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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



ROSARIO FUSCO

Rosário Fusco de Sousa Guerra (São Geraldo, 19 de julho de 1910 — Cataguases, 17 de agosto de 1997) foi um escritor e advogado, tendo escrito poemas, peças de teatro, romances e ensaios.

É reconhecido pela crítica como o verdadeiro precursor do realismo fantástico. Gênio incompreendido, dotado de um temperamento vulcânico e polêmico, viveu a vida e a literatura de forma intensa e apaixonada.

Foi um dos mais importantes integrantes do "Movimento Verde" que editou, em 1927, em Cataguases, a Revista Verde. Atuou ao lado de Enrique de Rezende, Guilhermino César, Francisco Inácio Peixoto e Ascânio Lopes Quatorzevoltas.

 

A seguir, três poemas do autor, dois deles extraídos da antologia organizada por Assis Brasil — A POESIA MINEIRA NO SÉCULO XX (Rio de Janeiro: Imago, 1998), —exemplar enviado por Aricy Curvello para a Biblioteca Nacional de Brasília.
 

POEMAS CODAQUE

 

Juiz de Fora

 

Manchester das minas gerais.

O crepúsculo escorrega violentamente

                                               e cai

na paisagem de cartão-postal

e nos olhos espantados do Cristo-do-Morro. 

 

Paisagem n. 2

 

Uma hora.

O dia parou com o meu relógio.

 

Nem uma folha só planta ruídos.

Nada.

 

E eu fico pensando na ingenuidade daquele homem alto

que fala muito rouco

tosse

tosse

tosse

e vive a vida à toa

quentando sol o dia inteiro. 

 

Rio de Janeiro

 

Os meus sentidos são um menino.

 

(In Verde, n. 2, 192)

 

 

FAZENDA

 

A voz vem do fundo do mato

que está querendo escurecer, devagarinho...

O machado não pára mesmo

e a gente ouve ele longe, batendo!

 

O silêncio sobe do chão molhado de sereno

a noite se desmancha, lenta, nos caminhos...

Do céu pingam estrelas em cima da casa,

pela greta da telha a gente vê

 

Silêncio.

 

(Agora é o morro que parece que foge, toda vida...)

 

Mas por cima da mataria espessa e úmida

começa a crescer em clarão luminoso tão grande

que em breve irá encher de luz a capoeira toda

onde um sapo tanoeiro — pan — vai começar a função. 

                  

                   (Fruta de Conde, 1929)

                                     

 

DOMINGO

 

Gosto de ouvir uma sanfona bem tocada...

Nem negros estradeiros na pinga, nem capinas, nem apanhas de café,                                             

nem o chiar tristonho dos carros de bois descendo a encosta,

nem cantigas dolentes

de negras que lavam

nas lajes do rio.

 

Nem barulho, nem ruído. É o jogo de malha na estrada

                                                                            [ limpinha

sem perigo de Fordes, e o buso, e a bisca, e o marimbo

                                                                       [ no alpendre,

com o administrador da fazenda;

e o café lavadinho secando no terreiro - que é um gosto se vê,

e o latir brabo dos cachorros caseiros, dos cachorros que latem

quando passa estrangeiros à beira da estrada.

 

Nem o "eia" imperativo dos carreiros peitudos carreando,

nem jardins, nem cinema, nem o rádio fanhoso da gente

                                                                             [ da cidade...

Mas a sanfona dolente que enche de desejo o sangue

                                                                          [ dos mulatos,

mas o vento musgueiro dos arrozais loiros, cacheando,

mas a visita das moças da cidade, moças esganadas por frutas,

moças que linham com a gente só por causa de mexericas

                                                                                     [ graúdas...

Este é o meu domingo.

Domingo mineiro, domingo bom, domingo da fazenda

onde passei minha infância...

 

Nem trabalho, nem ruídos, nem o tinir das lampianas,

nem o aboio triste dos vaqueiros, nem tocaias, nem brigas,

nem capoeiradas, nem nada...

Mas a alegria e o descanso das obrigações cumpridas

e o riso - criança da satisfação das coisas...

 

 

*publicado em 1927 na revista Verde, de Cataguases, vindo depois a

 integrar o livro POEMAS CRONOLÓGICOS,  de 1928.

 

 

 

WERNECK, Ronald.  Sob o signo do imprevisto: Rosário Fusco por Ronald Werneck.   Cataguases, MG: Poemação produções, 2017.  128p.  14x21 cm.  Capa: Dounê Spínola.  Ex. bibl. Antonio Miranda.  Inclui também poemas de Rosário Fusco e de outros poetas.

rosário fusco o que foi físsil
rosário fósforo foi-se de fato
fora do rastro do que já foi
 sim porque nunca foi
rito rosto rateio ritmo
rumo ruminação relíquia

 

         SERÃO INTERIOR

         O silêncio pesava sobre a descor
         das paredes comprimidas.
         Eu sozinho — entre livros de estudos —
         lia as viagens de Sindbad.
         Mamãe chamava pro café das oito...
         Depois eu voltava de novo por quarto, pros livros
         e praquela vontade danada de ser grande
         pra correr mundo também...
         Hoje o silêncio inda pesa sobre a descor
         das mesmas paredes comprimidas...

         Já sou homem quasi
         e sozinho — entre livros de estudo —
         fico pensando na ingenuidade boa do meu tempo
         de viagens maravilhosas...

         Depois paro um pouquinho
         mas não ouço mais a voz de mamã chamando pro café,
         e tenho uma vontade doida de ser criança outra vez
                   pra não ficar pensando nessas coisas feias
                   que gente grande gosta de pensar...

                   (Poemas cronológicos (Verde Editora, 1928))

 

DUAS DÉCADAS DÉJÀ
          
Um Rosário vale três terços.

fulgor fugaz
que se partiu
rosa rio rosário
duas décadas déjà
prosário proa
prosário prumo
 prosário rumo
prosário ritmo
rosário físsil
 rosário fusca
rosário fosco
rosário fiat
rosário faísca
rosário fósforo
rosário fusco

       Cataguases, 1997
In minerar O branco, 2008

 

Página ampliada e republicada em abril de 2017



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