RODOLFO PIRES DE MELO
(Rodolfo Pires)
Nasceu na cidade de Areia, mais ou menos nos meados do século 19.
Fez os seus estudos na cidade natal, onde havia latinistas e homens de letras. Dedicando-se à vida da imprensa local e do teatro, não tardou que se aperfeiçoasse nos dois ramos. Abolicionista republicano, os seus versos serviram grandemente para ajudar a queda do cativeiro local.
Colaborou na "A Verdade", jornal de 1891. Morreu na flor dos anos.
Das colunas da 'A 'Verdade", de vários números, tiramos estes versos de Rodolfo Pires.
PINTO, Luiz. Coletânea de poetas paraibanos. Rio de Janeiro: Ed. Minerva, 1953. 155 p. 16.5 x24 cm Ex .bibl. Antonio Miranda
SAUDADE
Mal entrei na juventude
Logo enganos da esperança,
Me fizeram ter saudades
Dos meus tempos de criança.
Inda não tinha vinte anos
E já saudoso pensava —
Que a quadra melhor da vida
Era a que atrás me ficava...
Cheguei à idade brilhante: —
A bela estação das flores —
E em vez de afetos — chorei —
Por meus sonhados amores...
Os anos tudo devoram:
Amor, glória, mocidade,
Tudo o mais acaba, esquece,
Mas tu não morres, saudade!
LIBERDADE
Há quatro anos passados
Um punhado de soldados
Apóstolos da abolição
Nesta terra abençoada
Enfrentaram dura cruzada
Esmagando a escravidão!
Foi uma luta renhida
Cada qual expunha a vida
Com grande abnegação
Todos unidos lutaram
E os escravistas tramavam
Nos covis da escravidão.
À frente dos denodados
Heroicos, leais soldados,
Manuel da Silva surgiu
E o escravismo fremente,
Ante vulto tão potente,
De dor se estorceu, rugiu.
Este, ao comando dos bravos,
Jura arrancar os escravos
Das garras do despotismo,
E valente como um guerreiro,
Arremessa-se forte, altaneiro,
Sem dar trégua ao escravismo,
Foi uma campanha ousada
Com altivez sustentada
Pelo herói libertador,
E todos os seus soldados
De entusiasmo exaltados
Foram dignos de louvor!
SAUDAÇÃO
Salve 3 de Maia, aurora esplendorosa,
Salve bela Areia, rainha portensosa
Orgulho dêste Estado!
Salve da manhã festões alvenitentes
Na guerra do passado!
DIANTE DO TOMULO DE MANUEL DA SILVA,
no 1.° aniversário de sua morte:
Amigo dedicado, ó grande patriota,
Audaz republicano, ilustre brasileiro,
No chão onde repousas depõe esta saudade
Um grato coração de amigo verdadeiro.
IMPROVISO
diante de uma passeata que se movimentava em frente à Emancipadora Areiense":
Abre a história de minha terra
No capítulo da escravidão
Escreve: Manuel da Silva
— Três de Maio, redenção!
FADO
Ao nascer fui infeliz
Se-lo-ei até morrer,
Do mundo já nada espero
não quero mais padecer!
Do mundo não tenho enganos
Já me aborrece o viver,
Tenho tanto horror à vida
O quanto tens ao morrer!
Vem ó morte, ouve o reclamo
De um infeliz trovador,
Voa depressa a meus braços
Vem terminar minha dor!"
Vem formosa, vem risonha,
Cortar-me o fio da vida,
Não tardes, depressa. . . vem. .
Ó minha visão querida!
O amor que em vão, sonhara,
No jardim da adolescência,
Vem ó morte terminá-lo
Me arrebatando a existência!
Julguei-me feliz, um dia,
Em possuir de Lília, o amor,
Veio o fado — arrebatou-a
Cravando-me no peito a dor.
3 DE MAIO DE 1888
Possuir hoje eu quisera
Asas fortes de condor
Para de um voo elevar-me
Ao trono do Redentor.
Quisera romper os véus
Que nos vedam ver os céus
Para a pátria vos mostrar
O riso com que Jesus
O grande mártir da cruz
Vos está a contemplar.
Areia, ó berço querido,
Teus foros engrandeceste
e uma lição sublime
a Província inteira deste,
Foste o ponto onde, primeiro,
No império do cruzeiro
Se tratou da abolição,
E hoje, cheia de glória,
Arrancas de tua história
A página da escravidão!
MANUEL DA SILVA
Ante o corpo sem vida, inanimado.
De quem Manuel da Silva se chamou:
Curvai-nos minha terra, pranteai,
A morte de quem tanto vos honrou.
E vós fiéis amigos, torturados,
Pela dor cruciante da saudade,
Deixai de vossos olhos se escoarem
As lágrimas sinceras da amizade.
Areia, triste, veste-se de luto:
Não há corações indiferentes,
Todos curvam-se ante a dor suprema
De uma esposa e de filhos inocentes...
L I L I A
Escuta, Lília adorada,
Ideal dos sonhos meus,
Na terra não nos unimos
Nos uniremos nos céus!
Um dia tive a esperança
De teu amor possuir,
Mão forte despedaçou-a
Anuviou-me o porvir!
Ó Lília adorada, adeus,
Mulher sublime, querida,
Virgem bela, adeus, em morro.
Só por ti desprezo a vida!
PRESSENTIMENTO
Da morte pressinto os passos
Bem perto o coveiro avisto:
Sinto o corpo enfraquecido
Conheço que não resisto.
Mas não me espanta o esquife
Não me aterra a sepultura,
A morte não me intimida
Pois nunca fruí ventura.
Conduzo saudades, apenas,
E estas bem cruciantes:
Da família estremecida
E de alguns amigos constantes.
Mas do mundo ter saudade?
Julgar a morte ruim?
Se tantas são as maldades!
Quem pode pensar assim?!
Página publicada em agosto de 2019
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