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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

Foto:  Eder Chiodetto

CAMPOS DE CARVALHO

 

Walter Campos de Carvalho (Uberaba, 1º de novembro de 1916 – São Paulo, 10 de abril de 1998), foi um escritor brasileiro. Em 1938 formou-se em direito, tendo se aposentado como procurador do estado de São Paulo, onde viveu em companhia da esposa Lígia Rosa de Carvalho.

Sua vida sempre esteve ligada à literatura, tendo publicado inicialmente Banda forra (ensaios humorísticos), em 1941, e Tribo (romance), em 1954. Mais tarde, escreveu os romances A Lua vem da Ásia (1956), Vaca de Nariz Sutil (1961), A Chuva Imóvel (1963) e O Púcaro Búlgaro (1964), hoje considerados verdadeiros marcos da literatura brasileira. A Lua vem da Ásia e A Chuva Imóvel chegaram a ser traduzidos para o francês.

Campos de Carvalho, como ficou conhecido no meio literário, também colaborou com O Pasquim e trabalhou no jornal O Estado de S. Paulo, no período de 1968 a 1978.

Em entrevistas, o escritor adotava sempre uma postura clown.

"Nasci clown e morrerei clown, embora a vida toda tenha sido um mero funcionário público. (Todos os funcionários públicos são meros, quando deveriam ser melros). Sou eternamente grato a um crítico que certa vez me chamou de clown (nem a minha própria mãe me chamou assim) — como sou grato aos que me chamaram de palhaço com segundas intenções ou mesmo com terceiras. Antes de morrer ainda hei de armar o meu pavilhão auricular, isto é, dourado, em todas as praças do mundo e dele partir como um bólido rumo a todas as constelações, pregando a hilaridade e a língua de fora à boa maneira de Einstein e dos enforcados: ASSIM!" — Cf. "Os Anais do Campos de Carvalho". In: O Pasquim

"Há quem me tome por louco e eu mesmo já me tomei. Mas basta uma visita ao hospício para me convencer — desgraçadamente — do contrário. É como se fosse um lobo vestido com a pele de um cordeiro: expulsam-me só pelo faro. O título do livro que estou escrevendo no momento é exatamente Maquinação da Máquina, Especulação de Espelho. Assim como a 4ª Sinfonia de Charles Ivens exige a presença de três maestros para ser bem interpretada, assim também penso que esse meu novo livro, para ser bem compreendido, deva ser lido simultaneamente por três leitores". Revista O Cruzeiro, 30 de outubro de 1969. Fonte: wikipedia

*****

Apresentado recentemente — na edição de seu enigmático livro " A Chuva Imóvel" (2017) pela Confraria dos Bibliógrafos do Brasil — como sendo (?) um autor desconhecido ou esquecido — mas venerado por uns poucos! — Campos de Carvalho foi então ressuscitado, ou melhor reeditado. O conto (? ) imemorial, eu diria que é mais bem proesia. Ateu, na contramão da escrita tradicional. Daí porque celebramos a edição feita por nosso amigo Salles para comemorar os cem anos do autor, que nasceu em 1916 e faleceu em 2016, destacando uma "passagem" do referido livro para apresenta-lo neste Portal de Poesia ... Sem dúvida! ANTONIO MIRANDA

 

CARVALHO, Campos deA Chuva Imóvil.  Ilustrações de Maringelli.  Brasília: Confraria dos Bibliófilos do Brasil, 2017.  79 p. + f. ilus. p&b   x  cm.  Aconcionado em caixa. Exemplar especial não numerado, col. Antonio Miranda.  

 

         Vomitei um pouco de latim e já me sinto melhor.
Saiu-me em for de um grito: Aristeu voltou-se
em sobressalto, a cabeça do chefe apontou na porta
de vidro — até as paredes se puseram lívidas.
Ainda bem que Diomira estava no lavatório.

         Necessito urgentemente de umas férias,
definitivas como as que toma um morto:
ou gostaria ao menos que me enterrassem
por uns tempos, como aquele faquir
que bateu o recorde de jejum dentro de um esquife:
apenas um tubo de borracha para,
entre um tédio e outro, mandar o mundo à.

         Também a hibernação artificial, numa câmara frigorífica,
me servia e sobretudo se me esquecessem lá dentro,
para só despertar daqui a cem ou duzentos anos,
com as novidades todas para contar e não ouvir.

         Ainda vou escrever a uma sociedade científica
oferecendo-me em holocausto, os russos sei
que adorariam esses tipos de experiência,
se necessário me naturalizo russo, aprendo russo
para depois calar-me o tempo todo.

         Assim como está sé que não é possível:
hoje foi o latim como poderia ter sido o grego
ou o sânscrito, amanhã será a trigonometria
ou a guerra do Peloponeso, o Manual de Civilidade
ou a Bíblia: e o pior sé que não me levam a sério
e ainda me repreendem.

         Estas folhas de papel em branco, a obrigação
de data-las em cima e à direita, "Prezado senhor",
e isso e mais aquilo,
e as vírgulas todas no lugar,
os dedos batendo em "allegro" de Mozart
e as palavras brotando indecorosas do outro lado:
não há fígado que resista e muito menos útero
— e ainda menos sum útero que sem sequer sai
nas radiografias, assim delicado e ub´quo,
cada dia grávido de uma coisa e de tantos
mistérios:
a maldição de ter nascido
André e Andréa, num tempo só
e girando na mesma órbita!

 

BILHARINHO, Guido.  A Poesia em Uberaba: do Modernismo à vanguarda.  Uberaba:  Instituto Triangulino de Cultura, 2003.  336 p.                                                       Ex. bib. Antonio Miranda


mensagem

Há que haver os loucos,
Os alucinados, os videntes,
Cujo lúcido espírito não repouse como um cadáver
Sobre este mundo visível e as verdades consagradas,
E cuja voz profunda exprima o eco e as flutuações
Das água eternas e inaudíveis
Que são o destino de todos os barcos.

Há que haver os que despertam à meia-noite,
Angustiados,
E põem-se a gritar e a clamar dentro das trevas,
Como uns loucos — não o sendo —
E exprimem numa linguagem que não é a sua,
Nem a dos seus pais,
Nem a de qualquer outro povo da terra,
Estranhas visões inacessíveis gravadas em suas retinas,
E depois serenam como o mar após a tempestade
E não sabem mais recordar aquilo que disseram,
E choram quando lhes mostram seus puros êxtases,
E sentem-se miseráveis despertados.

Há que haver os que deixam que suas finas mãos de marfim,
Pálidas, sinuosas, quase fluídas,
Se arrastem como profetas pelo deserto das longas pautas
E inconscientemente, totalmente a cegas,
Gravem para a eternidade, com num frio rochedo,
Palavras de fogo e de sangue,
Ânsias, ódios, espantosos desesperos,
Para se admirarem depois, eles  próprios, do que escreveram,
Como sonâmbulos que, de repente e sozinhos,
Despertassem vivos sobre o cume de inatingíveis montanhas
E não mais soubessem o caminho que os conduziu a tão altas
[ paragens,
Tão perto dos deuses.

Há que haver os que abandonam lar, pátria, amigos, cidades,
Velhos hábitos e confortos seculares,
E sem levara nada de seu,
Apenas sua consciência desarvorada e lúcida,
Põem-se a perseguir novas e estranhas verdades, como
[ hipnotizados,
E não repousam e dormem mais, em sua peregrinação,
Noite após noite, sol após sol,
Até que sintam a paz descer como um bálsamo sobre as sua chagas
E vejam mais nítido dentro da própria alma
E se reconheçam pela primeira vez em sua esplêndida nudez,
Como o amante à amante no momento supremo da posse.

                                                                           Novembro 1948


confiteor

Onde os meus anseios de ainda há pouco?
Onde a minha profunda humildade,
A nostalgia de meu passado distante e perdido,
Dos meus primeiros sonho e arroubos de infância,
De minha alegria imensa e pura, toda sem mácula,
De minha crença tão perfeita, inconsútil?
Onde?

Por que volto a me olhar com estes olhos frios,
Como a um criminoso,
E assim me acuso e firo eu mesmo, sempre,
Sem piedade,
Tentando em vão achar nos meus traços o sangue e o rastro
De todos os facínoras que me precederam um dia,
Como se busca uma furtiva imagem diante do espelho?
Por quê?

Se já não me pertenço,
E nem sei mais ao certo o que ainda penso e ainda desejo,
e sou tão estranho a mim como o é um sonâmbulo
Ou uma vaga sombra sobre um vago muro,
Que poderei então dizer aos homens e ofertar-lhes,
Numa preciosa dádiva, solene e única,
A que nem a poeira do tempo jamais possa poluir
Nem venha a sepultar um dia, como à Esfinge?

Que terei eu?

Rumores há, porém, que me previnem
Que nunca fui nem hei de ser mais o Poeta
Ou o Messias anunciado pelos antigos profetas,
Pois que também eu trago em mim, no fundo do meu ser,
A infausta semente do meu próprio cadáver,
Qual uma fina pérola que brilha e que envenena
E que seduz aos homens sem lhes dar nenhum proveito.
Ninguém o foi jamais, nem eu também o sou,
Esse divino ser por que ainda anseiam os que têm se de
[ Beleza:
Sou e serei apenas, como vós, um monstro.

Dezembro 1948.

*

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Página ampliada e republicada em maio de 2022

 

Página publicada em julho de 2017


        



 
 
 
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