OSWALDO MARTINS
Nasceu em Barbacena, Minas Gerais, em 1960. Formou-se em Letras pela PUC-Rio. Mestre em Literatura Brasileira pela UERJ. Publicou os livros: desestudos (2000), minimalhas do alheio (2002), lucidez do oco (2004) e COSMOLOGIA DO IMPRECISO (2008), todos pela 7 Letras.
Blog: http://osmarti.blogspot.com/
De
COSMOLOGIA DO IMPRECISO
Rio de Janeiro: 7Letras, 2008.
ISBN 978-85-7577-472-4
arte da deseducação
2.
pedagogia dos imbecis
as crianças brincam
de teatrinho
encenam para as mamães
que aplaudem
futuras
donas de casa.
5.
as jovens — por princípio —
as recém-descabaçadas
andam
como quem carregasse
um mundo à parte
nisto é que se reside
todo seu talento
e maldade
construto
3.
uma lição de anatomia:
o bule
enraíza
uma forma
no espaço retalhado
da prateleira
que vaga
no espaço
estudo para pinturas sacras
I
a virgem houvesse atraído o espírito santo
sobre ela
e não exangue parisse
beberíamos aos culhões do arcanjo
para que não nos faltassem forças
para que não nos faltasse o tesão
até o último dia
4.
cristo nas bodas de cana percorrido
o colo das moças
e com os olhos inebriados de tesão
tocasse aqui uma teta
ali as curvas
as portentosas nádegas
da mulher que se oferecia
mais que a morte
seria a carne
11
aquela a nos compor ritmos
como as bailoaras de Cabral
a dançar a dança dos desertos
o sol o mais exposto imposto
aquela que a cumprir tirsos
no chão nu na terra areenta
solapasse à morte o canto
fúnebre e a ele permitisse
o sol do ainda sol a pino
como se no para sempre
não se fosse a juventude
MARTINS, Oswaldo. Língua nua. Desenhos de Elvira Vigna. Rio de Janeiro, RJ: 7Letras, 2011. 106 p. ilus. ISBN 978-85-7577-770-1. “ Oswaldo Martins “ Ex. bibl. Antonio Miranda
olho vago da experiência
o quase perfil
do estupor
sento e apoio
não as mãos
não a bunda
mas a clareza do espaço
que o ventre infunde
a linha reta traz suas manchas curvas
talvez os pentelhos negros as pernas
em desleixo sobre um anteparo vazio
esta ilusão se senta tocada pela música
um pé pende para além da reta linha
outro se esconde - talvez mais nu -
nesta nudez translúcida que não se vê
tudo são técnicas de aparição brancas
folhas dizem menos os traços menos
as palavras dizem do que não haveria
do que não há e entretanto é o reflexo
do havido na sensibilidade deste oco
lúcido
escorre sobre o papel em desespero alguma sombra erradia de outra salomé dança que buscou as dádivas o espaço de manchas onde não mais se vê súbito o permanecido desejo a impudicícia ávida dos pruridos gonocócicos e este vasto cazzo a folha em branco a branca música desvela os pés faz rodopiarem os ventos os bagos irradiarem sóis brancas noites a ver chegarem as antigas damas quando ridente fianda vê vestidas as velhas putas que bordejam pelo salão e eu e eu - oculto tetrarca paulistano das madrugadas - ofereço o que do nu alcançam
Extraído de
POESIA SEMPRE. Ano 13. Número 20. Março 2005. Revista trimestral de poesia. Editor Luciano Trigo. Rio de Janeiro, RJ: Fundação Biblioteca Nacional, 2005. Ilus. Ex. bibl. Antonio Miranda
as palavras nos celebram e giram
na alquimia do amor —
os passos inserem-se na cidade
há ventos e arabescos
vãos descalço de paisagem
rasgo de veias abertas
a partícula da palavra gira
onde os corpos deixam espaço
lecuona
suas vísceras vestem-me e me sento
na calçada fria
chove, talvez
a cidade deslize
aquém de todo trânsito
de toda busca
o beijo como a música
compõe sobre o corpo
do amor
dante
na aporia do amor
teço teu dorso nu
a voz chama em queda
a memória das ruas
que não cessa
o andar
por beatrice
Página publicada em agosto de 2009 ; ampliada e republicada em dezembro de 2014. Ampliada em julho de 2018.
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