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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

JOÃO MELCHÍADES FERREIRA DA SILVA

 

(Bananeiras, 7 de setembro de 1869 – João Pessoa, 10 de dezembro de 1933), também conhecido como “O Cantor da Borborema”, foi um cantador e poeta paraibano de literatura de cordel, considerado um dos grades nomes da primeira geração de cordelistas nordestinos.

Militar aos 19 anos, foi promovido a sargento cinco anos mais tarde. Participou das campanhas de Canudos, em 1897, e do Acre, em 1903. Foi mestre da banda de corneteiros do 28º Batalhão em São João da Barra, Minas Gerais. Reformado em 1904, voltou à Paraíba onde fixou residência. Cantador e poeta popular, percorreu todo o nordeste vendendo folhetos e cantando desafios.( João Melquíades Ferreira )

(Biografia extraída de BATISTA, Sebastião Nunes. Antologia da literatura de cordel, 1977)

 

O Romance do Pavão Misterioso

 

 

1

Eu vou contar uma história

De um pavão misterioso

Que levantou voo na Grécia

Com um rapaz corajoso

Raptando uma condessa

Filha de um conde orgulhoso.

 

2

Residia na Turquia

Um viúvo capitalista

Pai de dois filhos solteiros

O mais velho João Batista

Então o filho mais novo

Se chamava Evangelista.

 

3

O velho turco era dono

Duma fábrica de tecidos

Com largas propriedades

Dinheiro e bens possuídos

Deu de herança a seus filhos

Porque eram bem unidos.

 

4

Depois que o velho morreu

Fizeram combinação

Porque o tal João Batista

Concordou com o seu irmão

E foram negociar

Na mais perfeita união.

 

5

Um dia João Batista

Pensou pela vaidade

E disse a Evangelista:

- Meu mano eu tenho vontade

de visitar o estrangeiro

se não te deixar saudade.

 

6

- Olha que nossa riqueza

se acha muito aumentada

e dessa nossa fortuna

ainda não gozei nada

portanto convém qu'eu passe

um ano em terra afastada.

 

7

Respondeu Evangelista:

- Vai que eu ficarei

regendo os negócios

como sempre eu trabalhei

garanto que nossos bens

com cuidado zelarei.

 

8

- Quero te fazer um pedido:

procure no estrangeiro

um objeto bonito

só para rapaz solteiro;

traz para mim de presente

embora custe dinheiro.

 

9

João Batista prometeu

Com muito boa intenção

De comprar um objeto

De gosto de seu irmão

Então tomou um paquete

E seguiu para o Japão.

 

10

João Batista no Japão

Esteve seis meses somente

Gozando daquele império

Percorreu o Oriente

Depois voltou para a Grécia

Outro país diferente.

 

11

João Batista entrou na Grécia

Divertiu-se em passear

Comprou passagem de bordo

E quando ia embarcar

Ouviu um grego dizer

Acho bom se demorar.

 

Veja alguns trechos do poema na voz de um cantador

http://acordacordel.blogspot.com.br/2011/04/pavao-misterioso-releitura.html

 

 

12

João Batista interrogou:

- Amigo fale a verdade

por qual motivo o senhor

manda eu ficar na cidade?

Disse o grego: - Vai haver

Uma grande novidade.

 

13

- Mora aqui nesta cidade

um conde muito valente

mais soberbo do que Nero

pai de uma filha somente

é a moça mais bonita

que há no tempo presente

 

14

- É a moça em que eu falo

Filha do tal potentado

O pai tem ela escondida

Em um quarto de sobrado

Chama-se Creuza e criou-se

Sem nunca ter passeado.

 

15

- De ano em ano essa moça

bota a cabeça de fora

para o povo adorá-la

no espaço de uma hora

para ser vista outra vez

tem um ano de demora.

 

16

O conde não consentiu

Outro homem educá-la

Só ele como pai dela

Teve o poder de ensiná-la

E será morto o criado

Que dela ouvir a fala. 

 

17

Os estrangeiros têm vindo

Tomarem conhecimento

Amanhã quando ela aparece

No grande ajuntamento

É proibido pedir-se

A mão dela em casamento.

 

               

Ilustração de Jô de Oliveira

 

18

Então disse João Batista

- Agora vou me demorar

pra ver essa condessa

estrela desse lugar

quando eu chegar à Turquia

tenho muito o que contar.

 

19

Logo no segundo dia

Creuza saiu na janela

Os fotógrafos se vexaram

Tirando o retrato dela

Quando inteirou uma hora

Desapareceu a donzela.

 

20

João Batista viu depois

Um retratista vendendo

Alguns retratos de Creuza

Vexou-se e foi dizendo:

- Quanto quer pelo retrato

porque comprá-lo pretendo. 

 

21

O fotógrafo respondeu:

- Lhe custa um conto de réis

João Batista ainda disse:

- Eu compro até por dez

se o dinheiro não der

empenharei os anéis.

 

22

João Batista voltou

Da Grécia para a Turquia

E quando chegou em Meca

Cidade em que residia

Seu mano Evangelista

Banqueteou o seu dia.

 

23

Então disse Evangelista:

- Meu mano vá me contando

se viste coisas bonitas

onde andaste passeando

o que me traz de presente

vá logo entregando.

 

24

Respondeu João Batista:

- Para ti trouxe um retrato

de uma condessa da Grécia

moça que tem fino trato

custou-me um conto de réis

ainda achei muito barato.

 

25

Respondeu Evangelista

Depois duma gargalhada:

- Neste caso meu irmão

pra mim não trouxe nada

pois retrato de mulher

é coisa bastante usada.

 

26

- Sei que tem muitos retratos

mas como o que eu trouxe não

vais agora examiná-lo

entrego em tua mão

quando vires a beleza

mudará de opinião.

 

27

João Batista retirou

O retrato de uma mala

Entregou ao rapaz

Que estava de pé na sala

Quando ele viu o retrato

Quis falar tremeu a fala.

 

28

Evangelista voltou

Com o retrato na mão

Tremendo quase assustado

Perguntou ao seu irmão

Se a moça do retrato

Tinha aquela perfeição.

 

29

Respondeu João Batista

- Creuza é muito mais formosa

do que o retrato dela

em beleza é preciosa

tem o corpo desenhado

por uma mão milagrosa.

 

30

João Batista perguntou

Fazendo ar de riso:

- Que é isso, meu irmão

queres perder o juízo?

Já vi que este retrato

Vai te causar prejuízo.

 

31

Respondeu Evangelista

- Pois meu irmão eu te digo

vou sair do país

não posso ficar contigo

pois a moça do retrato

deixou-me a vida em perigo.

 

32

João Batista falou sério:

- Precipício não convém

de que te serve ir embora

por este mundo além

em procura de uma moça

que não casa com ninguém.

 

33

- Teu conselho não me serve

estou impressionado

rapaz sem moça bonita

é um desaventurado

se eu não me casar com Creuza

findo meus dias enforcado.

 

34

- Vamos partir a riqueza

que tenho a necessidade

dá balanço no dinheiro

porque eu quero a metade

o que não posso levar

dou-te de boa vontade.

 

35

Deram o balanço no dinheiro

Só três milhões encontraram

Tocou dois a Evangelista

Conforme se combinaram

Com relação ao negócio

Da firma se desligaram.

 

36

Despediu-se Evangelista

Abraçou o seu irmão

Chorando um pelo outro

Em triste separação

Seguindo um para a Grécia

Em uma embarcação.

 

37

Logo que chegou na Grécia

Hospedou-se Evangelista

Em um hotel dos mais pobres

Negando assim sua pista

Só para ninguém saber

Que era um capitalista.

 

38

Ali passou oito meses

Sem se dar a conhecer

Sempre andando disfarçado

Só para ninguém saber

Até que chegou o dia

Da donzela aparecer.

 

39

Os hotéis já se achavam

Repletos de passageiros

Passeavam pelas praças

Os grupos de cavalheiros

Havia muito fidalgos

Chegado dos estrangeiros.

 

40

As duas horas as tarde

Creuza saiu à janela

Mostrando a sua beleza

Entre o conde e a mãe dela

Todos tiraram o chapéu

Em continência à donzela.

 

41

Quando Evangelista viu

O brilho da boniteza

Disse: - Vejo que meu mano

Quis me falar com franqueza

Pois esta gentil donzela

É rainha de beleza.

 

42

Evangelista voltou

Aonde estava hospedado

Como não falou com a moça

Estava contrariado

Foi inventar uma ideia

Que lhe desse resultado.

 

43

No outro dia saiu

Passeando Evangelista

Encontrou-se na cidade

Com um moço jornalista

Perguntou se não havia

Naquela praça um artista.

 

44

Respondeu o jornalista:

- Tem o doutor Edmundo

na rua dos Operários

é engenheiro profundo

para inventar maquinismo

é ele o maior do mundo.

 

45

Evangelista entrou

Na casa do engenheiro

Falando em língua grega

Negando ser estrangeiro

Lhe propôs um bom negócio

Lhe oferecendo dinheiro.

 

46

Assim disse Evangelista:

- Meu engenheiro famoso

primeiro vá me dizendo

se não é homem medroso

porque eu quero custar

um negócio vantajoso

 

47

Respondeu-lhe Edmundo

- Na arte não tenho medo

mas vejo que o amigo

quer um negócio em segredo

como precisa de mim

conte-me lá o enredo.

 

48

- Eu amo a filha do conde

a mais formosa mulher

se o doutor inventar

um aparelho qualquer

que eu possa falar com ela

pago o que o senhor quiser. 

 

49

- Eu aceito o seu contrato

mas preciso lhe avisar

que eu vou trabalhar seis meses

o senhor vai esperar

é obra desconhecida

que agora vou inventar.

 

50

- Quer o dinheiro adiantado?

Eu pago neste momento

- Não senhor, ainda é cedo

quando terminar o invento

é que eu digo o preço

quanto custa o pagamento.

 

51

Enquanto Evangelista

Impaciente esperava

O engenheiro Edmundo

Toda noite trabalhava

Oculto em sua oficina

E ninguém adivinhava.

 

52

O grande artista Edmundo

Desenhou nova invenção

Fazendo um aeroplano

De pequena dimensão

Fabricado de alumínio

Com importante armação.

 

53

Movido a motor elétrico

Depósito de gasolina

Com locomoção macia

Que não fazia buzina

A obra mais importante

Que fez em sua oficina.

 

54
Tinha cauda como leque
As asas como pavão
Pescoço, cabeça e bico
Lavanca, chave e botão
Voava igualmente ao vento
Para qualquer direção.
 


56

Quando Edmundo findou

Disse a Evangelista:

- Sua obra está perfeita

ficou com bonita vista

o senhor tem que saber

que Edmundo é artista.

 

57
- Eu fiz o aeroplano
da forma de um pavão
que arma e se desarma
comprimindo em um botão
e carrega doze arroba

três léguas acima do chão.


58

Foram experimentar

Se tinha jeito o pavão

Abriram a lavanca e chave

Encarcaram num botão

O monstro girou suspenso

Maneiro como balão.

 

59
O pavão de asas abertas
Partiu com velocidade
Coroando todo o espaço
Muito acima da cidade
Como era meia noite
Voaram mesmo à vontade.

 

60

Então disse o engenheiro:

- Já provei minha invenção

fizemos a experiência

tome conta do pavão

agora o senhor me paga

sem promover discussão.

61
Perguntou Evangelista:
- Quanto custa o seu invento?
- Dê me cem contos de réis
acha caro o pagamento
o rapaz lhe respondeu:
Acho pouco dou duzentos.


62

Edmundo ainda deu-lhe

Mais uma serra azougada

Que serrava caibro e ripa

E não fazia zuada

Tinha os dentes igual navalha

De lâmina bem afiada.

 

63
Então disse o jovem turco:
- Muito obrigado fiquei
do pavão e dos presentes
para lutar me armei
amanhã a meia-noite
com Creuza conversarei.

 

64

À meia-noite o pavão

Do muro se levantou

Com as lâmpadas apagadas

Como uma flecha voou

Bem no sobrado do conde

Na cumeeira pousou.

 

65
Evangelista em silêncio
Cinco telhas arredou
Um buraco de dois palmos
Caibros e ripas serrou
E pendurado numa corda
Por ela escorregou.


69

Chegou no quarto de Creuza

Onde a donzela dormia

Debaixo do cortinado

Feito de seda amarela

E ele para acordá-la

Pôs a mão na testa dela.


70
A donzela estremeceu
Acordou no mesmo instante
E viu um rapaz estranho
De rosto muito elegante
Que sorria para ela
Com um olhar fascinante.

 

71

Então Creuza deu um grito:

- Papai um desconhecido

entrou aqui no meu quarto

sujeito muito atrevido

venha depressa papai

pode ser algum bandido.

 

72
O rapaz lhe disse: - Moça
Entre nós não há perigo
Estou pronto a defendê-la
Como um verdadeiro amigo
Venho é saber da senhora
Se quer casar-se comigo.

 

73

De um lenço enigmático

Que quando Creuza gritava

Chamando o pai dela

Então o moço passava

Ele no nariz da moça

Com isso ela desmaiava.

 

74
O jovem puxou o lenço
Ao nariz da moça encostou
Deu uma vertigem na moça
De repente desmaiou
E ele subiu na corda
Chegando em cima tirou.


75

Ajeitou os caibros e ripas

E consertou o telhado

E montando em seu pavão

Voou bastante vexado

Foi esconder o aparelho

Aonde foi fabricado.

 

76
O conde acordou aflito
Quando ouviu essa zuada
Entrou no quarto da filha
Desembainhou a espada
Encontrou-a sem sentido
Dez minutos desmaiada.

 

77

Percorreu todos os cantos

Com a espada na mão

Berrando e soltando pragas

Colérico como um leão

Dizendo: - Aonde encontrá-lo

Eu mato esse ladrão.

 

78
Creuza disse: - Meu pai
Pois eu vi neste momento
Um jovem rico e elegante
Me falando em casamento
Não vi quando ele encantou-se
Porque me deu um passamento.

 

79

Disse o conde: - Nesse caso

Tu já estás a sonhar

Moça de dezoito anos

Já pensando em se casar

Se aparecer casamento

Eu saberei desmanchar.

 

80
Evangelista voltou
Às duas da madrugada
Assentou seu pavão
Sem que fizesse zuada
Desceu pela mesma trilha
Na corda dependurada.

 

81

E Creuza estava deitada

Dormindo o sono inocente

Seus cabelos como um véu

Que enfeitava puramente

Como um anjo de terreal

Que tem lábios sorridentes.

 

82

O rapaz muito sutil

Foi pegando na mão dela

Então a moça assustou-se

Ele garantiu a ela

Que não eram malfazejos:

- Não tenha medo donzela.

 

83

A moça interrogou-o

Disse: - Quem é o senhor

Diz ele: - Sou estrangeiro

Lhe consagrei grande amor

Se não fores minha esposa

A vida não tem valor.


84
Mas Creuza achou impossível
O moço entrar no sobrado
Então perguntou a ele
De que jeito tinha entrado
E disse: - Vai me dizendo
Se és vivo ou encantado.

 

85

Como eu lhe tenho amizade

Me arrisco fora de hora

Moça não me negue o sim

A quem tanto lhe adora!

Creuza aí gritou: - Papai

Venha ver o homem agora.

 

86
Ele passou-lhe o lenço
Ela caiu sem sentido
Então subiu na corda
Por onde tinha descido
Chegou em cima e disse:
- O conde será vencido.

 

87

Ouviu-se tocar a corneta

E o brado da sentinela

O conde se dirigiu

Para o quarto da donzela

Viu a filha desmaiada

Não pode falar com ela.

 

88
Até que a moça tornou
Disse o conde: - É um caso sério
Sou um fidalgo tão rico
Atentado em meu critério
Mas nós vamos descobrir
O autor do mistério.


89

- Minha filha, eu já pensei

em um plano bem sagaz

passa essa banha amarela

na cabeça desse audaz

só assim descobriremos

esse anjo ou satanás.

 

90
- Só sendo uma visão
que entra neste sobrado
só chega à meia-noite
entra e sai sem ser notado
se é gente desse mundo
usa feitiço encantado.

 

91

Evangelista também

Desarmou seu pavão

A cauda, a capota, o bico

Diminuiu a armação

Escondeu o seu motor

Em um pequeno caixão.

 

92

Depois de sessenta dias

Alta noite em nevoeiro

Evangelista chegou

No seu pavão bem maneiro

Desceu no quarto da moça

A seu modo traiçoeiro.

 

93

Já era a terceira vez

Que Evangelista entrava

No quarto que a condessa

À noite se agasalhava

Pela força do amor

O rapaz se arriscava.

 

94
Com um pouco a moça acordou
Foi logo dizendo assim:
- Tu tens dito que me amas
com um bem-querer sem fim
se me amas com respeito
te senta juntos de mim.


95

Evangelista sentou-se

Pôs-se a conversar com ela

Trocando o riso esperava

A resposta da donzela

Ela pôs-lhe a mão na testa

Passou a banha amarela.

 

96
Depois Creuza levantou-se
Com vontade de gritar
O rapaz tocou-lhe o lenço
Sentiu ela desmaiar
Deixou-a com uma síncope
Tratou de se retirar

 

97

E logo Evangelista

Voando da cumeeira

Foi esconder seu pavão

Nas folhas de uma palmeira

Disse: - Na quarta viagem

Levo essa estrangeira.

 

98
Creuza então passou o resto
Da noite mal sossegada
Acordou pela manhã
Meditava e cismada
Se o pai não perguntasse
Ela não dizia nada.

 

99

Disse o conde: - Minha filha

Parece que estás doente?

Sofreste algum acesso

Porque teu olhar não mente

O tal rapaz encantado

Te apareceu certamente.

 

100
E Creuza disse: - Papai
Eu cumpri o seu mandado
O rapaz apareceu-me
Mas achei-o delicado
Passei-lhe a banha amarela
E ele saiu marcado.

 

101

O conde disse aos soldados

Que a cidade patrulhassem

Tomassem os chapéus de

Quem nas ruas encontrassem

Um de cabelo amarelo

Ou rico ou pobre pegassem. 

 

102

Evangelista trajou-se

Com roupa de alugado

Encontrou-se com a patrulha

O seu chapéu foi tirado

Viram o cabelo amarelo

Gritaram: - Esteja intimado!

 

103

Os soldados lhe disseram:

- Cidadão não estremeça

está preso a ordem do conde

e é bom que não se cresça

vai a presença do conde

se é homem não esmoreça.

 

104

- Você hoje vai provar

por sua vida responde

como é que tem falado

com a filha do nosso conde

quando ela lhe procura

onde é que se esconde.

 

105

Evangelista respondeu:

- Também me faça um favor

enquanto vou me vestir

minha roupa superior

na classe de homem rico

ninguém pisa meu valor.

 

106

Disseram: - Pode mudar

Sua roupa de nobreza

A moça bem que dizia

Que o rapaz tinha riqueza

Vamos ganhar umas luvas

E o conde uma surpresa.

 

107

Seguiu logo Evangelista

Conversando com o guarda

Até que se aproximaram

Duma palmeira copada

Então disse Evangelista:

- Minha roupa está trepada.

 

108

E os soldados olharam

Em cima tinha um caixão

Mandaram ele subir

E ficaram de prontidão

Pegaram a conversar

Prestando pouca atenção.

 

109

Evangelista subiu

Pôs um dedo no botão

Seu monstro de alumínio

Ergueu logo a armação

Dali foi se levantando

Seguiu voando o pavão.

 

110

E os soldados gritaram:

- Amigo, o senhor se desça

deixe de tanta demora

é bom que não aborreça

senão com pouco uma bala

visita sua cabeça.

 

111

Então mandaram subir

Um soldado de coragem

Disseram: - Pegue na perna

Arraste com a folhagem

Está passando na hora

De voltarmos da viagem.

 

112

Quando o soldado subiu

Gritou: - Perdemos a ação

Fugiu o moço voando

De longe vejo um pavão

Zombou de nossa patrulha

Aquele moço é o cão.

 

113

Voltaram e disseram ao conde

Que o rapaz tinham encontrado

Mas no olho de uma palmeira

O moço tinha voado

Disso o conde: - Pois é o cão

Que com Creuza tem falado. 

 

114

Creuza sabendo da história

Chorava de arrependida

Por ter marcado o rapaz

Com banha desconhecida

Disse: - Nunca mais terei

Sossego na minha vida.

 

115

Disse Creuza: - Ora papai

Me prive da liberdade

Não consente que eu goze

A distração da cidade

Vivo como criminosa

Sem gozar a mocidade.

 

116

- Aqui não tenho direito

de falar com um criado

um rapaz para me ver

precisa ser encantado

mas talvez ainda eu fuja

deste maldito sobrado.

 

117

- O rapaz que me amou

só queria vê-lo agora

para cair nos seus pés

como uma infeliz que chora

embora que eu depois

morresse na mesma hora.

 

118

- Eu sei que para ele

não mereço confiança

quando ele vinha aqui

ainda eu tinha esperança

de sair desta prisão

onde estou desde de criança.

 

119

Às quatro da madrugada

Evangelista desceu

Creuza estava acordada

Nunca mais adormeceu

A moça estava chorando

O rapaz lhe apareceu. 

 

120

O jovem cumprimentou-a

Deu-lhe um aperto de mão

A condessa ajoelhou-se

Para pedir-lhe perdão

Dizendo: - Meu pai mandou

Eu fazer-te uma traição.

 

121

O rapaz disse: - Menina

A mim não fizeste mal

Toda a moça é inocente

Tem seu papel virginal

Cerimônia de donzela

É uma coisa natural. 

 

122

- Todo o seu sonho dourado

é fazer-te minha senhora

se quiseres casar comigo

te arrumas e vamos embora

senão o dia amanhece

e se perde a nossa hora.

 

123

- Se o senhor é homem sério

e comigo quer casar

pois tome conta de mim

aqui não quero ficar

se eu falar em casamento

meu pai manda me matar.

 

124

- Que importa que ele mande

tropas e navios pelos mares

minha viagem é aérea

meu cavalo anda nos ares

nós vamos sair daqui

casar em outros lugares.

 

125

Creuza estava empacotando

O vestido mais elegante

O conde entrou no quarto

E dando um berro vibrante

Gritando: - Filha maldita

Vais morrer com o seu amante.

 

126

O conde rangendo os dentes

Avançou com passo extenso

Deu um pontapé na filha

Dizendo: - Eu sou quem venço

Logo no nariz do conde

O rapaz passou o lenço.

 

127

Ouviu-se o baque do conde

Porque rolou desmaiado

A última cena do lenço

Deixou-o magnetizado

Disse o moço: —Tem dez minutos

Para sairmos do sobrado.

 

128

Creuza disse: - Eu estou pronta

Já podemos ir embora

E subiram pela corda

Até que saíram fora

Se aproximava a alvorada

Pela cortina da aurora.

 

129

Com pouco o conde acordou

Viu a corda pendurada

Na coberta do sobrado

Distinguiu uma zuada

E as lâmpadas do aparelho

Mostrando luz variada.

 

130

E a gaita do pavão

Tocando uma rouca voz

O monstro de olho de fogo

Projetando os seus faróis

O conde mandando pragas

Disse a moça: - É contra nós.

 

131

Os soldados da patrulha

Estavam de prontidão

Um disse: - Vem ver fulano

Aí vai passando um pavão

O monstro fez uma curva

Para tomar direção.

 

132

Então dizia um soldado

- Orgulho é uma ilusão

um pai governa uma filha

mas não manda no coração

pois agora a condessinha

vai fugindo no pavão.

 

133

O conde olhou para a corda

E o buraco do telhado

Como tinha sido vencido

Pelo rapaz atilado

Adoeceu só de raiva

Morreu por não ser vingado.

 

134

Logo que Evangelista

Foi chegando na Turquia

Com a condessa da Grécia

Fidalga da monarquia

Em casa do seu irmão

Casaram no mesmo dia.

 

135

Em casa de João Batista

Deu-se grande ajuntamento

Dando vivas ao noivado

Parabéns ao casamento

À noite teve retreta

Com visita e cumprimento.

 

136

Enquanto Evangelista

Gozava imensa alegria

Chegava um telegrama

Da Grécia para Turquia

Chamando a condessa urgente

Pelo motivo que havia.

 

137

Dizia o telegrama:

"Creuza vem com o teu marido

receber a tua herança

o conde é falecido

tua mãe deseja ver

o genro desconhecido."

 

138

A condessa estava lendo

Com o telegrama na mão

Entregou a Evangielista

Que mostrou ao seu irmão

Dizendo: - Vamos voltar

Por uma justa razão.

 

139

De manhã quando os noivos

Acabaram de almoçar

E Creuza em traje de noiva

Pronta para viajar

De palma, véu e capela

Pois só vieram casar.

 

140

Diziam os convidados:

- A condessa é tão mocinha

e vestida de noiva

torna-se mais bonitinha

está com um buquê de flor

séria como uma rainha.

 

141

Os noivos tomaram assento

No pavão de alumínio

E o monstro se levantou-se

Foi ficando pequenino

Continuou o seu voo

Ao rumo do seu destino.

 

142

Na cidade de Atenas

Estava a população

Esperando pela volta

Do aeroplano pavão

Ou o cavalo do espaço

Que imita um avião.

 

143

Na tarde do mesmo dia

Que o pavão foi chegado

Em casa de Edmundo

Ficou o noivo hospedado

Seu amigo de confiança

Que foi bem recompensado. 

 

144

E também a mãe de Creuza

Já esperava vexada

A filha mais tarde entrou

Muito bem acompanhada

De braço com o seu noivo

Disse: - Mamãe estou casada.

 

145

Disse a velha: - Minha filha

Saíste do cativeiro

Fizeste bem em fugir

E casar no estrangeiro

Tomem conta da herança

Meu genro é meu herdeiro.

 

 

FIM

 

 

Página publicada em 2014


 

 

 
 
 
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