ODILON NESTOR
(1875-1968)
ODILON NESTOR de Barros Ribeiro nasceu a 26 de feveriro de 1865, na Paraíba. Bacharel em Direito pela Faculdade de Recife, atuando como professor da cadeira de Direito Internacional.
Faleceu em Recife em 1939.
Bibliogr. Juvenilia, Recife, 1906.
FREIRE, Laudelino.Pequena edição dos Sonetos brasileiro. 122 sonetos e retratos. 2ª. edição augmentada. Rio de Janeiro: F. Briguet e Cia. Editores, 1929. 256 p. 12,5x16 cm. capa dura Impresso na França por Tours Imp. R. et P. Deslis. Col. Bibl. Antonio Miranda
O BOI
Amo-te, oh! boi piedoso! Um sentimento
De vigor e de paz tu me forneces,
Grave e solemne, como um monumento,
Olhando os campos de doiradas messes.
Preso á canga, não soltas um lamento,
Mas ao homem na lida favoreces.
Elle fala e te punge, e tu com o lento
Volver dos olhos mansos lhe obedeces.
Nessa larga narina, húmida e escura,
Bafeja o teu espirito, e ridente,
Como um hymno, o mugido no ar se perde.
E em teu olhar de límpida doçura,
Calmo, se espelha magestosamente,
Dos verdes campos o silencio verde.
PINTO, Luiz. Coletânea de poetas paraibanos. Rio de Janeiro: Ed. Minerva, 1953. 155 p. 16.5 x 24 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
EM VIAGEM
Agora eu sigo à sombra do sol posto,
no frouxo esmorecer da Ave-Maria...
Não tarda em vir a noite!
E a nostalgia virá com ela me cobrir o rosto...
O PAU D'ARCO ROXO
Sonhador do deserto! Eu, às vezes, me ponho,
Sozinho a meditar sobre o mistério teu...
— Tua coma, é, talvez um pedaço de sonho,
0 manto tutelar que algum santo perdeu!.. .
Teu tronco, ao ver revoando esse manto, suponho,
Logo o chamou, a si, e, em êxtase, o prendeu...
— Tronco, essência talvez de algum poeta tristonho,
Que se foi e que em ti, afinal, reviveu!...
Quando encaras a luz, fitando o azul cobalto,
Tétrico, a estremecer, todo em ânsias para o alto,
Nessa expressão de dor, doce e sentimental.
Vejo em ti, sonhador, uma revivescência
De Abreu, que se partiu tão cheio de inocência,
De Varela talvez ou talvez de Quental.. .
R E T ô R N O
Quando o inverno, a espargir, pelas chapadas, pelos
Vargedos e grotões, a força fecundante,
Surge, no amplo sertão, da desdita aos apelos,
E ouro corre, e a terra brota, e, instante a instante,
Fulgem, na imensidão, relâmpagos — radiante
Prenúncio da extinção de negros pesadelos
— E ribomba o trovão nas alturas, distante,
Os montes e alcantis, de chofre, a estremecê-los;
O sertanejo, entregue às agruras do exílio,
Ouve o estampido e vê, do relâmpago, o brilho,
Mal podendo conter a súbita emoção...
A lembrança do verde e um clarão de esperança!
E volta... e amanha a terra... e, finalmente alcança
Vida alegre e feliz dentro do seu sertão!...
C A M P ô N I O . . .
Quem te vê, não pressente, às mais das vezes quanto
Sabes interpretar, de alma leve e impoluta,
A poesia da terra! o acrisolado encanto
Em que, da Natureza, a grande voz se escuta!
Arrendas o campo! e, votado à labuta,
Alheio à mágoa, alheio ao tédio, alheio ao pranto,
Quando a seara germina, a tua alma perscruta
A sublime expressão desse verde recanto!. ..
Que o campo, para ti, é como um céu aberto,
Quem te vê, sonhador, não presume, por certo,
Onde, aos mimos de em torno, enelevado sorris. ..
Não se lembra, talvez, que, dos grãos que semeias,
Nascem flores, sorrindo! e nascem, às mancheias,
Frutos que vais colher, ó sonhador feliz!...
Nem vejo a casa! O desejado encosto,
que se esconde por trás da serrania,
temo que fuja, como foge o dia,
deixando n'alma um travo de desgosto!
Longa, sem fim, insípida a jornada!
Subo a escarpa monocroma, sozinho,
ao passo lento do animal na estrada.
Casais de rolas vêm buscando o ninho...
— Da lua nova a curva delicada
avisto além... da curva do caminho.
NO BOSQUE
A Aníbal Freire
Aqui, na verde sombra do arvoredo,
à grata voz da murmura corrente,
sinto minh'alma abrir-se docemente,
como as flores mimosas do silvedo.
Cantam aves tão lindas no balsedo,
e há tanto ninho tépico e contente!...
Beija a orla dos bosques a torrente,
que desce além, dos cimos do rochedo.
Entre os galhos da moita verdejante
brinca um raio de luz que o sol desata,
engastado no azul como um diamante.
E eu ouço o flébil respirar da mata,
que bem parece um colo palpitante,
de que o rio se fêz colar de prata.
A DANÇA DAS VAGAS
As vagas doidas ao lugar
estão na praia a dançar.
Nunca baile estranho assim
à beira-mar alguém viu.
Uma artista se vestiu
de vestido verde-mar,
para entre as vagas bailar,
no mais belo desvario,
um bailado ao desafio,
na areia fluída sem fim...
Mas entre as vagas ficou.
Debalde a artista buscou,
na tela em que se perdeu,
o caminho que a levou,
e que de todo esqueceu.
Por onde, agora, voltar?
Tudo ali é um só clarão:
de céu, de areia, de mar.
E as vagas doidas estão
na luz da lua a valsar.
Esperança é só o que tem,
— e é já ventura esperar, —
de na onda, que inda vem
com outras ondas também,
poder um dia volver,
ou ser vista por alguém.
Se entre as vagas não ficar,
perdida no imenso mar,
eternamente a viver,
eternamente a bailar...
NORDESTE – ANO XVII – DEZEMBRO DE 1964 – Recife – Pernambuco. Direção: Esmaragdo Marroquim e Ladjanne.
23x31 cm Ex. biblioteca de Antonio Miranda
Página publicada em março de 2014; ampliada em agosto de 2019
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