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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


JOSÉ ANTÔNIO ASSUNÇÃO

JOSÉ ANTÔNIO ASSUNÇÃO

Natural do Rio Grande do Norte (1953), veio cedo para a Paraiba, passou a infância em Cuité, mudando-se para Campina Grande em 1967 e, em 1988, para João Pessoa onde radicou-se. Bacharelado na Universidade Federal da Paraiba em Matemática (1980), com Especialização em Lógica (1997). Nos anos 70 participou ativamente do cenário artístico-cultural de Campina Grande, integrando o grupo teatral Cacilda Becker e da revista Garatuja (1977). É Produtor Cultural do quadro da UFPB, na radio e TV universitárias.

Autor dos livros de poesia O câncer no pêssego (Ideia, 1992), A trapaça da rosa (Manufatura, UFPb, 1998), e A casa do ser (1998-2005, inédito).


"Se da Geração 59, se do grupo Sanhaua, se do Correio das Artes vieram, e vieram para ficar, expressões poéticas definitivas no nosso 'pequeno' mundo literário, talvez a mais apurada destas expressões tenha avindo da Garatuja. Quero me referir a dicção singular de José Antônio Assunção, síntese  dialética de nosso processo poético contemporâneo. O "Câncer No Pêssego", publicado em 1992, pela Edições Ler, Coleção Pasárgada, corporifica um desses momentos iluminados que fazem a alegria e o orgulho de toda uma geração."
Hildeberto Barbosa Filho, critico e poeta paraibano

 

O Dublé

 

Agora eu me expurgo de mim mesmo

Em busca do Outro em que me encarcero,

e é mais que horror o poço interno

em que eu sou duplo, quando não sou vário.

 

Onde eu sou blefe, onde sou sincero?

onde a costura no cetim-inferno,

se a cada ponto que no meu signo encerro

outro ponto esgarço, em sentido inverso?

 

Ah, Ser de angústia, Ser de desespero!

 

Terrível é o Deus que por esmero,

te criou assim para o degredo

de ser cúmplice de si próprio

e dublé de si mesmo.

 

 

As Parcas

 

(A Milton Marques Junior)

 

Por Cloto trago o carinho antigo 

que o filho de uma tecelã disse-me, comovido:

quando eu crescer, mãezinha, vou te dar

o maior tear que não existe no mundo.

 

Por Láquesis trago o amor urgente

Que o poeta jovem traz pela palavra

— porque não dobas em mim, ligeiro,

os fios-poemas de teus cabelos?

 

Já por Átropos trago o exigente afeto

que o poeta maduro tem para o seu ritmo.

Só te peço, ó Amiga do Súbito,

que não me partas o verbo a meio de um verso.


Natal 1987

 (Aos filhos Tasla e Rúlio)


O Perdido gesto
de vasculhar os sapatos
na manhã dos sinos.

Os próprios sapatos
(itinerário de ti?)
já quedam rotos
nas rugas do tempo.

É o menino antigo,
só de teimoso,
suporta o presente.


O Vínculo

Essa velha cadeira desgarrada
do quanto pra ela foi talher e exílio;
essa velha cadeira de espaldar esguio
de onde a noite (todo pai é um abismo)
contemplo o rosto de meu filho;
essa velha cadeira rúnica
a quem não me doeu acrescentar um signo;
essa velha cadeira (nunca a destruam)
comprei por um reles rútilo níquel
numa loja de móveis usados
onde ela jazia estúpida,
perdido o vinculo.

 

 

Extraído de ANTOLOGIA SONORA – Poesia Paraibana Contemporânea. João Pessoa: Edições O Sebo Cultural, 2009. Produção executiva de Heriberto Coelho de Almeida. Contendo 9 CD com gravações de poemas nas vozes dos autores, e 31 encartes em caixa de madeira. ISBN 978-278-995423

 

GARATUJA. Campina Grande, PB: 1977- 1978.  . 
        No. 3 – jan./fev. 1978     15 x 21 cm

 

nada

no princípio era o nada, o oco, o não-existindo

águas e terras e águas
não havia, nem árvores.
aves e pedras e aves
não havia, nem nuvens.
vozes e ervas e vozes
não havia, nem zeros.

nem trevas havia, mesmo luzes.

pois no princípio era o oco, o nada, o não existindo.
mais vago ainda:
no princípio não era

 

o ovo

sociedade fechada que
às vezes
arrebenta em pinto
o ovo
(envolto
na impermeável
atmos fera da dúvida)
é a sempre
possibilidade do novo.

a grande náusea humana: o ovo podre.

 

insinuações do bar

único no bar,
o último bar da noite.
e não embriaguei, ainda,
metade de minhas dores...

garçom
e olha de garçom
corteja-me
seus olhos de gorjeta

 

saindo para o baile

a janela aberta
para o suicídio
mas eu sou difícil
de morrer.

porisso me visto
me calço

me esforço
de gravata-borboleta (morta);

 

digressões
em torno da gravata

  1.  laço (ou nó) social
    a gravatas
    agarra o homem
    pelo pescoço.
  2.  cabresto sofisticado em seda
    e gravata
    sufoca menos o pescoço
    que essa região do grito:
    a garganta.
  3.  grave
    sobretudo grave
    a gravata
    agrava
    a vida.

 

 

poema-jornal II

 

a preta deolinda maria de jesus  
[36 anos e o maior Busto do bairro]
rogou, em fervorosa prece a sto. Antonio
que, fosse merecedor de uma graça,
lhe mostrasse (o santo) homem para casar.

 

a preta Deolinda maria de jesus
até esse então não achou marido.
mas andam espalhando as más línguas
que, já de uns tempos,
vem de chamego
com um tal joão meganha.

 

 

poema-jornal I

 

bom pai bom filho bom esposo.
além de bom pai bom filho bom esposo,
excelente funcionário
da caixa econômica federal.

 

um dia (e ninguém percebeu o motivo)
abriu a janela do apartamento e
jogou-
s
e
catorze andares mundo abaixo.

 

e os parentes (de quem era bom parente)
e os amigos (de quem era o melhor amigo)
ficaram a repetir a ladainha;

 

bom pai bom filho bom esposo
além de bom pai bom filho bom moço,
excelente funcionário da caixa

Página publicada em novembro de 2009, a partir do material cedido pelo Editor.

 


 

 

 
 
 
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