|   WILSON DA SILVA NUNES         Wilson da Silva Nunes (Belém, 23 de janeiro de 1919 — Brasília, 6 de janeiro de 1989) foi  um economista, jornalista, poeta e escritor brasileiro.   No ínicio de 1960 por  ser funcionario publico federal, mudeu-se com a família para nova capital  federal Brasília, onde chegou um pouco antes da inauguração oficial.   Foi membro da  Academia Brasiliense de Letras.         DEZ ANOS DE POESIA E UNIÃO. ANTOLOGIA 1988.  Brasília: Casa do Poeta  Brasileiro – Poebrás – Seção de Brasília, 1988.   226 p.  15,5x22,5 cm.         Capa:  pintura de Marlene Godoy Barreiros.  Ex.  bibl. Antonio Miranda     MARIA LÚCIA     Dá-me, Lucinha, o delicado laço, Que adorna tua cabeça graciosa,
 E, em troca dele, sobre teu regaço,
 Desfolharei uma singela rosa.
   Quero, apoiado no teu níveo braço, Seguir da vida a estrada sinuosa,
 Não sentirei, assim, tanto o cansaço
 Do meu viver, da sina desditosa.
   Um dia perguntei à consciência, De que se acaso viesse te perder,
 Suportaria a dor de tua ausência;
   e respondeu-me, então, (voz comovida): —Como sem ela poderias viver, Sendo a razão de tua própria vida?
         TEUS OLHOS   Teus olhos azuis são lagos serenos, Que em noites de lua refletem o luar,
 E as auras que passam em beijos amenos
 As águas de prata, vêm calmas, frisar.
 
 Teus olhos azuis são ninhos pequenos, Em cujo calor é tão doce o amar! Se choras, o pranto, nos seios morenos, —Cascata de amores —, se vem espraiar.
 Pudesse algum dia transpor mil escolhos, Chegar junto a ti, mirar-me em teus olhos,
 E neles depor meu beijo de amor
   Confesso, querida, se a lua deixasse Que cheio de afeto o sol a beijasse,
 Jamais o faria com tanto calor.
       TUA GRAÇA     No teu rostinho a  soberana graça, Veio morar com todo seu esplendor,
 E é tua boca cristalina taça
 Cheia do aroma de singela flor.
   Permita Deus que a  sombra da desgraça, Nunca anuvie teu rosto encantador,
 Que sempre puro, sem nenhuma jaça,
 Possa ostentar seu divinal frescor.
 No teu sorriso  angelical e terno, No teu olhar suave e transparente,
 Tens o segredo de um encanto eterno,
   E ai de mim! que sem  saberes vivo, Com a tua imagem presa à minha mente,
 E o coração sempre a teus pés cativo.
         INGRATA 
 Quando tu passas  airosa, Ó meiga virgem formosa,
 Dileta flor desta aldeia;
 Tu espalhas teu perfume
 Que me deixa com ciúme
 De tudo que te rodeia
   Quando corres nas  campinas,Sob teus pés as boninas,
 Beijam-te as pernas perfeitas;
 Ai de mim que tão sozinho,
 Vivo implorando um carinho,
 Que tu, sem pena, rejeitas!
   Inda hoje tu passaste E nem sequer me olhaste,
 — Eu que vivo a te adorar! —
 Talvez com vago receio,
 De ver nascer no teu seio,
 Uma vontade de amar!
   Numa noite constelada Cantaste gentil toada,
 — Fez chorar o peito meu! — No céu a lua serena,
 De mim, — quem sabe? — com pena,
 Entre as nuvens se escondeu.
         SAUDADE (aos meus amigos)     Quando o sol nasce por detrás  do monte Vem refletir na cristalina  fonte, A face bem louçã E a ave que dormia no seu  ninho Desperta e vem pra beira do  caminho, Saudar o albor da manhã.    E pelo dia afora na amplidão  da mata Ora alegre, ora triste, o gorjear desata
 Como sentido pranto
 E quando o sol declina no poente
 Inda se ouve ao longe, docemente
 
 Mas cai a noite. E a melodia suave,
 Dessa canora e fugitiva ave,
 Cessou de se escutar;
 É que à noite a ave volta ao ninho,
 Que ela teceu com maternal carinho,
 Para dormir e sonhar.
   Assim eu vivo, cantando  minhas dores As graças da mulher, seus  lânguidos amores Como o perfume da flor; Mas quando um dia dormir meu  sono eterno Nunca mais  se ouvirá meu canto terno Nos meu versos de amor.     Se neste livro que te é  dileto Leres meus nome  com sentido afeto, Ou simples amizade; Fale-te à alma minha triste  estória, E em homenagem à minha vã  memória, Sintas de mim SAUDADE.      MÃE (Antologia). Capa: Sônia Gonçalves Dias. Brasília.  DF: Casa do Poeta Brasileiro   (POÉBRAS)  Seção Brasília, 1983.  200 p.   Ex. doação do livreiro Brito, Brasília, DF
                 “O CORAÇÃO MATERNO É UM ABISMO  NO FUNDO DO  QUALSEMPRE SE ENCONTRA O PERDÃO.”
 H. Balzac
  PRECE DA MÃE 
 Oh! meu Deus! quanta  bondade,
 Concede-me neste dia,
 Reina em minh´alma a  alegria,
 Vibra meu peito de amor:
 Debruço-me sobre um  berço,
 E vejo — que quadro  santo! —
 Dormindo com meigo  encanto,
 O fruto da minha dor.
 
 Tendo os olhinhos fechados,
 Repousa num sono calmo,
 Ouvindo, talvez, um  salmo,
 Cantado por serafim,
 E ao vê-lo, assim, tão  sereno,
 — Alma pura como um  lírio! —
 Mal contenho meu delírio
 Fico a olhar meu  querubim.
 
 Tem a boquinha pequena
 E a face tão carminada,
 Que parece da alvorada,
 O sanguíneo despertar;
 Erguendo o olhar para o  céu
 E desfiando o meu terço
 Deixo cair sobre o  berço,
 As contas do meu rezar.
 
 Peço a Deus que essa  criança
 Cresça for e bem sadia,
 Que seja minha alegria,
 Terna amiga de seus  pais,
 Depois do assim ter  rezado,
 Tiro-a de dentro do  leito,
 Aperto-a muito a meu  peito,
 Para afaga-la ainda  mais.
 
 
 MÃE
 
 Quer a mágoa  a aflija ou a dor a oprima
 Amor de mãe é celeste  esmola
 É incenso sutil que se  lhe evola
 E sobe perfumado céu  acima.
 
 Com que carinho ela me  anima
 Se dos meus olhos o  pranto rola!
 Se ela tem a palavra  que consola
 Só ela tem o gesto que  lastima.
 
 Se às vezes estou só pela dor coberto
 Chamo-a  e eis que ela num momento certo
 Apaga a dor que o  coração sufoca.
 
 É para mim o mais  sublime anjo
 De bondade..  Maravilhoso arcanjo
 Que a minha dor pelo  sorriso troca.
 
 
 MINHA MÃE
 
 Quando não  mais me for dado
 Ouvir o canto dos  pássaros
 E as vozes da floresta
 Ouvirei contudo a voz  de minha mãe
 A me chamar como uma  casa em festa.
 
 Quando ainda meus  lábios forem selados
 Pela mudez do silêncio
 De onde eu me encontrar
 Por minha mãe chamarei
 E ela virá me olhar.
 
 Quando a morte selar as  minhas pálpebras
 E a mão pesada do fim  me alcançar
 a minha mãe eu verei
 E ela virá me amar
 E junto a ela estarei.
 
 Quando a noite da morte  chegar
 E ao deixar o mundo num  gemido
 se eu apenas for uma  saudade
 Nos braços de minha mãe  querida
 Quero que comece para  mim a eternidade.
 
 
 IN MEMORIAM
 MINHA MÃE
 
 A sala  armada e minha mãe no meio,
 Estava branca como a  branca rosa,
 Que sobre se adormecido  seio
 Eu vim depor com fé  religiosa.
 
 Por muito tempo com  sofrido anseio
 Pus-me a beijar a sua  mão bondosa,
 Que — quantas vezes ! —  o infantil receio
 Me agasalhava em noite  tormentosa!
 
 Era ela, sim! A morte impenitente
 Roubara ao meu carinho  o frágil ente
 — Sagrada dona dos  afetos meus.
 
 E assim nos separando a  dura sorte,
 Dentro em mim reavivou  a fé mais forte
 De sabê-la feliz bem junto a  Deus.
 
 
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 Página  ampliada e republicada em setembro de 2023
 
 
       Página  publicada em outubro de 2020   
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