MARCOS VINICIUS
Marcus Vinícius de Andrade nasceu em Recife – PE, em 18 de abril de 1949. Fez os primeiros estudos de música com os maestros Arlindo Teixeira e Pedro Santos e com o pianista Gerardo Parente. É licenciado em Educação Musical pelo Instituto Villa Lobos.
Paralelamente ao trabalho musical, foi um dos integrantes do Grupo Sanhauá, lançando, por esse grupo, dois livros de poemas: Poema Quase Canto (1964) e Cinco Tempos do Olho (1965).
Em 1967, ganhou os 1º , 2º e 4º lugares da Feira de Música do Nordeste, realizada em Recife, Pernambuco, sendo ainda escolhido o “Melhor Autor-Compositor” pelo conjunto da obra apresentada. Trabalhou no projeto de Marcus Pereira de resgate da melhor música do país.
ORDEM UNIDA
I
já não há
não há já:
haja
a ordem!
a de ontem, onde?
o deo endiabrado deu
as ordens.
já não há
ah não já
não aja não
a ordem morde:
enquanto você
dorme
de medo
e
M 0 R R E.. .
II
enquanto você dorme
- ou morre -
a dor me percorre:
é limpa
e corta
é certa
e torta
mas é
a dor que roda
que doura:
os frutos e os
trunfos
— os triunfos,
os triunfátuos fogos
da ordem.
é a dormeordemorde
só
a mordeordemdorme.
d o r m e o r d e m o r d e n d o – m e!
III
mas a dor-dem
com que boca morde
ou
dorme com que olhos?
oh: a dor me diz
que a ordem é
que a ordem faz
de mim
o que sempre quis:
quem me morde é minha boca
quem me dorme são meus olhos.
minha dor é minha ordem!
IV
ah, corrente
que me traz nos pés:
dano
e dano
murchando!
no mais e mais
nada dó
nem doerá:
a ordem morde
ou dorfme.
mas é unida,
e vencerá...
POEMAS DO BOI SEM SINTAXE
ah, boi
eu que não fui
hoje não
sou: o que você foi
boi!
na cancela da eletricidade
no clã da terra e da idade
a cela e o toque do teclado
nos cascos:
os restos do boi jogados e
o falido boi
foi
marcado.
ferrado e morto meu boi:
(ah, boi danado)
na cerca de papel encurralado
abadonado...
somente um boi: poemorto
e sem sintaxe.
rê
rês
relho...
— assim estão as coisas, boi
sem os seus espelhos...
a esmo ensimesmado pensa
no malho:
a arma, a amarra do chocalho
prende
só as coisas de teu nome, boi
e a tua arenga!
sic sunt res: o relho
baixa nos costados, crê
assim como é a rês
o r
ou o rê...
ECCLESIA ECCLESIA
1. Pátio
a)
por onde se escoa um mar de pátio
pátio de mar, igreja, patamar
fundidos: barroco o leão
oco o barro do santo
— tosco o barro do mangue.
b)
cruz cruzada este cruzeiro
— frade reza e seu capuz —
uma igreja
(à espreita uma praia)
se espraia, traz a raiz
do que foi e do que fiz.
c)
fiz o que fiz: o poema
o troco da nota desta noite.
o nulo pulo ao não do mangue perto
igreja
onde pulula o arisco
— o risco certo.
5. Missa
a)
o sino, o silêncio
o dão e o dim
repicam missa à messe:
moça acorda/corre
mulher acorre
correm véus (vôo)
e vida.
e lida — luta — luto
e tudo e tanto:
clerical e claustro
a custo a missa.
b)
pão e vinho — vão e pinho
cristo na cruz acre e cru
cruzado corpo, corpocruz
— luz?
tilintam os tlins, o tilintar:
fim.
OLHO E CANA / OLHO DE CANA
o olho (mão e objeto)
está dentro da cana,
como se qualquer coisa
o engana.
o olho vê
— sentido oblíquo
da cana cai no rama —
centro verde sem sustento: pau
o olho tem — dentro da cana —
tecido maior do verde
se plantado.
olho sim — braço em deslize
maior ainda que o próprio jogo:
Dado.
Extraído de ANTOLOGIA POÉTICA GRUPO SANHAUÁ, org. Sérgio de Castro Pinto et al. João Pessoa: Editora Universitária/ UFPb, 1979. (Coleção Miramar, 5)
Página publicada em novembro de 2009
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