Engenheiro civil, compositor e poeta. Reside em Belém do Pará.
“... vem, no plano da linguagem escrita como obra de arte e como cultura e como cultura, exceder assustadoramente em originalidade...” Mário Fabino Ponte Souza
“Em A encarnação do bar – um cão vermelho engolido em luz amarela, está o poeta completo equilibrando suas vertigens e vísceras, permeado da luxúria de ser — total, amazônico, brasileiro, desde Beruri: igarapé de versos, publicado em 1989.”
Marcos Quinan
Estado de graça
Escurece quando a guilhotina me corta
A porta aberta
O berro e as comportas
A natureza não está morta
Invariavelmente ela é torta
sem sorte
sem porte
Alegre como o povo que cerca o patíbulo
Que balança o turíbulo e a toga
A saga do amor violento
do instinto
na cabeça
Escurece quando tenho de me desculpar ao carrasco
E quando sinto asco
Me abalo em salamaleques
Abanando os leques nas vertigens
Deixando em cada sonho
A impressão de que não vivi
Ave inexplicável
O que mais é pássaro neste peixe
Tem escamas douradas e lantejoulas
Adornando as bordas do chafariz
O mais é o vício do incomensurável
Medindo o cumprimento de viver
Sem traumas - sem trompas - sem pudor
O conforto do pandeiro batucado
Reluz como prata lustrada
No sol de enredo carnavalesco
E enfeita com duvidosa plumagem
As ouças de louça das patativas
o que é mais pássaro neste conforto
Passa como o vício do carnaval
E acaba sem qualquer explicação
Nós
Eu contido no verso
Tu contida no avesso
Nós
Incontidos e entrelaçados
Entre a razão e a omissão do grito
Qual de nós é mais bonito?
Quem de nós é mais aflito?
Eu
Incontido no avesso
Avexo as lágrimas da partida
Tu
Incontida no verso
Controlas o peso da despedida
Qual de nós conhece a vida?
Quem de nós é mais ferida?
Segundo
Entre mim e a minha boca
Há uma reclamação
É parco o que escrevo
Porque há um escravo cravado na minha mão
Sou acha e lenha
Preso nos varais do andor
A minha dor não está nas escadas
É lata amassada ao chute do moleque
ao breque do brega
É cheia e lua - por quem sabe
Mais minha que tua
Pacto
Todos os dias o bar me toma
Para beber a minha alma
Embriagar o meu poema
É um pacto religioso
Com o demônio dos bêbados
Um gole de vidro picado
Uma taça de
Um copo derretido
Para derramar a mágoa
Que afaga os vícios da felicidade
Todos os dias
A minha alma
Bebe um bar