DARIO VELOSO
(1869-1937)
Dario Persiano de Castro Velozo nasceu no Rio de Janeiro, a 26 de novembro de 1869, mas viveu em Curitiba, Paraná, onde faleceu em 28 de setembro de 1937. Poeta, narrador, ensaísta, orador, educador, pensador, catedrático do Ginásio Paranaense. Apaixonado pelas cerimônias ocultistas e ritualísticas, construiu em sua chácara o “Retiro Saudoso” ou “Templo das Musas”. Fundador de revistas, destacando-se O Cenáculo.
TEXTOS EN ESPAÑOL
CRUZ E SOUZA
a Leôncio Correia
Passa o Azul, cantando, uma trirreme de ouro...
Velas pandas... No Azul... Que levita inspirado
Reza o ebúrneo Missal, de um requinte ignorado,
Entre astros monacais e iatagãs de mouro?!...
Rutilam brocatéis de púrpua e de prata...
Fulgem Broquéis, à popa... A trirreme estremece...
Ísis! — quem te acompanha a estranha serenata
E para o Além da Morte entre os eus braços desce?!...
Morte é a eternidade;é um poente de Outono...
Mago! — tu vais dormir o glorioso sono
Entre Borquéis de ônix, e iagatãs de mouro...
Vais dormir!... Vais sonhar!... (Nobre e celeste oblata!)
Segue no Azul, cantando, uma trirreme de ouro...
Rutila brocatéis de púrpura e de prata.
ALÉM
Alfim! Vais repousar, corpo meu tão franzino,
Escudo, roto já, pelos gládios da Sorte;
A decomposição completa o teu destino,
As atrações do Além levam-me além da morte.
Para o Azul, para o Azul!... Vou perlustrar espaços,
Alma, - de sol em sol, - filtro que o corpo encerra...
Melhor fora, talvez, a noite de teus braços,
Meu amor; bem melhor! nos presídios da Terra.
Exílios! De tua alma a minha alma se ausenta,
Soluças! Nosso adeus é agonia lenta,
A Quimera a morrer nos braços de um titã...
Ficas em teu solar, sigo para o Mistério...
Quando seremos - LÁ! - no infinito sidéreo,
Almas nupciais na radiosa manhâ?
FLOR DE CACTO
Vens do Azul, da Quimera, alma de olhos sidéreos,
Que a minha alma de asceta aos paramos eleva
E à minha viuvez de mágoas e mistérios
Abre as aras do Além para o ofício da treva.
E$ eu bendigo, e sigo o teu corpo de Sombra,
Peito de névoa e luz; névoa das louras tranças,
Luz do olhar, desse olhar, deliciosa alfombra,
Calvário e serial de minhas esperanças.
Ilusões são punhais. Cada ilusão que aflora
A penumbra de um sonho, alma de olhos sidéreos,
Leva o espectro da cruz às flâmulas da Aurora
Cruz do Além, cruz feral, de mágoas e mistérios.
A carícia cruel de teu seio fremente
Abre as asas do Além pra o ofício da Treva,
E eu te digo. E a minha alma, ajoelhada, sente
Que a tua alma de morta ao passado nos leva...
SOLAU
A Nestor de Castro
Eu sou o pajem de Dona Morte,
Loura de olhos monacais;
Eu rezo salmos a Dona Morte,
Sou o coral das Catedrais;
Nos meus idílios flavesce a morte,
A morte, — vinho das bacanais.
Volvei os olhos de esperança
A um cavaleiro Rosa-Cruz;
Os vossos olhos de esperança
São liras de ouro, alvas de luz;
São pulvinários de esperança,
Valquíria astral da Rosa-Cruz.
Nos cinerários de meus sonhos
Arderam Silfos e Quimeras;
Em que sepulcro andam meus sonhos,
Ó Peregrina de outras eras?!...
Noiva, — sepulcro de meu sonhos,
Crisoberil das primaveras!
Eu sou o pajem de Dona Morte,
Entre castelos e solares;
Seguindo os passos de Dona Morte,
Subi a torres de sete andares,
Os belvederes de Dona Morte
Andam suspensos de meus olhares.
Andam suspensos de minha boca
Os nove arcanos da Alquimia;
Nos setiais de minha boca
Rezaram monjas noite e dia;
Jamais oscules a minha boca,
Estrela d´alva da Nostalgia!...
Deixa que mortos enterrem mortos,
Loura, de olhos monacais,
A Morte embala meus sonhos mortos
Nas absides das Catedrais.
A Morte é a noiva dos sonhos mortos,
A Morte é círio das bacanais.
Deixa que mortos enterrem mortos,
Loura, de olhos monacais!
Extraídos de Obras, Edição do centenário (1969)
GIL, Fernando Cerisara. Do Encantamento à apostasia: a poesia brasileira de 1880-1919: antologia e estudo. Curitiba: Ed. da UFPR, 2006. 408 p. (Letras do Brasil, n. 46) 16x23 cm. ISBN 85-7335-139-X [ poesia parnasiana, parnasianismo ] Col. Bibl. Antonio Miranda
Sofia
Eis que te vejo, Beatriz do Dante,
No alto céu de estrelas recamado,
Sonho, visão vivida em meu passado,
Enlevo de meus dias de estudante.
Em minha mente, como um sol levante,
Sobes da Consciência o mundo alado,
Mundo infinito, de IDEAIS, criado
Da Inteligência à flama irradiante.
SOFIA: essência, emanação do Eterno,
Criadora das Formas, sempiterno
Jorro de inspiração dos Criadores;
Musa da Ideia e da Beleza, planas
Nos elances das asas soberanas,
Glória do Génio, Guia de Condores!
1933 (Fogo sagrado)
Lísis
Lisis, o Amigo, as mãos me toma, e sigo...
A harpa preludia os Versos de Ouro...
Ouço das Musas o inspirado coro,
Em rumo ao Templo dórico prossigo.
Ditoso quem possui o almo tesouro
De um coração de verdadeiro amigo;
Ditoso aquele que do rito antigo
Conhece a acácia, o mirto e o verde louro.
Lfsis é a voz de Crótona, o espelho
Que reflete Pitágoras, o exemplo
Dos mais austeros Mestres do Conselho.
Peregrino padrão, sublime aedo,
Guarda nos Versos as lições do Templo,
A chave de ouro do imortal segredo!
1933 (Fogo sagrado)
Musa do Silêncio
I
No silêncio da tarde que se esfolha,
Vaga e macia nos ocasos de ouro,
Fito, cismando, o teu semblante, o louro
Tom do cabelo que o pesar desfolha.
Segues, por entre os túmulos, sombria,
Na saudade pungente. Erma e discreta,
A Mansão do Silêncio a alma inquieta
Cinge-te, à luz nostálgica do dia.
És do Silêncio a Musa merencória,
Leio-te na alma angustiosa história,
Triste fadário que teu véu recata;
Leio-te na alma a solidão imensa,
Só mitigada por suave crença,
Prece que o olhar em lágrimas desata.
II
Vês? Eu bem sei que a tua dor é nobre
E nobre o culto que te inspira a campa;
Sobes da mágoa a merencória rampa,
Ouves da tarde o evocativo dobre.
Das sepulturas o silêncio cobre
A paz macia que o arvoredo estampa;
O ocaso acolhe a radiosa lampa,
E denso crepe teu semblante encobre.
Ouço-te o passo, peregrino soa.
A dor que sentes em minha alma ecoa,
Asa de crepe que o silêncio cruza;
Asa tão só, mas tão formosa, adeja,
E o níveo mármor do sepulcro beija...
Sombra de Samos, merencória Musa!
1921 (Cínerârío)
TEXTOS EN ESPAÑOL
DARÍO VELOSO
Traducción de ÁNGEL CRESPO
ESFINGE
Cuando, al caer las tardes melancólicas,
Vésper fluctúa en los ocasos límpidos,
Sereno la mirada de esmeraldas:
¡La añoranza me invade!
La sombra emerge desde el campo y sube,
Alas negras extiende em lo infinito;
Cae la luz de las trémulas estrellas,
Luciérnagas perdidas.
A mis ojos de asceta un bulto surge,
En la frente la luz del iniciado,
Alas de luto, garras de quimera:
¡Esfinge!
¿Viene tal vez de Kemi o de la Atlántida?
De los Misterios trae el suave aroma,
Evoca al loto... hace soñar a Dioses
Y a magos de Caldea.
Agranda, agranda su mirar magnético
De una fascinación irresistible;
Me mira com miradas enigmátiacas,
Llenas de arcanos.
Después los huertos véole en los ojos,
Dos paraísos matizando encantos,
Súplicas hechas de carícias flébiles,
Una humilde pregunta.
Tiene atractivos de Theano helénica,
La dulzura de Safo, peregrina,
Hermosura de Venus de Corinto,
Y la bondade de Buda.
Mas no traduce en frases la pregunta;
No revela el mistério de su alma;
Antes surge en silencio y, dulce y dúctil,
¡Sonríe apenas!
¡Sonríe! ¿Quién su risa interpretara?
¿Quién su secreto conociese y pena?
Ojos y risa de que vuelan juntas
Esperanza y tristeza.
No está hecha de arcilla, sino de éter,
De fina esencia de los astros castos;
Fulge radiosa sobre los instintos,
Flor de la armonía.
De los mortales no es, que es de los genios,
Lejos de la matéria de sus cieloss;
Nació para brillar en santuários,
En Delfos y en Eleusis.
¡Si el asceta pudiese conocerla!
¡Si se elevase el vate hasta tí, oh Musa!
¡Ya no serías, cual te veo siempre
Esfinge!
ANTOLOGIA DA POESIA BRASILEIRA. José Valle de Figueiredo. Lisboa: Editorial Verbo, 197-. 217 p. capa dura.
Ex. bibl. Antonio Miranda
LILITH
O Santuários dos Incas, sobre os Andes,
Apagou-se, alma solar!
Onde iam perder-se as trirremes Atlantes?
Sobre que mar de ônix e diamantes?
Sobre que mar?
Na alma, em flor, de nelumbo,
A Ilusão florescia...
Bruxa cruel ípsilo de chumbo
De teus seios de nardo suspendeu...
Agonia! Agonia!
Atlântida morreu!
Vãmente o Sol, broquel dos Andes,
A neve derretera...
Os olhos de diamante
Eram olhos de cera
Rosas de argentum do plenilúnio,
Magnólias de âmbar das Vestais,
Eram rosas de cera,
Eram flores de cera!...
Bruxa cruel, de olhos de infortúnio!
Toda de neve, a Cordilheira,
Linha de finos, rútilos punhais,
Cordilheira da Morte,
Val da Morte,
Para Imortais.
Tinhas na alma de nelumbos um santuário de atlantes,
Volúpias a florir, sóis de ouro a rutilar,
Serpente negra, alta sobre os Andes,
A face de marfim a reflectir no mar.
A frota de teus anéis,
Rainha, sobe a sideral alfombra,
Asas da Morte à popa dos baixéis,
Velas de crepe, — para o Val da Sombra.
Teus fluídos absorvem amuletos,
Luz do Ocaso e Luz da Alva,
E vertes o langor, com requintes secretos,
Dos cíatos ferais de teus olhos de malva.
E é tão gentil sucumbir à primavera
de teus olhos de mar, de insondáveis arcanos,
Que, para entrar teu porto, ó Vénus! em Citera,
Quebro a ampulheta de meus anos.
Vénus-Urânia, sol, num poente agoníaco,
Ilusão de sentidos, flor de espuma,
Lótus de volúpia, os olhos de Zodíaco,
Astro do Sonho a mergulhar na bruma.
Jalne fluído a dourar-me o fluído das artérias,
Serpe que me enlaçaste o coração...
Asas de Lusbel levaram-me, sidéreas...
Asas do Sonho, crepes da Ilusão.
Volvi da luz zodiacal a uma furna de feras,
Morto, a sepultar-me no real...
Bondade e Amor: duas megeras,
Duas serpentes em corpo astral.
Bondade e Amor: duas caveiras,
Idiotamente, a rir...
Duas caveiras: duas loucuras!
Esteta, cava estas eiras!
Abre duas sepulturas,
Quero dormir.
OFERTÓRIO:
Lilith, rainha dos Sucúbios, coorte!
Alfim, ilha de Tule, flor de espuma!
Em tua taça bebo o ouro da morte!
E como os paços reais do Silêncio... da BRUMA.
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Página ampliada e republicada em abril de 2023
Página publicada em novembro de 2008.Ampliada e republicada em fevereio de 2014. Ampliada em dezembro de 2017.
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