu coração ainda será pouco
pouco a pouco todo o meu corpo
o peso da mágoa
para começar um blues no violão
precisa beber inverno em pleno verão
para começar a vazar luz de meu blues
precisa regar de noite a flor da aflição
para começar é preciso secar
a sede de tanta mágoa no coração
senão essa vida não vira mais nada
a não ser esse solo de solidão
a tristeza não é uma disfunção
todo o peso da mágoa em seu peito
não é desculpa pro seu coração
deixar de abrir e acender direito
para dizer o que há em meu peito
eu podia incendiar uma igreja
ou apagar na tua boca uma estrela
mas fazer blues é o meu jeito
um blues é o que faz cauterizar
esse buraco azul em minha canção
por onde você deixou uma dor passar
depois de vazar luz de um coração
TEXTS IN ENGLISH
Now it's time to say goodbye
to all the poems you have written
and I was not able to be.
Now it's time to say goodbye
to the permanent and brief
beauty of the summer
swans I insist on living inside of me.
I drove your lakes to my mind,
all lakes I could not help but feel
when the water mirrors a still sky.
But now it's time to say goodbye
to all wine and winter we were.
For there's no more summer to give
no matter how many swans into your lakes.
Now it's time to say goodbye
to all poems we were meant to be,
but not able, not able to live.
Say it sweetheart, for now it's too late,
for us to see how softly your lakes,
and my swans and the summer were the same.
***
all beauty
that I miss
trying to define,
one day
I will
be ready
to kiss
goodbye ?
SHE NEVER SAID YOU ARE IN LOVE
beauty is a sort of addiction for me. the very slight idea of beauty
makes me restlessly anxious, no sense to say in writing how much I was intoxicated with beauty, undoubtedly and endlessly addicted to each
new possibility of beauty, since that afternoon when I first met her, I
was intoxicated by her coming and silent dancing. I waited so long,
motionless, for what I have ever known, that I almost forgot wishing
the supreme ignorance - to be blind by beauty's beat.
about my favorite drugs, canova is definitely an efficient one. rodin,
bernini, botticelli could find no difficulties to persuade my senses,
so aware of their thirst, las meninas by picasso may provide such
awakening of colours, more than any lsd could ever think in its
sleepless black and white, venere italica, paolina borghese come venere vincitrice, I'amour et psyche, or amore risveglia psiche con un bacio, it
did not matter, each new shot, hit, or pint of canova was decisive and
delightly collapsing, my never coming back.
because beauty is that sort of addiction that intoxicates my vices with
virtues.
Página publicada em fevereiro de 2009 = AMPLIADA e republicada em 2014
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