COLOMBO DE SOUSA
(Colombo, 1920 — 1991) foi professor e publicou, entre outros, Painéis (poemas, 1945), Fuga (poemas, 1948), O anúncio do acontecido (poemas, 1968) e Antologia poética (poemas, 1973).
101 POETAS PARANAENSES (V. 1 (1844-1959) antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI. Seleção de Admir Demarchi. Curitiba, PR: Biblioteca Pública do Paraná, 2014. 404 p. 15X 23 cm. (Biblioteca Paraná) Ex. bibl. Antonio Miranda
ALEGORIA DA BAILARINA NOTURNA
Ei-la esculpida em seus mistérios, nua
no camarim azul da imensidade;
muros sem fim encarceram a sua
virgem alma no tempo sem idade.
Ei-la a bailar — a música insinua
a transparência do bailado que há de
vestir de espelho seu perfil de lua,
no encantado mural da Eternidade.
Quem não amar a Bela Adormecida
não cantará com ela o hino da vida,
rosas de amor plantando pelo mundo.
Seus gestos musicais nadam contornos
de almas, sonham jardins, descem ao fundo
do seu cenário de violinos mornos.
PASSA UM BÊBADO CANTANDO
Quem me vê não vê quem sou,
quem me chama me ignora;
dentro de mim é que estou
e não fora.
Por dentro a dor me angustia,
por fora a alegria mora;
eu preciso qualquer dia
ir-me embora.
ALEGORIA DO DIA E DA NOITE
São dois cavalos de variado porte,
Cavalgando-os por sonhos, pesadelos,
Descubro o colorido de seus pelos,
Atento aos pontos cardeais da morte.
Talvez ao branco, ao preto me reporte,
Levam-me (sem ouvir os meus apelos)
Aonde não sei. Quem poderá detê-los?
Assim talvez à ilha do sonho aporte.
Soam os dois quais músicas em dueto
E, ao vê-los, minhas lágrimas estanco,
Atos do herói que antes não fui — cometo,
Poemas de amor do coração arranco.
— Sou noite e morte no cavalo preto,
Sou dia e vida no cavalo branco.
TRIZ
Sou todos ou ninguém. Se alguém me viu
Vagando por aí, errou. Mentiu.
Era o mundo em meu rosto desenhado.
SONETO
Era preciso que um de nós partisse,
pois nosso amor perdeu o encanto, a graça;
talvez, se morto está, nunca renasça,
nem nunca mais te diga o que te disse.
Ébrios de amor, esgotamos a taça,
sem crer que tanto amor se consumisse.
E como, enfim, mais nada nos unisse,
desmanchou-se o castelo de fumaça.
Depois o adeus — tão rápido, indeciso —
deu-me a impressão de termos sido expulsos
do encantado jardim do Paraíso...
Foste, eu fiquei. E aqui, ainda desejo
aos grilhões desse amor prender meus pulsos,
beijar de novo teu primeiro beijo.
CÉU
Sensação longínqua do que é vivo,
teu nome é miragem.
ESTUDO PARA UM MURAL
Ó esquiadora hipnotizada pela música,
vem repousar aqui, em meu cenário plástico,
as mãos e os pés que são teclados, sombra.
Meus braços buscam o teu sentido exato
e carregam noites na rotina do ar.
Sou um homem aprisionado em meus espelhos,
mas tenho gestos líricos para beber as cores
e aonde fores andará meu eco. Sempre habitaste
as noturnas latitudes de meu equívoco,
porque somos sempre este roçar de sombras
escorregando sobre si mesmas.
Página publicada em setembro de 2015
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