POESIA MINEIRA
Coordenação de WILMAR SILVA
MARIA ESTHER MACIEL
Nasceu em Patos de Minas, a 1 de fevereiro de 1963. Vive em Belo Horizonte desde 1981. Professora de Teoria Literária na Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Poeta e crítica literária, publicou: Dos Haveres do Corpo (poesia, 1985); As vertigens da Lucidez: Poesia e Crítica em Octavio Paz (ensaio, 1995), A Lição do Fogo (ensaio, 1998), Triz (poesia, 1998),Vôo Transverso (ensaio, 1999), A memória das coisas (ensaio, 2004) e O Livro de Zenóbia (prosa poética, 2004).
Foi uma revelação a descoberta da poesia de Maria Esther Maciel. Rigorosa na tessitura dos versos, na construção das imagens. Admirável. Antonio Miranda
TEXTOS EM PORTUGUÊS Y ESPAÑOL
Poemas extraídos do SUPLEMENTO MG. Setembro / Outubro 2016. Belo Horizonte, Minas Gerais. Imprensa Oficial de Minas Gerais.
2 HAICAIS DE VERÃO
Um grito trila
num galho de orquídea
prevendo a chuva.
Um cão escuro
em busca de refúgios
uiva sem pudor.
Em que palavra não estou?
MAPA
O corpo
em seus pontos obscuros:
a cicatriz, a mancha na pele,
o que raras vezes
a roupa revela.
O corpo
em seus pontos absurdos:
o que o desejo
no fundo
encerra.
REGALO
Quando meu pai
voltava da roça
trazia, além da alegria
garrafas de leite cru.
Ás vezes, cestas de ovos
mangas maduras
polvilho, açafrão em pó.
Trazia o cheiro das coisas
sem malícia. A memória d
os pastos.
DESVIO
Um pássaro atravessa
a página, no lapso
deste tempo que me retém.
Em que palavra não estou?
DESÍGNIO
Trazer para o poema o céu de todos os
invernos
As horas ásperas
O sal desta pele, após o sol
A morte em uma tarde com pássaros
O olhar em ponto de não.
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AULA DE DESENHO
Estou lá onde me invento e me faço:
De giz é meu traço. De aço, o papel.
Esboço uma face a régua e compasso.
É falsa. Desfaço o que fiz.
Retraço o retrato. Evoco o abstrato
Faço da sombra minha raiz.
Farta de mim, afasto-me
e constato: na arte ou na vida,
em carne, osso, lápis ou giz
onde estou não é sempre
e o que sou é por um triz.
PAISAGEM COM FRUTAS
Duas peras sobre a mesa
esperam a tua fome.
O dia é verde
e o vento tem cores provisórias.
Sobre o muro
um pássaro mudo
de olhar escuro
perscruta a tua sombra.
Ela sabe
que ninguém sabe
em que azul
ocultas
teu absurdo.
OFÍCIO
Escrever
a água
da palavra mar
o vôo
da palavra ave
o rio
da palavra margem
o oco
da palavra nada.
SOBRE UM FILME DE WONG KAR-WAY
O corpo e seus possíveis.
O dentro que, na pele,
vira flor.
Os cheiros, a memória
do que, de tão breve,
não fica
senão como sombra
líquida
quase cítrica
desse amor.
AMOR
Na véspera de ti
eu era pouca
e sem
sintaxe
eu era um quase
uma parte
sem outra
um hiato
de mim.
No agora de ti
aconteço
tecida em ponto
cheio
um texto
com entrelinhas
e recheio:
um precioso corpo
um bastante sim.
A VOZ E O ESPELHO
(sobre um paradoxo de Octavio Paz)
Tu presencia me deshabita:
saio a esmo
sem medida do mesmo
no ermo de mim:
faço-me diversa
convexo-me em ti
no reverso
onde me perco
revejo-me, reescrita
e recomeço, inversa
embora a mesma
mas ao medir-me
não mais te vejo
e no instante
do espelho finito
reflito:
tu ausência me habita.
Extraídos da antologia OIRO DE MINAS a nova poesia das GERAIS. Seleção de Prisca Agustoni. S. l.: Pasárgada; Ardósia, 2007.
TEXTOS EM PORTUGUÊS Y ESPAÑOL
ANTOLOGÍA DE POESÍA BRASILEÑA, edición de Jaime B. Rosa. Edición bilingue Português - Español. Valencia, España: Huerga & Fierro editores, 2006. 247 p. 13,5X21,5 cm. Col. A.M. Inclui os poetas: Lucila Nogueira, Glauco Mattoso, Adriano Espíndola, Beth Brait Alvim, Contador Borges, Donizete Galvão, Floriano Martins, Nicolas Behr, Jorge Lucio de Campos, Vera Lúcia de Oliveira, Rubens Zárate, Ademir Demarchi, Ademir Assunção, Leontino Filho, Marco Lucchesi, Weydson Barros Leal, Antonio Moura, Maria Esther Maciel, Rodrigo Garcia Lopes, José Geraldo Neres, Viviane de Santana Paulo, Alberto Pucheu, Fabrício Carpinejar, Salgado Maranhão, Sérgio Cohn, Rodrigo Petronio, Konrad Zeller, Pedro Cesarino e Mariana Ianelli. Col. A.M.
NOTURNO
(a T. S. Eliot)
O dia é noite no poema:
Sombras, pedras, luas secas
encobrem a estação das flores.
Sobre o deserto
memory and desire
ainda restam:
ecos entre as cinzas
deste verso.
Will it bloom this year?
Na terra triste do poema
enterro o fim e o infinito:
me faço silêncio, eclipse.
NOCTURNO
(a T. S. Eliot)
El día es noche en el poema:
Sombras, piedras, lunas secas
encubren la estación de las flores.
Sobre el desierto
memory and desire
todavía quedan:
ecos entre las cenizas
de este verso.
Will it bloom this year?
En la tierra triste del poema
entierro el fin y el infinito:
me hago silencio, eclipse.
[Trad. Carlos Osario]
PAISAGEM COM FRUTAS
Duas peras sobre a mesa
esperam a tua fome.
O dia é verde
e o vento tem cores provisórias.
Sobre o muro
um pássaro mudo
de olhar escuro
perscruta a tua sombra
Ele sabe
que ninguém sabe
em que azul
ocultas
teu absurdo.
PAISAJE CON FRUTAS
Dos peras sobre la mesa
esperan tu hambre.
El día es verde
y el, viento tiene colores provisorios.
Sobre el muro
un pájaro mudo
de mirada oscura
escudriña tu sombra
Él sabe
que nadie sabe
en qué azul
ocultas
tu absurdo.
[Trad. Carlos Osorio]
Página publicada em novembro de 2008; ampliada e republicada em fevereiro de 2013..
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