WALTER SEBASTIÃO
Walter Sebastião Barbosa Pinto Nasceu em Juiz de Fora, MG. Jornalista graduado pela UFJF, crítico de arte do jornal Estado de Minas, trabalhou como repórter no jornal Tribuna de Minas. Foi curador de várias exposições, entre elas Imagens Brasileiras, no Museu de Arte da Pampulha; A Linha no Espaço, no Museu Mineiro; Cor e Luz, no Espaço Cultural Cemig, em Belo Horizonte; Amor, Doce Coração da Minha Vida, Casa Guignard; Identidade Virtual (evento paralelo à reunião do Mercosul), Ouro Preto, MG; e Prospecções Arte nos Anos 80 e 90, Palácio das Artes, Belo Horizonte. Participou de equipes de seleção de projetos para exposições no Palácio das Artes, Itaúgaleria, Espaço Cultural Cemig e Centro Cultural da UFMG, todas em Belo Horizonte, e na Funarte, no Rio de Janeiro. Tem publicações na Revista Galeria e Revista Guia das Artes, São Paulo, catálogo do Grupo Corpo, Belo Horizonte, catálogos e livros de vários artistas, entre eles: Prospecções: arte nos anos 80 e 90. In: RIBEIRO, Marília Andrés e SILVA, Fernando Pedro da. (Org.). Um Século de História das Artes Plásticas em Belo Horizonte. Belo Horizonte: C/Arte: Fundação João Pinheiro/Coleção Centenário, 1997. Fonte: www.comartevirtual.com.br
Tenho andado com idéias aéreas
com idéias embaraçadas nos cabelos
(que tenho de cortar mas nunca me lembro).
esqueço datas, nomes e antepassados
com a caneta na mão ando em todas as direções
anotando vidas alheias à minha
numa lógica que não é a minha e que acredito
não seja a das pessoas com quem converso.
imóvel, sentindo o chumbo das limitações
fico com aquela cara das pessoas que estão na rodoviária
preso ao chão por malas, trouxas e crianças
mas levitando solto, muito solto,
ao lado de um foguete que esta a quilômetros dali.
entre eu, a viagem e o preço da passagem
permaneço disperso, muito disperso,
na linha de produção que me fabrica.
lança
(artes II)
tão novo alguém o andar humano
nenhum ninguém bicho quase ainda
só sopro do fogo do laico sol.
pé de um ponto ao outro: quase destino
enigma entre outras coisas que se movem
ela, ela, roda, nuvens
chamo a cidade para construir o milênio
(às vezes o raio destrói a torre e corta a língua)
ou então solenes e silenciosos sobem e descem dos céus
(a guerra, às vezes, amputa braços e pernas das criaturas)
distraídas a limpar o jardim ou a sondar crimes de amor
(o ser diz sim e diz não oscilante).
o dia condensa o início e o fim
e dormindo ou acordado molda a mesma argamassa:
é tudo teatro mais do que a dita vida é.
e, ao passar, ao ultrapassar, a palavra escapa
(os jornais celebram a véspera e o dia seguinte)
recém criada e ergue a lança e o poema
Extraídos de POESIA EM MOVIMENTO – ANTOLOGIA, org. de JORGE SANGLARD. Juiz de Fora, MG: EDUFJF, 2002. 224p.
Errante grafia (poemas). Fotografias: Luiz Antonio da Cruz. Tiradentes, MG: Mandala Produção, 2023. 88 p. ilus. Col. ISBN 978-65-89s445-09-8 Ex. bibl. Antonio Miranda
chega!
e, bem ali, destroçados.
foi-se ela, foi ele, foram-se.
e nós com eles pela enxurrada.
meteorito o ser passou.
e parou tão assim, a esmo, ali.
é isso? é isso? até quando?
basta!
filho irmão amigo protesto:
abaixo o machismo, a lgbtfobia
e o racismo!
grafia
eu, isto é, vagabundo ser humano.
digo: resíduos de outros eus meus e teus,
ou melhor, errante grafia.
nós, isto é, a rota tecida por todos
digo: por luzes e também becos obscuros
ou melhor, por fantasias da fome.
ela, isto é, a cor que chama a existência.
digo: que acorda ou dorme junto com a luz,
ou melhor, que se aporta nas frutas
nós, isto é, livros, filhos e árvores.
digo sal da terra, sul, florestas em chamas,
ou melhor, prole de espécies extintas.
humano
anda o humano sobre o palco
à frente, junto, fora de si, todo dia.
sempre alguém, quem? Ninguém etc.
reveza o mundo a cada passante
com inconclusas excêntricas figuras
metade gente metade sonho.
alma, roupa, cabeça em órbita,
devaneia ( inexplícito ) um além.
e outro alguém, quem? ou ninguém,
pausa. água e aguardente
até que a noite feche as cortinas
e outros espetáculos comecem.
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rito
a mulher coroada de estrelas exibe raios saindo da mão,
a trança e depois o manto azul (e pisa na serpente)
em outro dia dilacerada abraça o homem, nu, que sangra
(quando teve sede lhe deram vinagre)
um pano cobre o sexo do morto e deixa ver o corpo ferido
que está ali como o de todos os outros homens presentes.
um rubi brilha na ponta de um fio de sangue congelado
e se apaga. todos cantam e enumeram então os santos...
o argumento do arrependimento comove a fera.
(só mãos impuras fundem as joias da ladainha).
a face sombria e a iluminada selam o pacto.
a manhã, mas também o fim do dia traz a diabólica fé.
paisagem
essa paisagem
aquela cerca
cruzes dizendo é aqui
onde exatamente?
o que não é música
o que não cabe em si
o cavalo que nem alado é.
explícito, minúsculo.
letra, cruz, cicatriz,
pequenos ramos sem flor.
um lá insubmisso tatuado.
finito, infindo verão.
DIMENSÃO – REVISTA INTERNACIONAL DE POESIA. ANO XX – No. 30. Editor Bilharino. Capa; Visual de Gabrile -Alfo Bertozzi. Uberaba, Minas Gerais, Brasil: 2000. 200 p. No. 10 787 Uberaba, MG – Brasil. Capa: Visual de Gabriele-Aldo Bertozzi. Editor: Guido Bilharino 200 p. Ex. biblioteca de Antonio Miranda
e não faz de sua palavra uma cidade
ao acaso. tebas. babel. canudos: cicatriz
ou tatuagem na pele? quem te vê?
um lugar fora do livro fechado. sobre
meu corpo a memória acesa quer saber
quais são as armas do poeta.
sobre o abismo dez legisladores pres-
sentem seus desígnios: tatuagem corrosiva
na engrenagem das palavras.
imagem por trás da imagem de relógios
quebrados.
DIMENSÃO. Revista Internacional de Poesia. Ano XV. No. 24. Editor Guido Bilharino, Uberaba, MG: 1995. 150 p.
Ex. biblioteca de Antonio Miranda
eu vejo sempre as pontas as garras
mesmo onde me mostram uma natureza morta
(logo quero saber quem matou)
pressinto o perigo como um animal,fome
de absoluto,bote armado,e um outro sentido
(a olho nu?um tiro no escuro?o que fazer?
e em troca de minha cabeça me oferecem
a posição de guarda-costa,nome do nome,padrão
de identidade que interdito entre versos acesos.
seus ossos,meus ossos,tudo serve para mim
tenho uma intuição que me diz que a fome
(de absoluto)é a mãe da poesia.
página ampliada e republicada em abril de 2024
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Página ampliada e republicada em abril de 2023
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