ADOLPHO WERNECK
Adolpho nasceu na cidade paranaense de Morretes em uma quarta-feira, dia 3 de dezembro de 1879, falece em Curitiba em 18 de agosto de 1932.
Suas principais obras são: “Dona Loura” (poemas de 1903), “Bizarrias” (sonetos de 1908), “Insônia” (poemetos de 1921), “Minha Terra” (poemetos de 1922), “Arco-Íris” (versos de 1923), entre outros.
Extraído de:
101 POETAS PARANAENSES (V. 1 (1844-1959) antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI. Seleção de Admir Demarchi. Curitiba, PR: Biblioteca Pública do Paraná, 2014. 404 p. 15X 23 cm. (Biblioteca Paraná) Ex. bibl. Antonio Miranda
FUNERAL DE UM CORAÇÃO
Ao Dr. Ermelino de Leão.
Dão-balalão, dão-balalão, dão-balalão...
Sinos?... Ouço-os vibrando a defuntos, talvez
Tenha morrido alguém e, por essa razão,
Os sinos vibram todos juntos de uma vez.
Por quem será que dobra assim o carrilhão?
— Coveiros, homens mãos, almas feitas de pez,
Abri, cantando, a cova em que o meu coração
Tem de dormir o sono eterno, ó doce ebriez.
Coitado, coitadinho, ele andava tão doente,
A chorar e a gemer continuadamente,
Sem esperança de sarar do mal atroz...
Cravou-lhe a Parca a ponta ervada do estilete.
Morreu e vai servir (quem sabe?) de banquete
Aos nojentos lacraus — terror de todos nós.
PTHYSICA
Ao Euclides Bandeira
Ela aí vem, esquálida, e eu me embuço
Para evitá-la, em vão! Ela aí vem,
Magra mulher, — eu vejo-a sem rebuço —
Prender-me aos braços, asfixiar-me... Dlen!
E já me sinto mal, e tusso, e tusso,
E vou ficando, assim como a cecém,
Branco e a tossir ao chão eu me debruço
Porque a tosse a fadiga sobrevêm.
Orai por mim, orai por mim, Donzela,
Vai-me a vida pouco a pouco, a vela
Ponde-me à mão. Adeus! sou quase exangue..
Meu coração, a custo, vibra agora,
O sangue vem-me à boca e sem demora
Eu tombarei amortalhado em sangue.
COVEIRO
Ao Domingos Velloso
De longas barbas, olhar funéreo,
coveiro mau,
porque é que habita o cemitério
como o lacrau?
O teu aspecto... Jesus, que medo!
que medo, chi!
quando te vejo, de manhã cedo
passeando ali...
Por entre cruzes ziguezagueias,
como se foras
negra abantesma, por noites feias,
aterradoras.
Abrindo covas, o dia inteiro
de enxada à mão,
levas a vida, negro coveiro
sem coração.
Ser desprezível, frio de pedra,
alma de pez,
ao bem estéril, onde só medra
a malvadez...
Mal, a finados, badala o sino
sorris, assim
como se ouvisses tocar um hymno
tará-tá-chim!
Almas pranteiam num triste pranto
desolador,
e tu, contente, cantas enquanto
choram de dor...
Mães te maldizem, rogam-te pragas
verdes, cruéis
como a gangrena roxa das chagas
ou como os féis.
Homem nefasto, também te odeio
com ódio tal,
que fora um gozo cravar-te ao seio
todo um punhal!
Jogar-te ao fundo de fundo abismo
de fauce hiante,
ó vil, ó monstro, cujo cinismo
não ha quem cante!
Porque doente, doente, doente,
quase a finar
ando, me lanças constantemente
cúpido olhar.
Olha, uma noite sonhei contigo,
vi-te, a sorrir,
abrindo a vala do meu jazigo
para eu dormir.
E quando os olhos abri, me pasma
dizer-te até,
tu te sumiste, como um fantasma,
pé ante pé.
E desse sonho nunca mais pude
livre me ver,
a mal do esforço, coveiro rude,
para o esquecer...
Impressionado, por toda parte
bem te lobrigo,
embora busque sempre evitar-te
como um perigo.
Em vão me escondo, mesmo que fuja
vejo-te a ti,
coruja negra! Corta, coruja,
tirri-tri-ti!
Pronta a mortalha. Cessa o agoureiro
corte de azar...
sinto-me exausto. Negro coveiro
podes cantar.
Página publicada em setembro de 2015
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